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A arte da convivência

Sandra Veroneze
Jornalista e Filósofa Clínica
Porto Alegre/RS


Estou com vizinhos novos. Quer dizer, em breve os terei, porque a fase atual é de reparos na casa ao lado do meu prédio. Mas já não gosto deles. Uma amiga disse que estou exagerando e sendo chata e é bem provável que sim, só porque não gosto do som que eles escutam e democraticamente compartilham com toda vizinhança: funk.

Essa amiga minha também tem uma situação chata pra administrar. A mãe ainda não percebeu que a filha cresceu e tem andado com umas ideias meio estranhas, como por exemplo acompanhá-la nas férias na praia, junto com o amor e os amigos da menina, como forma de protegê-la (em outras palavras: monitorá-la). Detalhe: minha amiga tem 33 anos.

Os exemplos de quanto a arte da convivência é delicada são infinitos. Alguém disse certa vez que a liberdade de um termina quando começa a liberdade do outro. Particularmente, acredito que todo mundo pode ter liberdade conjuntamente, desde que haja respeito. Nada contra ouvir funk, por exemplo, se a pessoa curte, se diverte, gosta, mas que seja em quantidade de decibéis necessários para que só ela escute. Estou errada?

A invasão do espaço alheio é somente uma das facetas da arte da convivência. Existe outro igualmente importante: o quanto conseguimos admitir e ficar junto do diferente. Tudo que não é exatamente do jeito que a gente gosta nos soa ‘estranho’. E a primeira reação é de repulsa e distanciamento. A segunda é de tentarmos adequar a realidade ao nosso gosto e somente a terceira, em uma perspectiva bem otimista, é a de compreendermos para então aceitarmos.

Os incomodados que se retirem? Simplista demais, sob pena de o mundo virar uma baderna e os indivíduos cada vez mais isolados (alguma semelhança com o que vemos à nossa volta?). Para que haja entendimento, penso eu, incomodados e incomodadores devem dar um passo à frente. “É preciso que cada um ceda um pouco”, diriam os mais sábios. E emendariam, com uma polida filosófica: que aquilo que nos separa seja menor do que aquilo que nos une.

É isso aí!

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