Pular para o conteúdo principal

Fragmentos filosóficos, poéticos, delirantes*



"(...) Há em nossos dias muita gente, às vezes agentes de cambio, frequentemente notários, que diz e repete: A poesia está morrendo. É pouco mais ou menos como se dissessem: não há mais rosas, a primavera entregou a alma a Deus, o sol perdeu o hábito de se erguer, percorrei todos os prados e não encontrareis uma borboleta, não há mais luar, o rouxinol não canta mais, o leão não mais ruge, a águia não mais planeia, os Alpes e Pirineus se foram, não há mais garrulas moçoilas e belos rapazes, ninguém mais cuida dos túmulos, a mãe não mais ama o filho, o céu se extinguiu, o coração humano morreu.

Se fosse permitido misturar o contingente ao eterno, seria antes o contrário que seria o verdadeiro. Jamais as faculdades da alma humana, perquirida e enriquecida pelo escavamento misterioso das revoluções, foram mais profundas e mais altas.

E esperemos um pouco de tempo, deixemos que se realize esta iminência de salvação social, o ensino gratuito e obrigatório, que será preciso para isso ? Um quarto de século, e representemos a incalculável soma de desenvolvimento intelectual que contém esta unica frase: Todo o mundo sabe ler! A multiplicação dos leitores é a multiplicação dos pães. No dia em que Cristo criou este simbolo, entreviu a imprensa. Seu milagre é o prodígio. Eis um livro. Com ele eu alimentarei cinco mil almas, um milhão de almas, a humanidade inteira. Em Cristo fazendo surgir os pães, há Guttenberg fazendo surgir os livros. Um semeador anuncia o outro.

Que é o gênero humano desde a origem dos séculos ? Um ledor. Soletrou por muito tempo, soletra ainda; muito em breve lerá.

Este menino de seis mil anos esteve inicialmente na escola. Onde ? Na natureza. No começo, não tendo outro livro, deletreou o universo. Teve o ensino primário das nuvens, do firmamento, dos meteoros, das flores, dos animais, das florestas, das estações, dos fenômenos. O pescador da Jônia estuda a vaga, o pastor da Caldeia soletra a estrela. Depois vieram os primeiros livros; sublime progresso. O livro é mais vasto ainda que este espetáculo, o mundo; porque ao fato acrescenta a ideia. Se alguma coisa é maior do que Deus visto no sol, é Deus visto em Homero. (...)"

*Victor Hugo

Comentários

Visitas