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Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) o privilégio de minha perspectiva parece absoluto e minha percepção indeclinável, tal privilégio só o adquiro a título provisório: não é o de uma série 'subjetiva' reservada para mim, faço de alguma forma tudo o que de mim dependa para que o mundo vivido por mim seja acessível a outros, já que apenas me distingo como um nada que não lhe tira nada, ponho no jogo do mundo meu corpo, minhas representações, meus próprios pensamentos enquanto meus e tudo o que se chama eu só é, em princípio, oferecido ao olhar estrangeiro, se este quiser aparecer" "(...) o mundo só é nosso lugar natal porque somos, de início, como espíritos, o berço do mundo" "(...) o segredo do mundo que procuramos é preciso, necessariamente, que esteja contido em meu contato com ele. De tudo o que vivo, enquanto o vivo, tenho diante de mim o sentido, sem o que não o viveria e não posso procurar nenhuma luz concernente ao mundo a não ser interrogando, explicando minha fr

A palavra devaneio*

É incomum notar a existência de algo que restaria silenciado, não fora um olhar absorto, indeterminado. Sentir improvável de sonhar acordado. Esse lugar de refúgio a esteticidade acolhe um viajante das quimeras.    Nessa região, onde eventos sem nome rascunham invisibilidades, é possível descobrir vias de acesso de essência não epistemológica. Seu teor de matriz intuitiva, ao pluralizar versões desconsideradas, faz acordar aquilo que dormia. Ao desalojar esses fenômenos, desconstrói o aspecto irrealizável das promessas. Esses momentos reivindicam a singularidade alterada para se mostrar. Assim a pessoa, deslocando-se por esses labirintos da interseção, ao ser ela mesma, já é outra.    As estéticas do devaneio convidam ao exercício de ficção. Um desses lugares onde o inesperado atua. Inicialmente desconfortável nesse chão desconhecido, o sujeito pode vivenciar insegurança, dúvida, receio. No entanto, ao persistir as visitas por esse ambiente especulativo, pode desvendar-se e

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Reconhecer no estranho o que é próprio, familiarizar-se com ele, eis o movimento fundamental do espírito, cujo ser é apenas o retorno a si mesmo a partir do ser diferente. É por isso que toda formação teórica, mesmo o cultivo de idiomas e concepções de mundos estrangeiros, é a mera continuação de um processo de formação, que teve início bem mais cedo" "O artista livre cria sem receber encomenda. Parece que o que o caracteriza é a completa independência de seu trabalho criativo, o que, por isso, lhe confere, mesmo socialmente, as feições características de um excêntrico, cuja formas de vida não podem ser mensuradas de acordo com as massas que obedecem aos costumes públicos" "Em princípio, compreender é sempre um mover-se nesse círculo, e por isso é essencial o constante retorno do todo às partes e vice-versa. A isso se acrescenta que esse círculo está sempre se ampliando, já que o conceito do todo é relativo, e a integração em contextos cada vez ma

Auto de fé da resistência*

“Assim se explica que até nossos dias acreditem mais firmemente na existência de uma cor quimérica do que na de Deus.” Elias Canetti Canetti, nasceu na Bulgária, judeu de origem serfadita, a língua materna espanhola, teve sua formação em mais de um lugar, circulou pela Inglaterra, depois Viena e adotou o alemão para escrever. Com doutorado em Química, a escrita literária nunca foi deixada de lado, tornou-se um estudioso da psicologia. Como Otto Maria Carpeaux[1] escreveu: “Precisava-se, aliás, de um esforço de reportagem literária para identificar a personalidade desse autor esquivo.”  O romance que ofuscou os nazistas, que foi destruído na época da cegueira humana, Die Blendun – que ganhou em inglês o título Auto de Fé –, abriu meus sentidos nos anos 1980. Ainda hoje, volta e meia retorno a ele, o inesperado surge nas leituras e no que separa o leitor de uma grande obra. Logo uma obra que tem o personagem que se afunda em sua erudição, na incompletude do mundo, no que o

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) a estupidez humana é grande, e a bondade humana não é notável" "Há entre mim e o mundo uma névoa que impede que eu veja as coisas como verdadeiramente são - como são para os outros" "Sinto-me múltiplo. Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos que torcem para reflexões falsas uma única anterior realidade que não está em nenhuma e está em todas (...) Sinto-me viver vidas alheias, em mim, incompletamente, como se o meu ser participasse de todos os homens, incompletamente de cada, por uma suma de não-eus sintetizados num eu postiço" "(...) ninguém pode esperar ser compreendido antes que os outros aprendam a língua em que fala" "Era eu um poeta estimulado pela filosofia e não um filósofo com faculdades poéticas. Gostava de admirar a beleza das coisas, descobrir no imperceptível, através do diminuto, a alma poética do universo" "Toda obra fala por si, com a voz que lhe é própria, e naquela ling

Respostas?*

Vivo a vida repleto de perguntas. Tudo é questionável, desde as coisas mais inacessíveis até as cotidianas mais banais. Gostaria, se possível, de todas as respostas. Mas, não as encontro. Quando penso nas respostas, não me refiro às diversas criadas para nos consolar com alívios. Essas encontramos aos montes. As ciências, as psicologias, as filosofias, as religiões, todas estão aí a nos proporcionar respostas para quase todas as nossas perguntas. Entretanto, o limite dessas respostas está explícito nos regionalismos. Verdades, valores, conhecimentos são todos restritos a um grupo, contexto cultural e histórico, dentre outros limites. Não há uma só resposta que valha para todas as perguntas. Acho que se houvesse, facilmente poderia ser partilhada por todos, haja vista que é uma busca que, se não geral, pelo menos se encontra num grande número de pessoas. Suspeito que a grande vitória da filosofia foi postular seus limites e contingências, mesmo depois de grandes sistemas

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"O pensamento só é interessante quando é perigoso. Perigoso para a opinião consagrada e ronronante que serve de fundamento a todos esses 'pareceres especialistas' em que se refestela o poder" "São cada vez mais numerosos os que nada têm a dizer e o dizem em voz alta" "Num momento em que predomina o nomadismo existencial, a divagação intelectual deve oferecer resposta, como num eco. Antes a pergunta que a solução. A precaução, supostamente científica, deve dar lugar à audácia das ideias" "Já não se trata de ser um adulto sério e tensionado para a perfeição de um 'estado' estável, mas, pelo contrário, uma eterna criança, sempre em devir e ávida pelo que se apresenta" "O sentido para a pessoa é fornecido pela pluralidade das máscaras que a constituem, e pelo contexto no qual suas diversas máscaras poderão expressar-se" "(...) Essa polissemia repousa no fato de que o arquétipo é 'pré-substan

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