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Mostrando postagens de abril, 2018

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) é a mutação existencial coletiva que terá a última palavra! Porém os grandes movimentos de subjetivação não tendem necessariamente para um sentido emancipador"  "(...) universos plásticos insuspeitados" "(...) o que denomino uma tal singularidade se torne uma chave, desencadeando um ritornelo complexo que não apenas modificará o comportamento imediato do paciente, mas lhe abrirá novos campos de virtualidade. A saber, a retomada de contato com pessoas que perdera de vista, a possibilidade de restabelecer a ligação com antigas paisagens, de reconquistar uma segurança neurológica. Aqui uma neutralidade rígida demais, uma não intervenção do terapeuta se tornaria negativa; pode ser necessário, em tais casos, agarrar as oportunidades, aquiescer, correr o risco de se enganar, de tentar a sorte, de dizer 'sim, com efeito, essa experiência talvez seja importante'. Fazer funcionar o acontecimento como portador eventual de uma nova constelação

Nadantes*

                                    “Universal como a violência e a morte, a dor nos iguala.”                           Michel Serres Milhões de pessoas em suas vidas, em casas, sós ou   acompanhadas, partidas, inteiras, felizes, tristes, por meio e metade de um tudo, e todos estão algures – lugar próximo deste mundo. Eu aqui, inteiro, em pedaços, parte do todo, nau perdida em sonhos, esperto para o amanhã. Fuga necessária para o outro lado do rio, braços e pernas aquecidos para entrar a nado e nado até o lado seguro da vida. Depois, então a me secar ao vento, de outro lugar, sem luzes difusas de restos e sobras do passado, feito no tempo que mete medo aos passantes. Passado e presente, entre roupas e dores alimentadas de promessas do outro lado de lá, do tempo que ficou marcado como se fosse dor de dente. Esquecido de tudo, estar prestes e se atirar nas águas que podem levá-lo longe, bem longe das verdades em compotas. A vida − depois de tudo − é um corpo que som

Artesão da palavra***

"Grafar é insubordinar-se contra o código, é procurar dizer o que ainda não se sabe dizer (...) é inventar uma nova solução para o que se declarou não resolvido"                                                      Donaldo Schuler Ao querer dizer dos manuscritos, muitos conteúdos ficam sem tradução adequada. Na pluralidade dos espaços vazios se entrevistam outros enredos. No esboço das coreografias, a linguagem faz referência aos inéditos de si mesma. Não basta pensar os pressupostos para decifrar os ânimos da comunicação. Um pouco antes de ser entendida, fica a zanzar entrelinhas de si, como um querer dizer sem nexo. Uma leitura desatenta pode deixar o texto intocado, sem perceber o 'logos' significativo a esparramar vestígios. A natureza se mostra insuficiente a uma só versão. Para apreender os sentidos sob os disfarces, é impreciso descrever fatos e intenções só com base na literalidade. A partir da interrogação especulativa, a se renovar em pági

Mulheres admiráveis*

Frida Khalo, Fernanda Montenegro, Iris Apfel, Cora Carolina, Rainha Elizabeth, Adélia Prado... São lindas estas mulheres cujo tempo só as ajudou. Acenderam com as rugas trazendo sabedoria para todos. Mulheres que são e foram sempre coerentes com o mais profundo de si mesmas. Mulheres admiráveis, autênticas e livres. O que as fizeram diferentes, na frente e potentes? Simplesmente acreditaram nelas e avançaram na realização de suas vontades. Não é o sucesso que importa, mas a capacidade delas de romper as barreiras de muitos preconceitos, de muitos desafios, num mundo profundamente machista, e serem capazes de superar todos obstáculos para serem elas mesmas. A idade chegou e elas foram e vão trabalhando em seus dons... *Dra. Rosângela Rossi Psicoterapeuta. Escritora. Filósofa Clínica. Livre Pensadora. Juiz de Fora/MG

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Ao nomear, com excessiva precisão, aquilo que se apreende, mata-se aquilo que é nomeado. Os poetas nos tornaram atentos a tal processo" "Do momento em que há vida, há labilidade, dinamismo. A vida não se deixa enclausurar. Quando muito é possível captar-lhe os contornos, descrever-lhe a forma, levantar suas características essenciais" "Como indica Nietzsche: 'É preciso esperar e preparar-se; espreitar o jorrar de fontes naturais, estar preparado, na solidão, para visões e vozes estranhas'" "(...) estar atento a uma lógica do instante, apegada ao que é vivido aqui e agora. Tal lógica do instante nada mais tem a ver com a vontade racionalista que pensa poder agir sobre as coisas e as pessoas. Ela é muito mais tributária do acaso, de um acaso que ao mesmo tempo é necessário; próxima, nisto, do que os surrealistas chamavam de 'acaso objetivo'" "O próprio do acontecimento é que ele se dá de maneira inesperada

Niilista da Paz*

"Atirou-se contra os espelhos, como uma alma-de-gato cega." Severo Sarduy   Vida, ó vida das cidades, Aleppo, Rio, saídas para o sol, ruas de fugas, outros perdidos, mortes em nome do Estado: evocam − Eu e Tu, alusão de um Deus. Se morre, mata-se em nome do Tu, o Eu mata em nome da Paz. Tenho dificuldade racional de compreensão dessas mortes, morro por dentro, torno-me Niilista da Paz: vidas perdidas em nome das armas, cruz no céu, a terra penetra na carne do Bem e do Mal. Tenho medo do azedo e do doce apóstolo, tenho ânsia de vômito à verdade absoluta dos seguidores. Prefiro caminhar sozinho, lá outros hão de andar ao meu lado. Eu e Tu, é para além de um deus, é a personificação do crer e não crer na imagem forjada pelos homens. Jogos filosóficos, resta-nos a dor da miséria alheia, a palavra do homem contra a indecisão na vida, são jogos de vida e morte. A linguagem − dia sim dia não −, salva o diálogo da escuridão, por ve

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Toda arte é uma forma de literatura, porque toda a arte é dizer qualquer coisa. Há duas formas de dizer - falar e estar calado. As artes que não são a literatura são as projeções de um silêncio expressivo. Há que procurar em toda a arte que não é a literatura a frase silenciosa que ela contém, ou o poema, ou o romance, ou o drama"   "A palavra é, numa só unidade, três coisas distintas - o sentido que tem, os sentidos que evoca, e o ritmo que envolve esse sentido e estes sentidos" "(...) porque não é a teoria que faz o artista, mas o ter nascido artista" "(...) ninguém pode esperar ser compreendido antes que os outros aprendam a língua em que fala" "A vida de Caeiro não pode narrar-se pois que não há nela de que narrar. Seus poemas são o que houve nele de vida (...)" "Desde criança tive a tendência para criar em meu torno um mundo fictício, de me cercar de amigos e conhecidos que nunca existiram. (Não sei,

Padrões autogênicos*

Há um provérbio, derivado de uma passagem bíblica, mas que hoje é um grande dito popular: “Diga-me com quem andas e te direi quem és”. Poderíamos abordar a origem e o significado dessa frase nos remetendo à fonte e ao sentido filológico. Entretanto, podemos nos valer dela para compreender um importante postulado da filosofia clínica. Vejamos! Por um lado, encontramos aqueles que baseados na frase acreditam que basta caminhar com determinadas companhias, que acabaremos nos igualamos ao grupo. Por outro lado, há quem pense que nosso modo de ser atrai tudo o que tem semelhança com o que somos. Aristóteles, filósofo grego, profundo observador, ao formular sua física afirmava que as coisas tendiam para aquilo que lhes era própria. Assim, por exemplo, não conhecendo a moderna “lei da gravidade” dizia que as pedras tendiam para o chão, por nele se encontrar o elemento que lhe era semelhante. Dizer que o Estagirita está errado, seria muita pretensão nossa. Pois, seja por uma “lei

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Lembrando John Jacob Abel: 'Nós os seres humanos, somos farmácias ambulantes'. E não o disse por causa do material que introduzimos em nós, senão por causa do material que fabricamos internamente" "Quatrocentos anos antes, Paracelso dissera: 'No ser humano está presente um médico invisível que produz, prescreve, avia e administra remédios apropriados, segundo o exige a ocasião. Se Deus não houvesse criado estes remédios internos, então, não obstante todos os esforços de todos os nossos médicos, não ficaria viva nem uma só criatura da terra" "A loucura não é um episódio isolado numa vida. É um modo de vida, que frequentemente vai desde o nascimento até a morte (...)" "Com Freud reconheceu-se que: "(...) não é a razão, mas a energia dinâmica do inconsciente o que habitualmente inicia os nossos atos. Porque no inconsciente está armazenado não só o nosso passado pessoal como também o passado biológico da raça, as exigênc

A pretexto de jardins***

                                     "Hoje amanheci escuro, sem palavras...   seduz-me este exílio! (estou me esperando)"                                      Djandre Rolim - Poeta Cigano Existe uma fonte extraordinária em que a obra de arte decaída se encontra. Nela é visível o apelo silencioso das raridades. Nalgumas pode se notar a exuberância dos contornos, em outras a raiz mergulha na terra em busca de proteção. Ainda àquelas a lançar sementes na brisa passageira. Quando muito próximo pode significar conviver com os espinhos uma da outra. Os sinais descrevem nuances de uma estória em que antes e agora se integram, fazendo a pétala renascer, se alternando nas estações. Sua essência plural realiza uma poesia sem palavras nesses espelhos da natureza. Existem jardins com uma história de descuidos, maltratados uma vida inteira. Ao vivenciar alguma forma de atenção, carinho, perseguem o subsolo de si mesmos. Nesse sentido, desacostumados à luz do sol, num mov

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Quaisquer que tenham sido seus dons genéticos, Pablo Picasso, Jane Austen e Nelson Mandela não nasceram completamente formados; tiveram de desenvolver, minuto a minuto, dia após dia, as marcantes personagens em que definitivamente se transformaram. E, assim, eles têm lições para todos nós" "(...) especialização não é extraordinariedade. Quase todos os indivíduos não se tornam extraordinários, seja porque não querem ou porque a sociedade em que vivem não dispõe de meios para produzir desempenhos superiores e inovadores. Tampouco os indivíduos desafiam práticas e normas: a instrução não é planejada desa maneira, e aos indivíduos falta a propensão para a rebeldia, para se tornarem realizadores de domínios" "(...) na época em que divulgou suas ideias mais originais, Freud já fora marginalizado por completo nos domínios que ocupava originalmente" "Virginia Woolf (...) Esta marca, ela suspeitava, estava em sua capacidade de captar e transm

O Lado do Rosto*

“O inelutável não tem a inumanidade do fatal, mas a seriedade severa da bondade.” Emannuel Levinas Dentro de mim mora um Eu, um desconhecido fragmento do Outro lado do Ser. Se isso não bastasse, dentro de mim a energia que existe é que move meu pensar, não a energia que faz com que eu tenha todo conhecimento, pois ela não existe dentro do mundo, ou melhor, fora de mim.  Um exemplo prático do cotidiano ilustra este exercício: dois dias atrás, em atividade, andei dizendo breves palavras ao público, o evento exigia esse ato de falar, meu discurso era simples, apresentar aos presentes o trabalho que realizei e que ajudei a acontecer, desfiz-me de toda carga do dia a dia e expus aos outros o trabalho de forma a apresentar o lado autoral aos seus leitores. Bem, a partir dali, fechei um ponto que estava dentro, lá guardado do Eu, melhor, do que imagino ser parte dele, mas que só se torna realizável no acontecimento. Mais tarde voltei ao meu Eu material, a redenção do c

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"O mundo é a minha representação (...) Possui então a inteira certeza de não conhecer nem um sol nem uma terra, mas apenas olhos que vêem este sol, mãos que tocam esta terra; em uma palavra, ele sabe que o mundo que o cerca existe apenas como representação, na sua relação com um ser que percebe, que é o próprio homem" "(...) o sujeito é o substratum do mundo, a condição invariável, sempre subentendida de todo fenômeno, de todo objeto, visto que tudo o que existe, existe apenas para o sujeito. Este sujeito, cada um o encontra em si, pelo menos enquanto conhece, não enquanto é objeto de conhecimento" "(...) esta realidade é, portanto, puramente relativa (...)" "O homem comum, esse produto industrial que a natureza fabrica à razão de vários milhares por dia, é, como dissemos, incapaz, pelo menos de uma maneira contínua, desta percepção completamente desinteressada, sob todos os pontos de vista, que constitui a contemplação, para falar co

Autogenia*

Nada melhor que a mudança de lugar para contribuição de um processo autogênico. Entenda-se “autogenia” como mudança de “Estrutura de Pensamento” e relação entre os tópicos desta. Quando mudamos de lugar, os hábitos têm a possibilidade de mudar. A visão de mundo tende modificar. “O que acha de si mesmo” começa a se reformular. Mas, este é o caso de alguém que está disposto a mudar e suas condições da Estrutura de Pensamento contribuem para tal acontecimento. A quebra de paradigmas é fruto do confronto com a realidade. Muitos agendamentos são feitos ao longo do desenvolvimento e resultam em “pré-juizos” que podem gerar uma série de incômodos ao serem confrontados com a realidade. Situações novas, pessoas com as quais não convivíamos, primeiras impressões que são reconhecidas como grandes erros de interpretação. Deparando-se com o mundo novo, a Estrutura de Pensamento não consegue ser mais a mesma. Novas aventuras iniciam nesse processo. Um novo mundo começa a ser vislumbr

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) A primeira verdade é que o mundo é como parece, e entretanto não é. Não é tão sólido e real como nossa percepção foi levada a crer, mas também não é uma miragem. O mundo é uma ilusão, como tem sido dito; ele é real por um lado, e irreal por outro. Preste muita atenção nisso, pois isso deve ser compreendido, e não simplesmente aceito. Nós percebemos. Isto é um fato concreto. Mas o que percebemos não é um fato concreto, porque aprendemos o que perceber"  "Um nagual deve ser flexível o suficiente para ser qualquer coisa - respondeu - Ser um nagual, entre outras coisas, significa ter nenhuma posição a defender" "(...) a percepção coerente mas irracional de que tudo que aprendemos a perceber está inexplicavelmente ligada à posição em que o ponto de aglutinação se encontra. Se ele é desalojado daquela posição, o mundo deixa de ser o que é para nós" "Existe uma regra muito simples. Diante do desconhecido, o homem é aventureiro. Dar-no

Em uma noite de outono*

                                            Em uma noite de outono, fresca, leve, silenciosa, e com o livro “O homem à procura de si mesmo” em mãos, balançando a rede enquanto lia, pensei em mandar um trecho ao meu irmão, paro de ler, busco o celular, algumas mensagens de whatsApp, numa delas a expressão de espanto de meu irmão dizendo: “que loucura gente, essa história da Sofia, a mãe deve estar arrasada.” Rapidamente acesso minha mãe, que diz: Gente, morreu  a Sofia. Ela se enforcou, não sabem por quê? E me remeto diretamente ao papel do terapeuta diante de tal mistério, o suicídio. Esse que vem, muitas vezes, sem aviso prévio, ou seja, de pessoas que sequer uma vez cogitamos tal desfecho diante da vida. Não era exatamente esse o caso. De qualquer forma, reflito sobre o seguinte: Será que a pessoa emitia gritos de socorro e desdenhamos suas expressões, sem ao menos ver, sem perceber seus sinais para tal possibilidade? Que papel as próprias drogas psiquiátricas cumprem acer

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Mas diante dessa natureza social, que é simplesmente a cultura, o homem estrutural não é diferente do grego antigo: ele também fica à escuta do natural da cultura, percebe nela, incessantemente, menos sentidos estáveis, finitos, 'verdadeiros', do que o frêmito de uma imensa máquina que é a humanidade procedendo incansavelmente numa criação do sentido, sem a qual ela deixaria de ser humana" "A variedade dos sentidos não depende pois de uma visão relativista dos costumes humanos; ela designa, não uma inclinação da sociedade para o erro, mas uma disposição da obra à abertura; a obra detém ao mesmo tempo vários sentidos, por estrutura, não por enfermidade dos que a leem. É nisso que ela é simbólica: o símbolo não é a imagem, é a própria pluralidade dos sentidos"  "Lembrando Umberto Eco: 'cada época pode acreditar, com efeito, que detém o sentido canônico da obra, mas basta alargar um pouco a história para transformar esse sentido singular

O instante aprendiz***

                                     “Todas as coisas são de tal natureza que, quanto mais abundante é a dose de loucura que encerram, tanto maior é o bem que proporcionam aos mortais”                  Erasmo de Rotterdam Ao esboçar apontamentos sobre uma lógica da loucura, um viés de absurdidade se desvela em estilhaços de múltiplas faces. Fronteira onde a normalidade se reconhece nos seus paradoxos. Uma das características da expressividade delirante é ensimesmar-se em desacordo com o mundo ao seu redor. Cria dialetos de difícil acesso para proteger versões de maior intimidade. O papel da Filosofia Clínica na interseção com a crise imediata também é apresentação indeterminada num processo caracterizado pelo exagero da manifestação Partilhante.  Um não saber veicula provisórias verdades no compartilhar desconstrutivo das sessões. Representações existenciais difusas se alternam em narrativas no tempo da pessoa. A linguagem da loucura se constitui em um conjunto de

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