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Mostrando postagens de novembro, 2016

Aprender a sentir*

Um dia percebemos e aprendemos a captar essa linguagem que se forjou através da comoção de impulsos de pulsos de amor que pouco a pouco, passo a passo, persistiram demais e ainda persistem materializando fonemas que se somam até compor glórias de sensações que passam a fazer sentido pela descoberta. E esse fenômeno está sempre em construção, sempre inacabado e por alguma razão transcende qualquer razão. Essa linguagem nos toca nos conecta um a um, pouco a pouco na direção de singularidades fundamentais e infinitas. De algum modo, há um propósito ordinário por ser comum, mas também, extraordinário por depender de cada um de nós a partir do nosso próprio jeito de criar e de mudar as coisas ungidos pela vontade de saber e fazer. Podemos tanto mesmo quando permeados pelas sombras que tentam nos fazer esquecer, sobretudo, de nós mesmos. E ainda que incompreensões persistam quando limitadas apenas aos muros da razão, saberes como a historiografia dita oficial, a sociologia d

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Nas horas de grandes achados, uma imagem poética pode ser o germe de um mundo, o germe de um universo imaginado diante do devaneio de um poeta. A consciência de maravilhamento diante desse mundo criado pelo poeta abre-se com toda ingenuidade" "(...) O sonhador escuta já os sons da palavra escrita. Um autor, não lembro quem, dizia que o bico da pena era um órgão do cérebro" "Ainda existem almas para as quais o amor é o contato de duas poesias, a fusão de dois devaneios" "(...) como pode um homem, apesar da vida, tornar-se poeta ?" "O cientista continua. O alquimista recomeça. Assim, referências objetivas a purificações da matéria nada nos podem ensinar a respeito dos devaneios de pureza que dão ao alquimista a paciência de recomeçar" "(...) o devaneio, transportando o sonhador para outro mundo, faz do sonhador alguém diferente dele mesmo (...)" "Ver e mostrar estão fenomenologicamente em viole

Trem do tempo*

“Pois os pensamentos são uma coisa estranha. Muitas vezes não passam de acasos que desaparecem sem deixar rastros; os pensamentos têm épocas de viver e épocas de morrer.” Robert Musil – O jovem Törless Não tenho nada a dizer, o dito pelo dito é entediante, Melhor ler do que dizer, melhor sentir do que falar, Tenho muito a viver, o tempo chega ao fim. Tenho algo a fazer, construir um mundo de imagens, Tenho muito a colher, a vida foi longa, A colheita é breve, a dor só existe na seca. Choramos para nos alegrar, cantamos para acordar a noite. A palavra escrita é o alimento, a voz é o vaguear no tempo, O fim é o início de outras escritas, de vozes que não temem o fim. Os dias perdem forças no tempo chega ao fim. Deixo a negação para o momento do tempo que se perde, Tenho tudo a ler, livros perdem o tempo único. A leitura dos lábios é o signo que o rio perde no fim. Um dia escrevo tudo, outro dia falo muito, a angústia me resgata no fim da linha. A vida é

Reinvenção*

A vida só é possível reinventada. Anda o sol pelas campinas e passeia a mão dourada pelas águas, pelas folhas... Ah! tudo bolhas que vem de fundas piscinas de ilusionismo... — mais nada. Mas a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada. Vem a lua, vem, retira as algemas dos meus braços. Projeto-me por espaços cheios da tua Figura. Tudo mentira! Mentira da lua, na noite escura. Não te encontro, não te alcanço... Só — no tempo equilibrada, desprendo-me do balanço que além do tempo me leva. Só — na treva, fico: recebida e dada. Porque a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada. *Cecília Meireles

Fragmentos Filosóficos, Delirantes

"São sonhos, sobretudo, que unem artista e rua" "(...) as contradições que animam a cidade moderna ressoam na vida interior do homem da rua" "Não obstante, a verdade é que, como Marx o vê, tudo o que a sociedade burguesa constrói é construído para ser posto abaixo. 'Tudo que é sólido' - das roupas sobre nossos corpos aos teares e fábricas que as tecem aos homens e mulheres que operam as máquinas, às casas e aos bairros onde vivem os trabalhadores, às firmas e corporações que os exploram, às vilas e cidades, regiões inteiras e até mesmo as nações que as envolvem - tudo isso é feito para ser desfeito amanhã, despedaçado ou esfarrapado, pulverizado ou dissolvido, a fim de que possa ser reciclado ou substituído na semana, talvez para sempre, sob formas cada vez mais lucrativas" "Que espécie de pessoas produz essa revolução permanente ? Para que as pessoas sobrevivam na sociedade moderna, qualquer que seja a sua classe, suas person

Ainda estamos juntos*

Sonhei com meu pai. Estava com uma aparência saudável, avental de médico e muito animado. Chamou-me para ver o consultório que montara em seu novo plano existencial. Se quiserem, também podem chamar de céu. Era um consultório nos mesmos moldes que mantinha aqui na terra: papel de parede diferenciado, grande sala de espera, aquário com peixinhos, poltronas confortáveis, diplomas e quadros nas paredes. Disse-me que demorou quase um ano para se ajeitar por lá, mas que agora já estava em condições de atender seus clientes. Parecia feliz em mostrar sua adaptação. Despertei e não me preocupei em interpretar nada. Signifiquei apenas que a partida dele foi tranqüila, que estava bem por lá, que mantinha conexão comigo. Passei a manhã inteira animado e com uma sensação de leveza, missão cumprida e proteção espiritual. Bateu uma saudade forte também. Acontece que sendo filósofo, não pude me furtar de pensar que onde quer que meu pai esteja, seu consultório não terá poltronas, mes

A cidade das palavras esquecidas*

“É possível que desde Sófocles todos nós sejamos selvagens tatuados. Mas na Arte existe alguma outra coisa além da retidão das linhas e do polido das superfícies. A plástica do estilo não é tão ampla como toda a ideia (...) Temos coisas demais para as formas que possuímos”                               Flaubert Num cotidiano de atividade limite existe uma aproximação com a subjetividade do não dito. O não sentido concede vestígios ao artesão das palavras. Uma nova conjugação se anuncia na rasura do texto conhecido. Manuscritos assim costumam se expressar em linguagem própria. A expressividade desses fenômenos, um pouco antes de significar-se no traço da autoria, se insinua nalguma forme de transbordamento. Sua subjetividade acolhe essa intencionalidade para resignificar seus dias. Busca compartilhada da contradição com a estrutura do delírio.   Um leitor de incompletudes desvenda esses horizontes por vir. Sua atividade inclui rituais de tradução a essas páginas chega

Uma Didática da Invenção*

I Para apalpar as intimidades do mundo é preciso saber: a) Que o esplendor da manhã não se abre com faca b) 0 modo como as violetas preparam o dia para morrer c) Por que é que as borboletas de tarjas vermelhas têm devoção por túmulos d) Se o homem que toca de tarde sua existência num fagote, tem salvação e) Que um rio que flui entre 2 jacintos carrega mais ternura que um rio que flui entre 2 lagartos f) Como pegar na voz de um peixe g) Qual o lado da noite que umedece primeiro. Etc. etc. etc. Desaprender 8 horas por dia ensina os princípios. IV No Tratado das Grandezas do Ínfimo estava escrito: Poesia é quando a tarde está competente para Dálias. É quando Ao lado de um pardal o dia dorme antes. Quando o homem faz sua primeira lagartixa É quando um trevo assume a noite E um sapo engole as auroras IX Para entrar em estado de árvore é preciso partir de um torpor animal de lagarto às 3 horas da tarde, no mês de agosto

A vida e seus milagres*

A vida é um milagre que de repente acontece e aí já é; e continua. A vida é um milagre e por mais que ansiedades, pretensões, prepotências, egoísmos ou apegos possam intervir e superficialmente parecer dominar, na verdade, o poder do amor prossegue o seu caminho inabalável até tocar todos os corações mais dia menos dia. Por isso, a poesia persiste seja nas linhas seja nas entrelinhas, seja no suspiro sincero, na pulsação ou nos intervalos entre um pulso e outro. A poesia nunca morre nem esfria. Porventura, mentiras sempre cairão por terra, ilusões também, mas o amor, nossa o amor é foda e por ser ou estar infinitamente no agora, sempre continua enquanto máscaras se desfazem e corações se regeneram, sobretudo, quando se cansam de doerem, de amargarem, de se enganarem. E é quando o mistério da vida transborda e se torna resposta concreta é que percebemos o quanto a nossa alma se revela nas motivações provindas daquilo que vem de dentro para fora e que é provocado por inspira

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) sempre existem, entre as dualidades universais, entre as pluralidades, o mundo da razão e o que é alheio a este" "É que o meu mundo não é o mundo de vocês (...). De forma que eu não conheço o mundo de vocês e vocês não conhecem o meu" "O que é a vida senão uma recordação de bundas e bocetas em que a gente penetrou ?"  "Penso que em outros tempos eu vivia num mundo mais semelhante ao de vocês, refiro-me ao mundo da razão, mas as coisas se tornaram cada vez mais insustentáveis e comecei a deixar a casa daquele mundo e a retirar-me para esta" "Ora, pelo amor de Deus, Moise, sou eu que me traio para todo mundo, ninguém se trai para mim nem é traído por mim" "O mundo da razão deixou de ser sustentável para mim (...) usei todas as minhas tintas até esgotá-las" "Suponho que seja simplesmente e inevitavelmente humano atribuir todas as deserções da pessoa amada a alguma influência diversa daquil

Fenomenologia das imagens*

                       “As sílabas recolhidas pelos lábios — belo silencioso círculo — ajudam a estrela rastejante em seu centro.” Paul Celan Os sentiment os andam ao lado de nossa vontade. Nossos desejos não são alterações meteorológicas e sim psíquicas. São funções de nossas percepções e sonhos. Um cruzar de idéias que percorrem o tempo de nossa existência. Esse cruzar complexo, onde mora o único valor, o que pode nos manter vivos todas às manhãs quando acordamos.  É o acordar do “trajeto antropológico” sob as imagens que circulam nosso Ser esse tempo todo. Sonoridade na dor, na despedida e nas chegadas das imagens. O encontro do vivido com o que buscamos mais adiante do olhar. Meus sentimentos começaram antes do século XX findar. Bem antes, quando ainda sentia poder encontrar através das imagens todas as linguagens que fossem o expressar do cotidiano. O cotidiano lançou seus dados Mallarmaicos que impulsionaria as inspirações nos signos de hoje. Assim acordei pe

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Para os alunos, ele era um anarquista - vivaz, excêntrico, profano" "Sua mente era um fluxo só, a cabeça cheia de ideias discordantes, que se cristalizavam em belas sequências de prosa, que subiam do pântano às alturas do ascetismo" "Escrevia os contos que se tornariam Dubliners, luminosas imagens da cidade que professava odiar, mas que apesar disso estão impregnadas de ternura pelas criaturas perdidas 'excluídas do festim da vida'" "Durante toda a vida foi um leitor voraz. Lia livros, panfletos, manuais, guias de ruas, tudo e qualquer coisa para alimentar seus gostos ecléticos e sua sede de saber"  "Joyce recorreu em vão aos amigos literários. Thomas Kettle leu os contos e disse que eles fariam mal à Irlanda. A cada dia que passava, intensificavam-se os escrúpulos e objeções" "Dois anos depois, o editor original (...) decidiu publicar Dubliners. As críticas foram mornas, o material julgado medíoc

Verdade*

A porta da verdade estava aberta, mas só deixava passar meia pessoa de cada vez. Assim não era possível atingir toda a verdade, porque a meia pessoa que entrava só trazia o perfil de meia verdade. E sua segunda metade voltava igualmente com meio perfil. E os dois meios perfis não coincidiam. Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta. Chegaram a um lugar luminoso onde a verdade esplendia seus fogos. Era dividida em duas metades, diferentes uma da outra. Chegou-se a discutir qual a metade mais bela. As duas eram totalmente belas. Mas carecia optar. Cada um optou conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia. *Carlos Drummond de Andrade

Poéticas assimétricas*

São sem métricas Minhas poéticas Assim analfabéticas Tristes ou alegres Sem ordem alfabéticas Construções hipotéticas Assim peripatéticas Alegres ou tristes Criações céticas De uma fé herética Em busca de alguma estética.... Eu não sei...!!!! *José Mayer Filósofo. Livreiro. Poeta. Estudante na Casa da Filosofia Clínica Porto Alegre/RS

Demasiada loucura é o mais divino juízo*

Demasiada Loucura é o mais divino Juízo - Para um Olhar criterioso - Demasiado Juízo - a mais severa Loucura - É a Maioria que Nisto, como em Tudo, prevalece - Consente - e és são - Objecta - és perigoso de imediato - E acorrentado - *Emily Dickinson

A palavra vertigem*

      "O idioma está sempre em movimento, mas o homem, por ocupar o centro do redemoinho, poucas vezes percebe essa mudança incessante."                                Octávio Paz Um ser irreconhecível se desdobra na expressividade fugaz. Seu aspecto de invasor ameaça o saber encastelado, seu ritmo alucinado de vivências subjetivas re_apresenta um devir quase esquecido. Ao pensar o impensável realiza uma excursão pela partícula de infinito desconsiderada. Sua ótica de incerteza desconstrói o mundo de uma só verdade.     Os sons murmurados nas entrelinhas apresentam o instante entre um e outro. Sua lógica de estorvo, o caráter de percepção excessiva denuncia espaços, amplia escutas, vislumbra imaterialidades. As associações desgovernadas esboçam um contato com o absurdo. Parece recordar que a vida não tem ponto final.  Sua estranha dialética é ser registro de uma ausência. Como um acesso de desrazão, seu teor de expressividade não cabe numa definição. Nas po

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Eu não tenho nenhuma espécie de superstição pelos nossos títulos escolares ou universitários; eles dão algumas vezes algum saber profissional, muito restrito e ronceiro, e nunca uma verdadeira cultura" "Os leitores hão de dizer que não era possível encontrar isso numa casa de loucos. É um engano; há muitas formas de loucura e algumas permitem aos doentes momentos de verdadeira e completa lucidez" "Digo com franqueza, cem anos que viva eu, nunca poderão apagar-me da minha memória essas humilhações que sofri" "Esta passagem várias vezes no hospício e outros hospitais deu-me não sei que dolorosa angústia de viver que eu me parece ser sem remédio a minha dor" "Caído aqui (hospício), todos os médicos temem pôr logo o doente na rua. A sua ciência é muito curta, muito prevê; mas seguro morreu de velho e é melhor empregar o processo da Idade Média: a reclusão"   "Amaciado um pouco, tirando dele a brutalidade do ac

Ela tem olhos verdes*

Estou lendo um livro de 84 32 anos, exatamente minha idade Não busco nele ciências Quero a versão de uma mulher Encontro o avesso de várias Variadas versões dela Poderiam ser as nossas Mas uma predomina ser Menina, eu vi! ela é fogueira Tanto esquenta quanto aquece Você acha que a conhece? Ardente e mansa, Se metade dela eu fosse... Não mudaria, nem se quisesse Tem alma leve quando enlouquece Desnuda-se e atravessa oceanos Navega em mares que não conhece Ama o mistério dos olhos Sai do mar, põe os pés na areia Fala por nós, dores e amores... Séculos de dominação E ainda assim estamos soltas Se não em nossas almas, Na alma das outras! A natureza nos chama... *Dionéia Gaiardo Filósofa Clínica Porto Alegre/RS

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"O pleno cumprimento da compreensão da história é, como a compreensão de um texto, 'atualidade espiritual'" "(...) um autor não necessita ter reconhecido por si mesmo todo o verdadeiro sentido de seu texto, e que, por consequência, o intérprete pode e deve entender, com frequência, mais do que aquele. Entretanto, isso tem um significado realmente fundamental. O sentido de um texto supera seu autor não ocasionalmente, mas sempre. Por isso a compreensão não é nunca um comportamento somente reprodutivo, mas é, por sua vez, sempre produtivo" "(...) a compreensão começa aí onde algo nos interpela. Essa é a condição hermenêutica suprema. Sabemos agora o que ela exige com isso: a de suspender por completo os próprios preconceitos" "Horizonte é o âmbito de visão que abarca e encerra tudo o que é visível a partir de um determinado ponto. (...) ter horizontes significa não estar limitado ao que há de mais próximo, mas poder ver para alé

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