Querido leitor, aceite o meu fraternal abraço. Nos últimos
anos, tenho procurado valorizar a simplicidade da vida, até de forma lúdica e
ingênua, se é que dá pra falar assim. E o silenciar é um caminho tão intenso
quanto profundo. Na verdade, para mim, o silêncio mostra muito.
Ainda na infância lembro de dias silenciosos sem televisão,
sem rádio, passávamos boa parte do tempo ouvindo e discernindo o cantar dos
pássaros, se arrepiando com os sons uivantes do vento. Na tenra idade,
marcou-me muito os poucos momentos em que esse silêncio era quebrado e um deles
era quando o leiteiro de charrete tocava sua buzina avisando que estava
passando e era a deixa para trocar a vasilha.
Há poucos anos, precisamente em 2006, quando fiz o Caminho
de Santiago pela primeira vez, tenho saudade dos dias inteiros em que fiz
companhia para mim, em silêncio, ouvindo somente meus passos quando a bota
arrastava no chão, ou até o toque o cajado dando o tom da caminhada, anunciando
o ritmo da jornada rumo à casa do Santo. Hoje sei que não caminhava a
Compostela, a jornada era pra dentro de mim.
Esta mesma energia do acesso interno, só conseguida por mim
via silêncio, acessei recentemente. Era fim de semana, estava só na casa da
lagoa. Acordei cedo, como de hábito. Olhei para aquele mar de água doce e me
veio uma vontade gostosa de entrar na água de caiaque. Não deu outra, não eram
seis horas quando remava naquelas águas mansas e cheias de incógnitas.
O frescor da manhã tocava minha pele, respirava ar úmido,
estava só naquela imensidão da Lagoa dos Esteves. Estava eu e eu. Remava sem
direção, mas remava. Talvez como lá em Santiago, também remava para dentro de
mim. Não via e nem ouvia ninguém, só o som dos remos entrando e saindo da água
que era minha aliada abrindo caminho para dentro de mim.
Os remos entravam na água, provavelmente a mesma que circula
em minhas veias, numa sincrônica batida que lembrava as batidas do meu coração.
Foram momentos de solitude, instantes de inteireza. Eu era o tudo, era o nada.
Era eu.
Mas como vivemos neste plano tridimensional, dual, logo o
outro lado me vem e passo a vivenciar os sons, os ruídos e barulhos na maioria
das vezes ensurdecedor dos carros, jet ski, televisão, músicas, “bem-vindo a
outra realidade”, pensava em silêncio.
Fazendo um comparativo com aquela criança que fui lá na
encosta do morro, hoje lembro que os “barulhos”
quebravam a rotina do silêncio. Trazendo para hoje, é o silêncio que
quebra a rotina do barulho. Mas para ouvir o silêncio é necessário muito
esforço. Mas que vale a pena. Na verdade, para mim, o silêncio fala alto.
É assim como o mundo me parece hoje. E você, o que pensa
sobre silêncio?
*Beto Colombo
Administrador de Empresas, Escritor, Filósofo Clínico,
Coordenador da Filosofia Clínica na UNESC
Criciúma/SC
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