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SENTIMENTOS DENSOS

Will Goya
Filósofo Clínico. Poeta.
Goiânia/GO


Sento de costas para a parede, olhando a entrada,
Mas tudo que vejo é uma saída.

Vejo os móveis da sala, e algum detalhe descolorido no chão...
Como quem deseja se desapegar do corpo, pra pensar melhor,
Deixo aos ombros cair todo o silêncio do mundo, acumulado, nos cantos,
Sozinho em casa.

Cobiça de um desejo frio de voar à morte, para ser mais leve.
Sensação que o abismo exige de quem ama o desconhecido, e se entrega
Ao desejo de não mais ter vontades.

Por que é tão difícil não querer olhar para dentro de uma porta aberta?

Janelas fechadas existem sem intenções, como pedaços contínuos de parede,
Mas uma fresta é sempre uma possibilidade do lado de fora,
Desabrigando sentimentos, como um eixo de gravidade, pesando
À memória tudo o que não se deve lembrar.

Que ninguém ouse olhar muito tempo o vazio das coisas,
Esse ímã de insuficiência preso a tudo o que nos incomoda.

Com sentimentos densos, sozinho em casa, fiquei olhando a porta aberta
e me lembrei de uma antiga piada: “por que o cachorro entrou na igreja?
Porque ela estava aberta. E por que ele saiu?...”. A simplicidade patética
da anedota me fez pensar que tal como existe uma lei da gravidade, para
baixo, também há uma lei das expectativas pesando o olhar.

Misturando filosofia, emoções de angústia, prazeres inconfessáveis e sensações que eu não saberia definir, reuni todo o “material” para fazer um poema. Depois,
carregado e sofrido, fui para o teclado do computador... e comecei a imaginar como seria o tempo deserto da solidão. Às vezes eu simplesmente
tinha de escrever um poema. Obrigações de escritor.

A maior parte de tudo o que se vê não se vê. Está lá:
Suposto, visível em segunda opção.
O que seria um objeto sem avesso, sem volume nem profundidade –
Essas coisas da alma?

Eis como seria o mundo se não existíssemos para ele:
Um desenho sem autor,
Uma verdade jamais conhecida,
Papel de um lado só.

Não tirássemos da alma e imaginássemos o resto...
O mundo seria menos que a metade.
Não vemos o mundo como ele é, mas como nós o completamos.

Quem desiste des-existe.
O único registro de vida é a transformação.
Nesse exato momento talvez haja uma imensa visão de alegria...
Mas ninguém para vê-la.

Quando a curiosidade está ausente para visitas,
A poeira sobre o vidro faz parecer que o tempo envelheceu demais.
Buscaria alívio no céu, no escorrer da chuva, se houvesse.

Pequenos detalhes, grandes aos meus olhos...
Pensamentos meus selados com pálpebras de janelas
E o mundo inteiro do lado de fora, em espera.
Incrível como a solidão ocupa espaço e me expulsa fora de casa.

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