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Inclusão!*


Podemos começar a falar de inclusão, tentando entender o conceito de integração. 

Integrar é agregar uma pessoa em uma estrutura já pronta, definida, com seus processos já acertados e rígidos. A pessoa integrada faz o esforço de se adaptar aos valores, hábitos, normas e estruturas apresentadas a ela. A ação do integrador, do cicerone, é mínima no sentido de dar atenção às necessidades da pessoa a ser integrada. Apresenta e deixa à vontade para o integrado se adaptar.

Incluir é adaptar as estruturas e processos às necessidades e capacidades da pessoa que chega. É fazer dos hábitos e valores uma forma de ressonância com aquilo que o outro pode e consegue dar dentro de suas capacidades. O currículo adaptado em algumas escolas é um exemplo de inclusão. O aluno tem que atingir não o que toda a turma precisa atingir, mas aquilo o qual sua capacidade suporta.

Tão importante quanto exercer a atividade de incluir é como se faz isso. Incluir passa pelo enfrentamento da alteridade e isso é tão difícil quanto mergulhar de guarda-chuva aberto. O outro, sejam pessoas, ideias, conceitos, teorias, gostos e desejos que não os seus, quase sempre é considerado uma ameaça, velada ou não em nosso pensamento mais consciente. Claude Lévi-Strauss, antropólogo e filósofo francês, dizia que essa necessidade de lidar com o outro, o alienígena, o diferente gerou algumas estratégias. Uma, a antropoêmica que consiste em vomitar, cuspir os estranhos. Impedir o contato físico, o diálogo, a interação social e relações desse viés. 

Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, diz que as variantes externas dessa estratégia são o encarceramento, a deportação e o assassinato. A outra estratégia é a antropofágica, que consiste em ingerir os alheios, devorá-los, de modo a fazer, pelo metabolismo, idênticos aos corpos que os ingeriram. Bauman diz que as variantes externas dessa estratégia são o canibalismo, a assimilação forçada como cruzadas culturais, cultos, guerras contra costumes locais e afins. 

Outra forma de encarar o estranho, o outro, o diferente é uma forma mínima de respeito disfarçada de tolerância e resumida pela frase “cada um no seu quadrado” ou “viva e deixe viver”. Tipo, eu tolero, eu aceito desde que cada um no seu canto, no seu bairro, no seu gueto e sem nenhuma interferência ou contato de ambos os lados da fronteira. Não o puno por ser diferente, não entro em contato e não quero fazer com que seja como eu, simplesmente tolero pela completa exclusão.

Tolerar o diferente não é inclusão. É apenas não excluir. Tolerar é um primeiro passo tímido para estancar a exclusão, mas ainda não é atividade de inclusão. Inclusão se dá pelo respeito às diferenças do outro e à percepção do outro como um dos nossos. Como diz Jürgen Habermas, filósofo alemão, a inclusão do outro significa que as fronteiras da comunidade estão abertas a todos, também justamente àqueles que são estranhos um ao outro e querem continuar sendo estranhos.

Esta questão é uma das centrais no problema do multiculturalismo e do pluralismo cultural. Qualquer preconceito de diferença onde um se ache mais especial, valoroso, merecedor, inteligente ou outro atributo a mais que o outro, abre-se espaço para se instalar a intolerância e todas suas formas de exclusão, pela violência física, moral, política.

A inclusão não pode virar moeda de troca, tipo eu te incluo se... Aceitar o outro como ele é somente de forma incondicional, sem barganha. Aceitar o outro não é concordar com todos seus valores e ideias, mas entender que valores e ideias que não as suas também são valores e ideias válidas.

É muito mais fácil excluir, tolerar, “deixar viver” do que incluir, aceitar e exercitar a empatia. Mas em uma vida em comunidade cada vez mais plural e mais desigual política, social e economicamente, quem não fizer sua parte na inclusão estará trabalhando silenciosamente para a exclusão e para o aumento das desigualdades.

*Fernando Fontoura
Filósofo, Estudante na Casa da Filosofia Clínica
Porto Alegre/RS

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