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Aceitando você como você é

Patrícia Rossi
Filósofa Clínica
Juiz de Fora-MG


Voltando do Café Filosófico hoje, cujo tema foi "Montaigne e a auto estima", me deparei com algumas questões e gostaria de compartilhá-las com vocês.

Montaigne foi um filósofo do fim so séc. 16 e um pouco diferente dos outros. Segundo ele, é preciso superar a vergonha do corpo e da mente e o medo do julgamento alheio para levantar a auto-estima. “A pior desgraça para nós é desenhar aquilo que somos” dizia ele.

Em sua filosofia ele dizia que “temos tantos problemas justamente porque somos racionais, porque pensamos, e isso atrapalha nossa relação com nosso corpo. Ao contrário dos outros animais temos repulsa por nossa corporalidade. Achamos que somos gordos, brutos ou desajeitados demais. Desenvolvemos distúrbios alimentares, complexos sexuais e bloqueios.”

Pensando assim, podemos ver que isso não mudou com o passar dos anos. Percebemos então que a relação com o corpo vem muito antes do massacre do mundo moderno pela perseguição de um corpo ideal, esquelético ou “perfeito” como julgam as passarelas e as propagandas de moda. A relação ser humano e corpo vem desde que o homem passou a tomar consciência justamente da sua singularidade e que não há perfeição e sim seres humanos cada qual com suas qualidade e defeitos.

Voltando a Montaigne, ele pensava que o problema era, já que o corpo não era assunto adequado muitos menos para os livros de filosofia, acabávamos pensando nele como motivo de vergonha. Ele nos persuadia a aceitar nosso inegável lado animal.

Ao observar os animais, Montaigne chegou a uma conclusão interessante: “a sabedoria animal muitas vezes é maior que a nossa, por exemplo, os animais ficam mais a vontade com o corpo deles, não tem os constrangimentos, as vergonhas e os pudores que temos. Sua relação com o corpo é mais natural”.

Abrindo novamente um parênteses, fico me perguntando porque o ser humano tem repulsa de seu próprio corpo e seu funcionamento. Ontem conversando com alguns colegas de faculdade acabei ouvindo uma história de uma namorada que tem nojo de imaginar o namorado defecando, ou da sua própria menstruação, como se aquilo fosse algo nojento ou inatural.

Não seria isso ir contra a natureza de sua própria existência? Talvez viver num mundo plastificado onde as Barbies são modelos de beleza e perfeição seja mais fácil, afinal, elas não precisam fazer necessidades biológicas ou menos pensar nisso, ou qualquer outra coisa que surja no caminho.

Montainge nos compara com os animas alegando que devemos aceitar o corpo que temos assim como ele é, mas com uma pitada de humor, tão naturalmente quanto os animais o fazem. É tão simples. E “uma idéia não precisa ser complexa para ser verdadeira” dizia ele.

Ter um cérebro desenvolvido não é um problema só porque nos leva a ter vergonha dos próprio corpo, mas também nos leva a ser arrogantes e achar que sabemos o que é certo e impor nossa visão aos outros.

Cada sociedade tem seu parâmetro do que é normal, do que são roupas, comidas ou conversas normais. Quem foge desse parâmetro está sujeito a ser alvo de julgamento e preconceito, a ser tachado de “esquisito”, seria alvo de chacota ou coisa pior.

Isso me fez lembrar de um seriado americano chamado Glee(ep. 16), onde uma aluna do ensino médio, gordinha, e, portanto, fora dos padrões, tinha que emagrecer para ser aceita entre as animadoras de torcida do time da escola. Depois de brigar com balança, fazer dietas malucas e ir contra seus princípios e seu próprio corpo ela relata para todos os estudante da escola: “Como a maioria de vocês sabem, ser líder der torcida é ser perfeita e vencedora, ser sexy e popular. Bem, eu acho que deveria ser diferente. Quantos de vocês nesta escola se acham gordos? Quantos acham que talvez não tenham valor? Ou que são feios ou tem muitas espinhas, ou não tem muitos amigos? Bem, as vezes eu sinto isso. E isso não é certo”.

Portanto, que tal dar uma paradinha pra pensar, antes de acusar os outros ou a nós mesmos, afinal, o que é certo e o que é errado quando falamos de seres humanos? Porque a busca pelo corpo perfeito, se nem mesmo sabemos o que seria um corpo perfeito. Onde tudo isso irá nos levar? Com certeza a uma loucura coletiva onde todos os indivíduos são infelizes com o corpo e a vida que tem.

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