“Nosso futuro é tão
irrevogável
Quanto o rígido ontem.”
Jorge Luis Borges
(do poema Para um
versão do i ching)
A dor é minha, a
semente que guardo nos olhos, fonte de energia que trago no peito, o alarme da
vida, o sopro do coração, a braceada perdida no tempo, o levante dos
invisíveis, o Nada e o nadar no mar, a perdição dos esquecidos, a morte dos
ricos, o apodrecimento dos pobres, o casamento dos notívagos que, soturnos,
vagueiam noite adentro até encontrar o primeiro templo e lá jurar amor eterno a
Deus e esquecer seu Outro, o lado da vida está aberto ao desconhecido.
A miséria de poder
ver-se nu em águas de um rio sujo que preserva a vida dos homens e mata os
peixes já sem oxigênio. Um dia esse poema matará o homem em sua redoma de
dominar a natureza. A irredutível vagabundagem dos poetas em quererem ser
malditos e esquecer a linguagem dentro de si.
O desperdício do olhar que não
resulta mais em poética. A doença apressada em ódio de uma sociedade que se
afunda em filas e fugas do sonho para viver só a realidade. Enumerar não uma só
razão para atravessar o rio sujo, e sim várias para tentar escalar paredões e prédios
tal qual o malinês imigrante.
Quase morto, vejo
diante do sonho o espelho, o não acordar nesta vastidão destruída pelas águas
que invadem uma cidade, todos a fugir para o cume mais distante; e lá, quase
ninguém para conversar, encontro um velho sentado em uma pedra, imenso, dedos
longos, esbaforido, olhar a salvo de um fim que nunca termina, nele encontro o lado de todos os velhos amigos que
morreram nessa travessia, todos os desconhecidos em suas fanáticas formas de
viver, de torcer, de amar, de matar e desprezar o Outro.
Me vi entre eles, saio
do rio em direção ao velho ofegante, em plena forma de viver vou recitando uma
canção até o seu encontro. − O fim não existe mais, a continuar vamos avante,
de som em som cantamos a vida que está a começar, o tempo que não se difere de
mais nada, ando invisível a tudo isso, por isso estou aqui deste lado do rio.
*Prof. Dr. Luis Antonio
Paim Gomes
Filósofo. Editor. Livre Pensador.
Porto Alegre/RS
Filósofo. Editor. Livre Pensador.
Porto Alegre/RS
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