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Mostrando postagens de abril, 2016

A palavra interminável*

Existe uma suspeita, de caráter duradouro, sobre a essência da escrita pessoal. Essa trama de eventos cotidianos inscritos na historicidade de cada um. Pode ser uma mescla de lugares, recordações, períodos, épocas, relações, cultura. Um conjunto de momentos por onde a vida se irrealiza. Quase nunca considerada eficiente enquanto acontece, muitas vezes recuperada, quanto a importância e significado pessoal, bem depois, nalguma terapia, autobiografia ou menção por alunos, familiares, amigos. O ser interminável em cada um parece proclamar-se na forma ilimitada dos recomeços, enquanto duradouros. Um processo existencial que se desdobra em meio aos afazeres da vida prática, ela mesma integrante dessa eternidade efêmera que se move pelos dias. Uma fonte de aspecto inesgotável parece querer dizer sobre as possibilidades de ser e não-ser em cada um, na diversidade dos instantes, na superação daquilo feito para perdurar, para além de uma só forma. A natureza do que permanec

O homem, a luta e a eternidade*

Adivinho nos planos da consciência dois arcanjos lutando com esferas e pensamentos mundo de planetas em fogo vertigem desequilíbrio de forças, matéria em convulsão ardendo pra se definir. Ó alma que não conhece todas as suas possibilidades, o mundo ainda é pequeno pra te encher. Abala as colunas da realidade, desperta os ritmos que estão dormindo. À guerra! Olha os arcanjos se esfacelando! Um dia a morte devolverá meu corpo, minha cabeça devolverá meus pensamentos ruins meus olhos verão a luz da perfeição e não haverá mais tempo. *Murilo Mendes

Mudança de ar*

“...Um e Infindo, destruído, eu-truído. Luz havia. Salvação.” Paul Celan Isto não é um poema. A poesia é para lembrar o tempo difícil que está para começar, o tempo em que o livro deixará de ser o livro que ilumina. O livro é que clareia ideias, que faz viajar os corações dos leitores a outros mundos.  Estaremos em outro tempo? A escuridão das ideias me assusta, temo pelo fim do espaço em que tudo pode ser dito, lido e compreendido, em que o que valerá são os restos de pensamento. Quase nada! Apenas por ser lei.  Lei da exclusão, é que terá legitimidade. O mundo é esse eterno queimar, esse esquecimento do que é estranho ao Outro, o que não faz parte do meu pensamento, para os inquisidores faz parte do mundo.  Eu preciso de todos os pensamentos para poder escolher meu livro preferido, meu filme, a minha música. É preciso existir a distância para poder ver o que está por perto. *Prof. Dr. Luis Antônio Paim Gomes Filósofo. Editor. Escritor. Livre Pensador.

Bem no fundo*

No fundo, no fundo, bem lá no fundo, a gente gostaria de ver nossos problemas resolvidos por decreto a partir desta data, aquela mágoa sem remédio é considerada nula e sobre ela — silêncio perpétuo extinto por lei todo o remorso, maldito seja quem olhar pra trás, lá pra trás não há nada, e nada mais mas problemas não se resolvem, problemas têm família grande, e aos domingos saem todos a passear o problema, sua senhora e outros pequenos probleminhas. *Paulo Leminski

O menino que escrevia poesias*

Não era de flutuar nas superfícies. Primeiro mergulhava, para depois dar-se conta do perigo. Era do tipo que não conseguia não afundar. Vislumbrava as belezas nas profundezas. Sempre haveria uma salvação. Iludia-se, achando que seria acolhido nos braços das sereias. E sempre se salvara. Então, que fosse !!!! Decidia o que deveria ser. E morria abraçado. Até se convencer do contrário, o que nem sempre era fácil. Pois achava que só se metia em coisas que valiam a pena. Sendo passarinho, virava elefante e se afastava do bando para sofrer. Doía muitas vezes, como não!! Em verdade para ele doía sempre. Então que fosse, já que tinha que ser... Sabiam os mais próximos. Era torto das ideias. E perdido por natureza. Diziam que tinha um parafuso solto. Não sabiam que a linha de montagem ficara maluca e trocara as peças. Sua mãe que o diga. Não o teve. Achou-o encolhido num barco no meio do mar. E sorrindo, pensando no que viria.... Apegava-se as coisinhas pequeninas que os outro

Só de Sacanagem*

Meu coração está aos pulos! Quantas vezes minha esperança será posta à prova? Por quantas provas terá ela ainda que passar? Tudo isso que está aí no ar, malas, cuecas que voam entupidas de dinheiro, do meu dinheiro, que reservo duramente para educar os meninos mais pobres do que eu, e para cuidar gratuitamente da saúde deles e dos seus pais, esse dinheiro viaja na bagagem da impunidade e eu não posso mais. Quantas vezes, meu amigo, meu rapaz, minha confiança vai ser posta à prova? Quantas vezes minha esperança vai esperar no cais? É certo que tempos difíceis existem para aperfeiçoar o aprendiz, mas não é certo que a mentira de maus brasileiros venha quebrar no nosso nariz. Meu coração está no escuro, a luz é simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, meus avós e dos justos que os precederam: “Não roubarás”, “Devolva o lápis do coleguinha”, “Olha, esse apontador não é seu, minha filhinha”. Ao invés disso, tanta coisa nojenta e

Ser o que se é*

Em liberdade escolho... assumo e respondo experimentando com coragem. Pensem o que quiserem de mim e do mundo. quem é livre, liberta. Na escolha há perdas, nas perdas aprendizagens. Ser o que se é, na contínua construção, nos tira da condição de escravos. O ontem habita o agora no fazer o amanhã. Somos o que pensamos somos nossas ações. *Dra. Rosângela Rossi Psicoterapeuta. Escritora. Filósofa Clínica Juiz de Fora/MG

Não sei quantas almas tenho*

Não sei quantas almas tenho. Cada momento mudei. Continuamente me estranho. Nunca me vi nem acabei. De tanto ser, só tenho alma. Quem tem alma não tem calma. Quem vê é só o que vê, Quem sente não é quem é, Atento ao que sou e vejo, Torno-me eles e não eu. Cada meu sonho ou desejo É do que nasce e não meu. Sou minha própria paisagem; Assisto à minha passagem, Diverso, móbil e só, Não sei sentir-me onde estou. Por isso, alheio, vou lendo Como páginas, meu ser. O que segue não prevendo, O que passou a esquecer. Noto à margem do que li O que julguei que senti. Releio e digo: “Fui eu?” Deus sabe, porque o escreveu. *Fernando Pessoas

O segredo*

“A um ele confia uma coisa e confia outra coisa a outro, certificando-se de que eles jamais irão comunicar-se entre si.” Elias Canetti Vivemos num mundo onde o segredo deixou de existir, em que tudo o que é pensado, antecipadamente, já é sabido. O segredo é o lugar em que o indivíduo se submete à verdade daquele que sabe calar. Nas ditaduras o segredo é a vitalidade dos que sabem mandar, e principalmente dos que temem por algo que foge do seu controle. As massas alardeiam, o poder consente o seu silêncio em fúria. O poder mata o Outro com seu segredo, a massa divulga e joga o corpo aos leões. Todo segredo pode ser para o Bem e para o Mal. O calar dos que recebem ordens é fruto do bom entendimento entre o que sabe mandar e o que sabe seguir as regras de forma ordeira. Esse fantasma jamais deixou de existir. As ditaduras de Direita e de Esquerda são o espelho dos que entendem o calar. Canetti demonstrou que o mais profundo dos segredos “é o que se desenvolve no interior do

Fragmentos Filosóficos, Delirantes, Criativos*

"(...) o que descobrimos no transcorrer de uma vida criativa é uma série infinita de rupturas provisórias. Nessa viagem não há ponto de chegada, porque é uma jornada para dentro da alma." "O processo criativo é um caminho espiritual. E essa aventura fala de nós, de nosso ser mais profundo, do criador que existe em cada um de nós, da originalidade, que não significa o que todos nós sabemos, mas que é plena e originalmente nós." "Essa misteriosa entrega, a criativa surpresa que nos liberta e nos abre para o mundo, permite que algo brote espontaneamente. Se formos transparentes, se nada tivermos a esconder, o abismo entre a linguagem e o Ser desaparece. Então a Musa pode se manifestar." "Ao se entregar às formas arquetípicas latentes na pedra, Michelangelo não produziu estátuas, mas libertou-as. Ele seguiu conscientemente a ideia platônica de que o aprendizado é na verdade memória." "Sem divertimento, o aprendizado e a evoluç

Dispersos*

Não havíamos marcado hora, não havíamos marcado lugar. E deu-se este encontro. Andávamos pelas ruas da cidade tão felizes. Por fim não sabíamos mais se andávamos ou se voávamos... Corria um vento tão gostoso. A brisa balançava os cabelos dela para lá e para cá. E eu ficava com ciúme do vento e dos carinhos que ele fazia nos cabelos dela. Os estranhos eram apenas os amigos que nós ainda não conhecíamos. Nossos olhinhos diziam que todo mundo gostaria de se mudar para um lugar mágico Corríamos e soprávamos o vento andando por aí. Ríamos dos relâmpagos e dos trovões. E bebíamos as águas das tempestades. Quando nos dávamos conta do lugar onde estávamos, já tínhamos ido embora. A meia noite fechou seus olhinhos e na madrugada o canto e a dança dela impediram que eu fosse embora. E descobrimos que a palavra amor andava meio vazia, tinha tão pouca gente dentro dela.... *José Mayer Filósofo. Livreiro. Poeta. Estudante na Casa da Filosofia Clínica Porto Alegr

Poema de Sete Faces*

Quando nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida. As casas espiam os homens que correm atrás de mulheres. A tarde talvez fosse azul, não houvesse tantos desejos. O bonde passa cheio de pernas: pernas brancas pretas amarelas. Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração. Porém meus olhos não perguntam nada. O homem atrás do bigode é sério, simples e forte. Quase não conversa. Tem poucos, raros amigos o homem atrás dos óculos e do bigode. Meu Deus, por que me abandonaste se sabias que eu não era Deus se sabias que eu era fraco. Mundo mundo vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não seria uma solução. Mundo mundo vasto mundo, mais vasto é meu coração. Eu não devia te dizer mas essa lua mas esse conhaque botam a gente comovido como o diabo. *Carlos Drummond de Andrade

A escuta das palavras*

                                           A palavra, em deslocamento por seus muitos territórios, também busca uma legibilidade para sua escuta escutando-se. Aptidão rara em meio as ditaduras da semiose verbal. Ao conviver sempre no mesmo lugar, ainda que em línguas diferentes, é excepcional vivenciar as dialéticas da aventura.      Em um mundo apropriadamente imperfeito, pode ser indizível, ao dicionário conhecido, encontrar o melhor para si. Essa suspeita se insinua nas possibilidades do instante perfeito nas entrelinhas da imperfeição. Essa transgressão da zona areia movediça de conforto existencial, se aproxima de um mundo razoável e suas contradições. Assim pode acolher e dialogar com a mutante medida de todas as coisas em cada um.   Ao destacar o viés dessas poéticas da irreflexão, se esboça uma negação de que tudo já foi dito, pensado, tentado. Nele um espaço desconhecido se abre como proposta. Talvez a escola, ao ensinar a ler e escrever, também pudesse incl

Soneto de Fidelidade*

De tudo ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento. Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa me dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. *Vinicius de Moraes

Compreensão e Interpretação***

“A interpretação se funda existencialmente na compreensão e não vice-versa.”                                            Martin Heidegger Estamos num momento histórico do Brasil que precisamos compreender bem os acontecimentos, pois o ato de interpretar passa pela compreensão de todos os acontecimentos do cenário político do país e que servem de prato para os esfomeados que mais regurgitam suas interpretações, ou menos conseguem compreender o momento histórico devido à fome de interpretar. Não é só a política. O Brasil não consegue mais se compreender. Está longe de ter a consciência do que está realmente acontecendo. O velado de verdades autoritárias surge como explicações para legitimar e consolidar uma ordenação de ideias irrefutáveis. Uma boa parte da mídia sabe interpretar aquilo que não consegue compreender, ou melhor, se tem a capacidade de compreensão se ilude com suas próprias intenções ideologizadas de compreender o que está diante de si. Consegue apenas i

As estações e o jardim*

Acontecia algo engraçado comigo Toda vez que ela se alegrava E me fazia sorrir Eu sentia uma vontade Enorme de explicar O quanto eu a amava. Não adianta atropelar as estações Se apressar muito, machuca... Primeiro amei a sua alma E só bem depois Apaixonei-me pelo seu corpo. E na estação mais triste Eu te prometo poesias Me devolves cantos e danças E se, acaso, eu te interpretar mal Prometes te traduzir para mim Pois és escrita em língua esquisita E eu não consigo te ler... As folhas do outono Formaram um coração quebrado No pátio do meu jardim... *José Mayer Filósofo. Livreiro. Poeta. Estudante na Casa da Filosofia Clínica Porto Alegre/RS

O fazedor de amanhecer*

Sou leso em tratagens com máquina. Tenho desapetite para inventar coisas prestáveis. Em toda a minha vida só engenhei 3 máquinas Como sejam: Uma pequena manivela para pegar no sono. Um fazedor de amanhecer para usamentos de poetas E um platinado de mandioca para o fordeco de meu irmão. Cheguei de ganhar um prêmio das indústrias automobilísticas pelo Platinado de Mandioca. Fui aclamado de idiota pela maioria das autoridades na entrega do prêmio. Pelo que fiquei um tanto soberbo. E a glória entronizou-se para sempre em minha existência. *Manoel de Barros

Desapegar-se*

Desapegar-se é fundamental para que tenhamos paz no mundo a partir de nós mesmos; é determinante para o nosso próprio crescimento rumo à capacidade de ser feliz! Outrossim, desapegar-se significa escolher corajosamente a sabedoria e a lucidez de destituir-se da obsessão da posse que outrora pudera ser tão alimentada. Significa ainda, abnegar-se da permissividade para que sentimentos tão vis não venham mais a nos possuir, entorpecendo os nossos sentidos tão somente para produzir uma tóxica pseudo ilusão de que perdemos ao desprender ou libertar justificados unicamente pela dignidade de respeitar e, logo, permitir que a vida siga fluindo como a água desde a nascente até desaguar no oceano que tanto toca e une sem prender continentes chamados pessoa. Desapegar-se significa conquistar poder para que nada mais nos domine, para que nada mais brinque conosco como se fôssemos marionetes destituídas de livre arbítrio. Em outras palavras, desapegar-se representa não

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