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Mostrando postagens de novembro, 2021

Super-Heróis do Cotidiano*

  Se você só vê gente viva e já acha que está de bom tamanho; se o mais próximo que chegou de um gnomo ou fada foi através de desenhos animados; e se até considera viagem astral uma ideia bem bolada, mas prefere apreciá-la em relatos alheios, esta crônica é pra você. Pra você que, assim como eu, também é uma pessoa comum. Ou seja: nunca viu espírito, não tem o dom da clarividência, não faz ideia de como se hipnotiza alguém e também não consegue ir muito além do ascendente nas interpretações de mapa astral.  Somos pessoas comuns, com nossas limitações, mas também com potencialidades e é sobre elas que quero falar. Muito embora não consigamos acessar esses níveis mais sutis da existência, nós, seres humanos comuns, também temos poderes. Super poderes, pra falar a verdade! Cito quatro, primordialmente: autoconhecimento, autogoverno, auto-superação e auto-esquecimento. Autoconhecimento é olhar com honestidade e franqueza pra si mesmo, analisando virtudes e qualidades, mas também fragil

Poéticas da Singularidade*

Ainda escuto seu caminhar por entre a Relva. Contemplo seu poema “Song My Self” e mergulho na sonoridade de cada verso. Raios de sol tênues acordam a natureza outonal. Identifico-me de corpo e alma, sou ele em mim, sou natureza e Deus. Barba Branca clamam a sabedoria do mestre neste prenuncio dos setenta anos que se aproxima de mim. Desapego-me da superficialidade e dos excessos deste mundo seduzido pelo consumismo midiático. Sou ET em meio a loucura da cegueira branca dos homens robôs maquiados pela ilusão. Liberto-me da hipocrisia dos jogos que disfarçam para ter poder. Saudo-te velho Walt Whitman! Rendo-me a tua sabedoria e aprendo humildemente o caminho do servir e amar. Ainda nas sombras das árvores robustas, expiro e relaxo. Nada quero a não ser viver com menos e poder caminhar contemplando sem mais ter que. Rastro da lua minguante ainda me penetram… desapego-me. E me basta, neste agora! O Sol e Mercúrio se abraçam e me convidam a um novo caminhar, e m

Porta-Retratos*

  “Quando não chega carta planejo arrancar o calendário da parede, na sessão de dor.”                                                  Ana Cristina Cesar                                                                                                       Andas beijando meninas e meninos, claro, não na mesma ordem. Eu beijei por última vez uma parede, aquele velho porta-retratos, enquanto voltavas de viagem, anos 1980 dos velhos amores. Estou pronto ao novo tempo, o distanciamento trouxe na bagagem a solidão, o passado das outras vidas que vivi se aproxima na mesma intensidade viral da poesia em movimento. Foi como um tsunami, a força das águas levou meus sentimentos para além desta cidade. O vírus espalha sombras do esquecido, ele não consegue entrar no que se fecha, cerrado, o peito fortalecido pelo respeito, a solidariedade, não o medo, este já existe em todos os cantos deste país. Janelas abertas, sol que entra junto com a lua, invasora dos acontecimentos.   Ando relendo os

Bom dia! Em pré-venda na Editora Sulina.

 

Subjuntivos*

Talvez esse imenso lugar nativo ficasse inexplorado, não fora o movimento desconcertante a acessar as inéditas regiões. Essa aptidão de estranhamento, tão desmerecida, aprecia desnudar o espaço novo diante do olhar, interseção limiar com as demais teias discursivas. Através do viés desconsiderado é possível apreender e dialogar com a pluralidade transgressora das fronteiras conhecidas. Ao fazer possível o impossível se pode vislumbrar a ótica selvagem, um pouco antes de ser cooptada pelo saber instituído.   A cogitação sobre a origem dessa matriz já contém, em si mesma, a multiplicidade de versões. As lógicas da incerteza elaboram seus vocabulários brincando com os vestígios da irrealidade. O devir instintivo ensaia relatividades ao querer mostrar paradoxos, alternâncias, dialetos para se entender ou sentir que a perfeição de toda imperfeição nem sempre vai ser explicável. Sua opinião escolhe desmerecer todo beco sem saída. Seu saber especulativo, recheado de incertezas, promove

O preço de escrever*

Este é o artigo número 200 deste blog. Nunca imaginei que manteria essa atividade por tanto tempo com tamanho entusiasmo e regularidade. Começou como uma brincadeira e foi ficando. Antes de qualquer coisa, quero agradecer aos leitores que me acompanharam, criticaram, aconselharam e, especialmente, tiveram paciência comigo na riqueza e na pobreza dos textos. Preciso de vocês, mas também devo confessar algo que talvez não gostem de saber. Escrever é o verdadeiro prazer, ser lido é uma satisfação complementar. Jamais tive obrigação alguma de produzir textos. Escrevo porque gosto, sinto prazer, relaxo, me forço a pensar, desligo do cotidiano e no final, quando nasce o texto, quase sempre, sou possuído por um sentimento de arrebatamento. Em cada argumento que produzo, me dou o luxo de viajar com as ideias para qualquer lugar. Posso também ser quem eu quiser e, se me der vontade, utilizar minha caneta como uma arma potente e terrível, criticando, polemizando, elogiando, detonando, fazendo

Prêmio Jacarandá - Editora do Ano! Parabéns ao Luis Antonio Gomes e o time Sulina! Há mais de 70 anos compartilhando inovação e cultura.

 

Filosofia Clínica e os Rótulos*

Os Papéis Existenciais são rótulos em Filosofia Clínica. Segundo Lúcio Packter, o tópico estrutural XXII – Papel Existencial diz respeito aos rótulos, aquilo que a pessoa utiliza como princípio de identificação, mas, em alguns casos, esta identificação pode ser uma roupagem.  Como podemos identificar um Papel Existencial ? Na historicidade da pessoa aparecem os Papéis Existenciais ou rótulos por nomeação direta, como: “eu sou filho”, “eu sou pai”, “eu sou terapeuta” e assim por diante. Esta pessoa está dando um parecer sobre uma roupagem existencial com a qual se apresenta em diferentes âmbitos da existência dela. A própria pessoa é quem confere nomes ao Papel Existencial. Ele é atribuído por ela mesma, muitas vezes, para cada circunstância de sua vida. Compete à própria pessoa assumir e ter isso para com ela como um Papel Existencial ou não. É possível um Papel Existencial fazer parte da pessoa, mas sendo atribuído de fora para dentro por outra pessoa, isso via agendamentos. P

Leituras clínicas*

  “O ponto de vista Partilhante, ao se deixar acessar pelos termos agendados, reivindica um leitor de raridades. O fenômeno terapia aproxima papéis existenciais da clínica com a arqueologia. Sua estética cuidadora, a descobrir e proteger inéditos, mescla saberes para acolher as linguagens da singularidade.”                                                                              Hélio Strassburger                                     O trecho citado está na obra “A palavra fora de si” do professor Hélio e especificamente no texto dedicado “As linguagens da terapia”. Aqui é essencial dar-se conta de que o veículo que nos faz percorrer caminhos dentro do espaço clínico é a linguagem, e nesse sentido, é papel do cuidador dar espaço de passagem e fornecer proteção às cenas que se revelam sessão após sessão, acolhendo o conteúdo. Durante esses 4 anos de clínica, atendi algumas mulheres (sim, hoje falarei delas). Sou grata pela confiança que depositam no processo clínico, sei dos meus

Fiz cinquenta anos, e agora?*

A medicina diz que começamos a envelhecer a partir dos 30 anos de idade. Comigo não foi bem assim. Comecei a envelhecer quando meu filho nasceu. Por coincidência tinha justamente trinta anos. Achava que como pai tinha responsabilidade financeira e gastava todos meus dias trabalhando para sustentar a família. Chegava em casa tarde da noite, acabado de tanto cansaço, mal conseguindo aproveitar o calor de um lar. Voltei a ficar jovem quando nasceu meu neto.    Brincamos juntos todas as manhãs na pracinha do bairro e me renovo todo dia.     Comecei a envelhecer quando me preocupei em esconder os primeiros fios de cabelo branco. Rejuvenesci quando deixei os grisalhos crescerem natural e desalinhadamente por cima das orelhas. Sentia-me um velho trabalhando sem prazer, amargurado, reclamando e só pensando no dia da minha aposentadoria. Depois de aposentado, virei criança. Esta conversa de envelhecer depois dos trinta começava a cair por terra. Pensava que depois de ficar viúvo, a vida não

A noção de mundo: uma breve contribuição a partir de Heidegger*

Quando, a partir da filosofia clínica, falamos sobre compreender o “mundo” do outro, tal afirmação pode soar como um termo equívoco. Trata-se do mundo enquanto representação de mundo, inspirada na noção de “homem como medida de todas as coisas”, de Protágoras de Abdera, atualizada em Arthur Schopenhauer ao afirmar que “o mundo é minha representação”. Isto é mostrado claramente nos antigos Cadernos utilizados na formação de filósofos clínicos, sobretudo na segunda metade dos anos de 1990. Mas, a fim de contribuir para o entendimento da noção de mundo do partilhante a qual o filósofo clínico busca acessar via recíproca de inversão ao longo das sessões, podemos recorrer ao pensamento de Martin Heidegger. O filósofo de Messkirch pautou toda sua vida a pensar a “questão do ser”. Uma noção de “ser” que, aliás, é diferente de seus predecessores dos últimos vinte e cinco séculos. Para Heidegger, todos os entes são precedidos pelo ser. Partindo de um vice-conceito – assumindo-o como sim

Anotações e Reflexões de um Filósofo Clínico*

Amigos, não basta saber ler para compreender um texto. Para absorvê-lo mais ou menos inteiramente, é preciso conhecer o campo de sentidos em que foi escrito.  Isto é: o domínio da língua não se esgota na leitura e na escrita proficiente. A língua é composta por muitas linguagens que se inscrevem em diferentes regiões hermenêuticas. Ao transitarmos por um texto escrito numa região hermenêutica desconhecida, encontramo-nos numa situação de analfabetismo simbólico; não o interpretamos corretamente porque desconhecemos os complexos nos quais os seus símbolos se relacionam. Estamos como que diante de um texto escrito noutra língua, uma língua ignorada. Todavia – e aí está a tragédia –, acreditamos compreender o lá está colocado, porque sabemos o significado ordinário daquelas palavras. O exercício intelectual mais difícil é o reconhecimento da própria ignorância: se somos capazes de ler todas as palavras de um texto, como podemos chegar à conclusão de que talvez não o compreendamos? E

Ler e escrever como terapia*

  Os caminhos para se chegar a uma melhor condição de bem-estar subjetivo são tão diversos quantos são os indivíduos. Para alguns, conversar semanalmente com o terapeuta é o melhor dos caminhos. Para outros, a alma sorri mesmo é com uma boa conversa jogada fora junto daqueles amigos sinceros que dizem coisas bonitas com a mesma naturalidade com que convidam a refletir sobre as falhas e fissuras no seu jeito de ser e existir. Tão bem faz, igualmente, para algumas pessoas, a prática da fé e da espiritualidade, ou da solidão momentânea, para ficar de encontro com seus próprios pensamentos, com seus próprios sentimentos.  A lista é infindável: brincar com os netinhos, tomar chimarrão na praça, paquerar ao pôr do sol, cozinhar para o amor da sua vida, cuidar de plantas e jardins… Tudo isso faz bem, gera prazer e satisfação em viver, para muitas pessoas. Para um sem número de sujeitos, porém, existe um método que historicamente se estabeleceu como charmoso para retratar das dores e alegria

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