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Do fim da memória*













No filme: "O brilho eterno de uma mente sem lembranças", mergulhamos em uma historia sobre um amor, que se fundamenta pela manutenção da memoria. Um personagem decide apagar a memoria do namorado e isso provoca um interessante movimento no outro, que não suporta a realidade de não ser reconhecido. 

O filme mergulha no significado da lembrança ,mostra como ela é importante para manutenção e fortalecimento de alguns sentimentos, também revela que o que fez você amar uma vez tende a retornar ,mesmo que parta do zero.

Muitas perguntas surgem dai,a primeira que me ocorre, diz respeito ao significado e valência das memorias indesejáveis ou traumáticas,como seria se fossemos capazes de apaga-las? Algumas certamente teriam menos poder sobre as dores do ser, mas  por exemplo se alguém  tem um familiar que o machuca, fere, e o  caminho que encontrou  para não mais ser agredido foi por afastamento, a exclusão da memoria apagaria o sentido deste aprendizado.

Consideremos, que a magoa que sente por existência desta memória  persiste e insiste em  continuar machucando, apesar do afastamento e de  toda terapia que já fez para lidar com isso .

Bem no dia seu aniversário, aparecem os senhores da memoria , decididos  oferecem seus serviços , um presente cheio de entusiasmo enviado por um grande amigo, com o desejo de ajudar propondo que apague completamente a memoria traumática com a  promessa de  que isso ira remover completamente a dor e a angustia trazendo-lhe paz e serenidade.

Se  fosse possível, sera que seria isso mesmo o que aconteceria ?

Se aceitarmos que nos tornamos o que somos por tudo que vivemos, sentimos, percebemos,pensamos  e fazemos, vamos ter que concluir que ao tirar um sentimento tão grande e até quem sabe estruturante (mesmo que seja negativo), na pessoa pode acontecer uma desestabilização de conexões, interseções e aderências,um sentimento de bem pode se instalar mas também pode ser oposto disso, a pessoa pode se sentir sem escudo sem proteção, sem base .

Ela perde a necessidade de evitação, porque todo seu sistema se estruturava naquele contexto, quando isso acontece, deixa de existir todo um processo de elaboração e ajustamentos internos . A periferia de todos os sentimentos, comportamentos e intenções pode corromper os vínculos entre si e o resultado disso tudo poderia ser trágico. Como lidar com isso? Ao tirarmos a memoria ruim teríamos que tirar tudo que fez a pessoa estar onde vive , mas dai se incorreria ao risco de se  estar tirando da sua própria existência seu modo singular de ser.

Hoje já é sabido que existem experiencias neste sentido e que não mais se trata de ficção ,alguns remédios já fazem algo parecido com isso, a neurociência caminha para este lugar, são possibilidades reais temos que considerar toda as variáveis que envolvem tais praticas,é bom que elas considerem esta a da estruturação do sujeito entre muitas outras de igual valor.

Alba Regina Bonotto
Psicóloga, Filósofa Clínica, Pesquisadora no Grupo Autogenia
Curitiba/PR

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