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Sertões incertos

Pe. Flávio Sobreiro
Poeta e filosofo clínico
Cambuí/MG


O que os poetas não podem expressar o silêncio se encarrega de sepultar. Assim é a vida de muitas pessoas. Há dores e feridas que nem mesmo o mais sábio dos poetas pode expressar em palavras. Vida de dores silenciosas. Desencantos que estão guardados em algum território da alma. A vida pode silenciar o que o coração não consegue dizer o que é.

Sabiamente disse João Guimarães Rosa que o sertão é dentro da gente. Território desconhecido é o que trazemos em nosso coração. De florestas selvagens a caatingas de desesperanças. De várzeas alagadas a montanhas de sonhos. De praias desertas de solidão a bosques encantados de sonhos. Como conhecer um lugar desconhecido sem o mapa que nos garanta a chegada?

Há muitas chegadas sem mapa. Conviver e aprender com a vida silenciosa de lugares ainda pagãos é uma tarefa laboriosa.

Judas não suportou a dor de ter traído. Não encontrou em seu sertão uma estrada que o pudesse conduzir ao perdão. Perdido em si mesmo, ficou preso na tarde silenciosa de seus erros. E foi assim que sepultou no solo de seu território a si mesmo. Se ele tivesse andado um pouco mais descobriria que na divisa do seu arrependimento estava à água que lhe devolveria as esperanças vendidas por algumas moedas de prata.

O sertão tem tons de prisões e canções. Melodias tristes de um por do sol e manhãs que anunciam mais um dia de seca. Onde estará a certeza da vida quando tudo é tão incerto? Onde estará a chuva que poderia fazer o verde da esperança colorir de vida os sonhos de outrora?

Na dúvida ele não quis seguir o mestre. Diante da dúvida preferiu ficar preso na seca que havia tomado conta do seu sertão. Suas riquezas eram maiores que os tesouros que ainda não conhecia. Tinha a possibilidade de ver a chuva irrigar o solo seco de sua alma.

Quando se acostuma com as estações do passado, as possibilidades do presente são perigosas.

Estranha é a maneira como se vive. O medo que aprisiona é sempre incerto. O que não se sabe da vida é perigoso aos olhos da noite que encobre os primeiros raios de sol. Perdidos no calor do sertão das estações da alma, o dia de amanhã será sempre a reprise do dia que ficou aprisionado em mossas decepções.

Ao chegar ao túmulo naquela manhã de um novo tempo, Maria Madalena estava presa no ontem de sua história. Esqueceu-se de olhar para o sol da alegria de um novo tempo que anunciava que as sementes já haviam brotado no solo das tristezas. As tristezas impedem os olhos da alma a verem além das paisagens e descobrir a fonte da paz escondida no mistério do amor.

A paciência do sertão das experiências é o que move a vida do sertanejo. Na espera silenciosa das madrugadas de inquietações, o canto do galo anuncia não a traição dos sentimentos, mas sim a esperança de que um novo amanhã está para chegar. Ouvir o silêncio do sertão da vida é partir para novas estações que ainda hão de vir.

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