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Ao Deus desconhecido

Miguel Angelo Caruzo
Filósofo Clínico
Juiz de Fora/MG


“De pé, então, no meio do Areópago, Paulo falou: ‘Cidadãos atenienses! Vejo que, sob todos os aspectos, sois os mais religiosos dos homens. Pois, percorrendo a vossa cidade e observando os vossos monumentos sagrados, encontrei até um altar com a inscrição: ‘Ao Deus desconhecido’. Ora bem, o que adorais sem conhecer, isto venho anunciar-vos’” (Atos dos Apóstolos 17, 22-23).

Quais templos de dúvidas estamos reservando ao Deus desconhecido? Será que podemos colocar um deus no lugar de um templo cujo lugar esteja reservado para as nossas maiores dúvidas. Preenche-lo não seria um abandono da possibilidade das buscas? Será que não é a busca que move o homem e este cada vez que responde definitivamente determinadas questões acaba diminuindo suas capacidades e movimentos naturais da vida?

Mestre Eckhart, místico medieval dizia que as imagens de deus eram criações que o afastam de deus. Portanto, a máxima dele: “Peçamos a Deus que nos livre de deus”. Tendo em conta que esta divagação possui uma vertente agnóstica e não mística, podemos ver que o próprio discurso de quem vive em profundidade as questões da religião, fala antes das formas de tentar contemplar um “deus” do que privilegiar um discurso moralista (como a maioria das religiões ocidentais o fazem hoje). Mas, o foco aqui não é religião, e sim as “certezas”.

A maior beleza da humanidade, afirma uns é a natureza. Segundo alguns ela é perfeita, segundo outros ela é estudável (permitam-me o neologismo), para outros ela é a mais perfeita criação de “deus” seja ele qual for e que expressa sua beleza ou perfeição. Mas, o que todos os que se maravilham diante do que percebem (religiosos, cientistas, filósofos, um simples lavrador, engraxate, poeta) é a indizibilidade daquilo que seus olhos o permitem maravilhar-se.

Talvez o ponto em comum entre todos é o ar de maravilhar-se ou espantar-se diante da natureza e o segundo passo é querer entendê-lo. Filósofos postulam que o espantar-se com as coisas é o princípio da filosofia, que por sinal não finaliza suas questões por mais abrangente e sistemática que seja sua construção teórica.

Outra maravilha que observamos na vida e na natureza é o que as pessoas chamam de amor. Embora seja um dos termos mais comuns e mais controversos da sociedade. Pois diversos são os grupos e indivíduos que proclamam o amor quando na verdade cada pessoa ama de um jeito. Caso o leitor discorde de mim, pergunte ou observe como as pessoas a sua volta expressam na prática o amor por alguém. Se afirmarem que o sentimento é algo comum a todos, será uma hipótese vazia, pois até onde é observável, sentimentos não são mensuráveis em outro lugar que não a vida concreta.

Não estendendo essa reflexão para além de Deus, Natureza e Amor, retomemos o raciocínio. Deus é o nome dado ao que não é Deus, pelos místicos tais como Eckhart e João da Cruz o afirmam em suas obras. A natureza nos coloca diante de um maravilhar-se que nos impulsiona a buscar respostas sobre sua origem, funcionamento e sentido.

O amor é um “sentimento lindo”, porém não é algo “superior”, “sobrenatural”, ou tem a origem em outra coisa que não a própria vida (ou seríamos tão limítrofes e asquerosos que não nos julgaríamos capazes de possuir um sentimento tão nobre por qualquer coisa que seja?).

Diante de tais afirmações (passíveis e saudavelmente aceitáveis de serem postas em questão) podemos inferir o seguinte: diante de um experiência pessoal cuja referência (aparentemente sobrenatural) não se explica, não explique, pois perderá todo o sentido (se é que queira que essa faça sentido).

Toda explicação será posta em debate e como toda afirmação humana, correrá o risco de ser racionalmente desfeita. Quanto à natureza em sua origem, funcionamento e sentido para quem se maravilha com esse fenômeno digo que primeiro experimente essa alegria que, até onde sabemos, só o homem é capaz de perceber desta forma. Quanto às explicações, toda afirmação será limitada e questionada.

Se o leitor faz uma afirmação dogmática (seja de qualquer lugar que possa vir essa dogmatização) guarde para si. Pois, a partir do momento que for posta em questão para um grupo de humanos, ela será passível de ser destruída. Portanto, se quer pôr à prova sua afirmação, abra para discussão. Mas, se tiver medo de desfazer tudo o que acreditou ser a resposta final até agora, mantenha-se com suas certezas guardadas.

Por fim, quando se tratar de amor, não o explique ou não queira que ela tenha uma origem inexplicável (cuja contradição está em afirmá-la inexplicável explicando-a) e que ela tem um caráter homogeneamente universal. Basta apenas amar. O resto é resto. E toda afirmação é questionável, inclusive a minha aqui no texto.

Grande abraço a todos e fiquem à vontade para comentar, criticar, apoiar, concordar ou discordar. Pois, se sou contra dogmatizações, minha opinião não deve contar como dogma e me coloco aberto para mudar minha opinião ou minhas certezas por outras mais plausíveis.

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