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Filosofia Clínica: retomada do olhar filosófico*

 “Somente quando a estranheza do ente nos acossa, desperta e atrai ele a admiração. Somente baseado na admiração [...] surge o ‘porquê’. Somente porque é possível o porquê enquanto tal, podemos nos perguntar, de maneira determinada, pelas razões e fundamentar. Somente porque podemos perguntar e fundamentar foi entregue à nossa existência o destino do pesquisador.” (HEIDEGGER, Martin. O que é Metafísica?. Col. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1973, p. 242.) Hoje a filosofia acadêmica ensinada nas faculdades e universidades tende a ser uma grande assimilação dos conteúdos escritos dos pensadores que nos precederam. Heidegger nos advertia em suas obras sobre a possibilidade mais comum entre os homens, que é o de estar na inautenticidade. Esta consiste no olhar derivado do mundo, na perspectiva mais cotidiana, vivendo segundo o que “se diz”. Ao contrário da autenticidade, que se dava com o olhar mais voltado para o espanto e admiração diante do que nos rodeia ou constitui

Ismália*

Quando Ismália enlouqueceu, Pôs-se na torre a sonhar… Viu uma lua no céu, Viu outra lua no mar. No sonho em que se perdeu, Banhou-se toda em luar… Queria subir ao céu, Queria descer ao mar… E, no desvario seu, Na torre pôs-se a cantar… Estava perto do céu, Estava longe do mar… E como um anjo pendeu As asas para voar… Queria a lua do céu, Queria a lua do mar… As asas que Deus lhe deu Ruflaram de par em par… Sua alma subiu ao céu, Seu corpo desceu ao mar… *Alphonsus de Guimaraens

A palavra reminiscência*

As narrativas da historicidade, ao reviver antigas memórias, atualizam uma retórica das evidências. Assim é possível a reinvenção pessoal na própria história. Sua matéria-prima, ao mesclar-se com os dias de hoje, é capaz de novas interseções na estrutura de pensamento. Essa intencionalidade discursiva emancipa periferias de si mesma. Ao rememorar eventos, esses já são outros eventos. As novas ideias e vivências, ainda na perspectiva subjetiva, podem modificar a malha intelectiva. Esse movimento permite a contemplação e qualificação do ser singular na alternância dos endereços existenciais. É comum que as antigas referências de lugar, tempo e circunstância apresentem, ao olhar de agora, um território de estranheza, o qual, ao transbordar, traduz-se como ressignificação. A reapresentação dos dados da memória atualiza o discurso pessoal para sobreviver. A aptidão de rememorar, ao transportar e modificar suas representações, esboça uma estética para decifrar incógnitas. Su

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Uma intuição não se prova, se vivencia" "O tempo é uma realidade encerrada no instante e suspensa entre dois nadas" "Como realidade, só existe uma: o instante. Duração, hábito e progresso são apenas agrupamentos de instantes, são os mais simples dos fenômenos do tempo" "(...) Mas, por firmes que sejamos, jamais nos conservamos inteiros, porque nunca fomos conscientes de todo o nosso ser"  "Para as concepções estatísticas do tempo, o intervalo entre dois instantes é apenas um intervalo de probabilidade; quanto mais seu nada se alonga, maior é a chance de que um instante venha terminá-lo" "(...) leva em conta não apenas os fatos, mas também, e sobretudo, as ilusões - o que, psicologicamente falando, é de uma importância decisiva, porque a vida do espírito é ilusão antes de ser pensamento" "Mas a função do Filósofo não será a de deformar o sentido das palavras o suficiente para extrair o abstrat

Desfabricar*

“[...] mas só porque tínhamos de nos cingir aos fatos não queria dizer que devíamos deixar de pensar ou não era permitido usarmos a nossa imaginação...” Paul Auster A verdade é que quando escrevemos, digo, escrevo no impulso. A razão nunca abandonou-me, exceto no momento em que tenha perdido totalmente a fé na lei sonhada pelos homens, regida por uma onipotência, vontade acima dos homens, exceto, diante da razão traiçoeira. A razão ou fé, pensei: a luz no fim do túnel, é a única que me engana [...]  Andei pensando em fazer uma saída do Rio Grande do sul, ou seja, esquecer por lapso de tempo não compreendido, levar a bandeira da vitória ou da derrota, pior, achar que se é na identidade que a alma deva ser reconfortada...Me perco, estou à deriva. Os braços avançam pretensamente à margem do nunca encontrado outro lado da paz. Um rio tem sua extensão de medo e finitude. A existência requer mais do que braços longos e ágeis, precisa ter técnica, unidade e fragmento a cortar o

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) temos de descobrir a linguagem, como estamos descobrindo o espaço; o nossos século será, talvez, marcado por essas duas explorações" "(...) os desvios (com relação a um código, a uma gramática, a uma norma) são sempre manifestações de escritura: onde se transgride a norma, aparece a escritura como excesso, já que assume uma linguagem que não estava prevista" "O escritor está condenado a trabalhar sobre signos, para variá-los, desabrochá-los, não para deflorá-los: a sua forma é a metáfora, não a definição" "Repetir o exercício (ler várias vezes o texto) é liberar pouco a pouco os seus 'suplementos'" "De todas as matérias da obra, só a escritura, com efeito, pode dividir-se sem deixar de ser total: um fragmento de escritura é sempre uma essência de escritura. Eis por que, quer se queira quer não, todo fragmento é acabado, a partir do momento em que é escrito" "(...) a escritura começa onde a fa

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