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Fragmentos filosóficos delirantes XCXXXI*

Quem seremos no futuro?

Acabo de assistir uma palestra do inventor e futurista Ray Kurzweil, que está passando uns dias na minha universidade nos EUA. Kurzweil ficou famoso por suas várias invenções, desde sintetizadores que podem simular sons de piano e outros instrumentos, até um software para cegos que transforma texto em voz. Escreveu vários best-sellers, onde explora como o avanço exponencial da tecnologia transformará profundamente a sociedade, redefinindo não só o futuro mas a própria noção do que significa ser humano.

Segundo Kurzweil, a revolução não só já começou como avança rapidamente em direção a um ponto final, "a Singularidade", quando máquinas e seres humanos formarão uma aliança que poderá nos tornar seres super-humanos. Ele prevê que chegaremos lá em 2045.

Segundo Kurzweil, em 2020 computadores serão poderosos o suficiente para simular o cérebro humano. Baseando seus argumentos numa lei empírica chamada "Lei dos Retornos Acelerados", em 25 anos o progresso da internet, a velocidade de processamento de dados, o acesso a bancos de dados, criarão tecnologias bilhões de vezes mais poderosas do que as que temos hoje. Por exemplo, os computadores da década de 70 eram um milhão de vezes mais caros e mil vezes menos eficientes do que o que temos hoje em nossos celulares, totalizando um aumento de bilhões de vezes em eficiência de computação por real. Ele prevê que em 2029 teremos entendido o funcionamento do cérebro humano, ao menos o suficiente para simularmos seu funcionamento em computadores que, à esta altura, serão bem mais poderosos do que nossos cérebros.

A singularidade, no caso da física dos buracos negros, de onde Kurzweil tomou sua inspiração, é um ponto além do qual não sabemos o que pode ocorrer. É onde as leis que usamos para descrever as propriedades da matéria, do espaço e do tempo deixam de fazer sentido. Isto não significa que é impossível compreender a singularidade, mas apenas que não temos as ferramentas teóricas para fazê-lo.

Já no caso da inteligência artificial, fica bem mais difícil prever o que poderá ocorrer. Toda tecnologia pode ser usada para o bem ou para o mal. Se, como Kurzweil, somos otimistas e vemos que a humanidade, em média, tem se beneficiado com o avanço tecnológico (vivemos mais e matamos melhor; mas matamos menos), a singularidade trará uma nova era na evolução da inteligência, onde o corpo será supérfluo: o que importará será a informação que nos define. Afinal, somos matéria arranjada segundo um plano, e este plano é uma sequência de instruções, ou seja, um programa.

Se podemos armazenar estas instruções, em princípio podemos recriá-las em qualquer máquina, como numa realidade virtual superavançada. Imagine um personagem do videogame Sims que é tão sofisticado que se considera vivo. Seremos ele. A realidade, tal qual a percebemos, pode ser simulada; basta mais informação, mais detalhes, mais velocidade de processamento. Se é este o nosso futuro, é bom começarmos a pensar nas suas várias consequências. E nos certificar que nossa informação terá um backup que não falhará ou poderá ser destruído por forças malignas.

*Marcelo Gleiser

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