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Onde está você?

Vânia Dantas
Filósofa Clínica
Uberlândia/MG


Novamente, a experiência e a reflexão provam: ninguém quer a sua vida.

Os comportamentos machistas que ainda imperam no interior do Brasil ou mesmo nas capitais, mascarados sob o direcionamento dos projetos de igualdade de gênero, resultam na comprovação desta tese.

Se o homem se envolve com uma mulher, exige dela submissão, decoro, respeitabilidade – que seja uma dama, comporte-se, torne-se digna de carregar seu nome (ou sua personalidade do lado, como um obsessor, como o vigia do panóptico). Seja a empregada de sua casa, babá de seus filhos, profissional da sua cama, subserviente em todos os momentos.

Mas que ela não chame a atenção de mais ninguém. Se feche para o mundo, adote a família dele, suas festas, suas metas – aliás, forneça o suporte do lar para que ele as alcance. No feminino.

As setas de seu fluxograma devem ter a direção dele; os horários por ele ditados, a vida em sua função. Aí a aparência é deixada pra lá, já que, afinal, como haverá tempo, uma vez que ele é o foco... e está sempre ali, a exigir? Fantasma da consciência.

As carências comandam. Entretanto, “a mulher faminta resiste a muitos períodos de privação. Ela pode planejar escapar e, não obstante, considerar alto demais o preço da fuga, acreditando que ela lhe exigirá muita libido, muita energia.” Assim diz a psicóloga junguiana Clarissa Pinkola Estés em Mulheres que correm com os lobos. (Estés, 1994: 290)

O preço de se assumir é muito alto.

Aí, quando a mulher morre, quando esquece que um dia foi plano, determinação, viço e desejo, quando já se deu de todo a ponto de se perder – e se deixou lá atrás, no passado – esse homem se desinteressa. E não é só pela preponderância do mercado, é porque aquela pessoa por quem se apaixonou não existe mais.

Ela é agora o espelho baço de Hume.

Lá no chão, o que fica? Um ser insosso, uma canja de parturiente supersticiosa. Cadê a substância, o mover do corpo? Cadê os gestos lânguidos, os passos de bailarina em ponta, a chave de pernas do tango, a transparência das pétalas?

As mucosas secaram, a face vincada. Por ali, quanto sofrimento já foi carreado? Não se viram auto-massagens. Não havia motivo para cuidados – jogo ganho.

Mas aí ele se foi, mesmo que ainda dentro de casa. Seqüestrou sua alma, só que não a levou, nem quer resgate. A alma dela se perdeu e a dele é ausente – voou para longe. Viradas de boca para baixo, sem conteúdo, sem contato, garrafas vazias no quintal.

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