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O Palhaço das Ilusões*

A alegria no picadeiro prometia ao meu coração triste uma manhã com sabores de eternidade. O sorriso atrás da maquiagem que lhe roubava o seu verdadeiro semblante escondia um olhar que descobri somente quando me ofereceu uma flor enquanto eu esperava a pipoca ficar pronta. Enquanto ela estourava na panela meu coração estourava de alegria dentro de um sorriso que não conseguia disfarçar.

Enquanto o circo arrastava multidões, você arrastava meu coração para os seus braços. Nada conseguia esconder minha felicidade diante do espetáculo do amor que a cada noite se tornava mais belo. Foi assim que em muitas noites que pareciam nunca terminar que planejamos um futuro sem máscaras ou tristezas.

No palco eu contemplava seu olhar a distância. Em meio à multidão eu colhia cada sorriso seu como as mais belas flores no jardim dos meus sonhos. Naquela noite em que a chuva chegou sem avisar, voltei para casa contemplando as estrelas que se emocionavam com minha felicidade. Suas palhaçadas eram sempre a certeza de que a vida não era uma simples brincadeira. Sabia sorrir com suas tristezas e chorar com nossas alegrias.

Havia decidido não continuar seguindo viagem, pois havia encontrado seu porto seguro junto ao meu coração. Estava disposto a estacionar a vida nos meus braços e juntos sacramentalizarmos o amor que nascia entre sorrisos de uma noite de espetáculos sem fim.

Enquanto todos arrumavam as malas para partir em busca de novas plateias, você fixava residência na minha alma. De inquilino tornava-se morador definitivo na minha vida. Para lhe esperar, retirei as folhas secas do outono de outros tempos, semeei flores de novas estações, retirei o pó das decepções e acendi a esperança de um novo tempo em meu coração.

Infelizmente nosso amor não durou mais do que um espetáculo. A dor de deixar seus velhos sonhos foi maior que minhas lágrimas implorando para que não partisse. O aplauso de estranhos falou mais alto que as lágrimas que caiam de meus olhos. E foi assim que com um sorriso que tentava consolar-me que você voltou para um mundo que nunca foi meu.

Nada pude fazer. Fiquei no portão olhando você partir com as bagagens coloridas dos meus sonhos de outrora. Hoje vivo com as sementes de uma primavera que nunca floriu. Do espetáculo do amor guardo apenas a lembrança de um sorriso que não era para ser somente meu. Outros contemplam hoje a alegria que um dia me ofereceu por alguns instantes que se eternizaram em minha alma.

*Pe. Flávio Sobreiro
Poeta, Filósofo Clínico
Cambuí/MG

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