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Mostrando postagens de outubro, 2014

A palavra Kafka*

Um pretexto de múltiplas faces se apresenta no dialeto Kafka. Seu dizer multifacetado insinua labirintos, deslizes narrativos, frestas à uma admissão do improvável. Num anteparo de aspecto suspenso no ar, estórias mal contadas adicionam possibilidades ao termo definitivo.  Nesse imenso labirinto, uma lógica da descontinuidade aprecia levar todas as coisas ao limite de suas possibilidades. Ameaçam o território já conquistado, contradizem as verdades consentidas. Ela pode surgir em vielas inesperadas ou nos deslocamentos pelo cotidiano esconderijo. Parece querer dizer sobre a essência da liberdade ser incompletude, distorção, invenção, caminhos abertos.    Seu convite para acessar esse mundo de escassas fronteiras permanece. Nele o espectador de uma terra estranha se reconhece. Os roteiros imprevisíveis embalam ideias complexas. A irrealidade pode surgir como ameaça e seus cenários, ao se alternar, visualizam Kafka como um dos nomes da transubstância. São as releituras da lei

Esta noite vai chover...*

Perdão estimados professores de Português. Vou falar alguma besteira.  Nunca me convenci inteiramente das regras gramaticais. E principalmente da classificação dos verbos.  Vejam: diziam-me que existiam os verbos:  Regulares, os normais. Irregulares. Pensava comigo se estes seriam os não normais. Apareciam ainda os defectivos. Me soava aos ouvidos como defeituosos. Ainda os impessoais. Não queriam pronomes pessoais ou sujeitos por perto. E aí? Vejam ainda: Verbos que expressam fenômenos da natureza: Chove. Hoje a noite vai chover. Chove. Quem vai chover? Isto vai chover. E chove. Ah, mas uma nuvem não poderia dizer: eu chovo. E dizer para a vizinha: tu choves. E falar para uma terceira: ela chove. E todas juntas falarem: nós chovemos, vós choveis, elas chovem. Vou classificar minhas palavras e meus verbos em todos os tempos possíveis. Em todos os modos imaginados. Com todos os pronomes e sujeitos que os façam construir algum significado diferente...

Recomeços*

Desbravo caminhos que em minha alma acordam com os primeiros raios do sol. No caminho da vida peregrino sem cessar. Contemplo as tardes com saudades das manhãs. O fruto doce das alegrias se mistura ao verde das esperanças. Em cada canto um novo canto que na melodia da alma se faz sinfonia no silêncio dos meus tantos cantos. Alma peregrina que encontra nos portos seguros os mais belos horizontes. Assim é a vida... Um eterno amanhecer que nas tardes de outono sonham com as primaveras que hão de vir. No passado de pretéritos os amores sempre novos com saudades do passado. Sempre caminhar, se perdendo nos encontros e encontrando-se nas perdas. Viver assim como o caboclo que no chão lavra a terra de certezas da chuva sempre incerta. Olhar sem desanimar, e caminhar rumo ao meu avesso que tece esperanças com as estrelas que anunciam o presente das estações. Trilhar... a vida sem medo e mesmo com medo arriscar... Perder-se... Encontrar-se... E perder-se novamente... O que de m

O bem é sempre profundo e radical*

“toda a verdade é encurvada e o próprio tempo é um círculo?” Nietzsche   Em tempos de fraturas na história, na cultura e em tudo que surge, entre o olhar que faz e a mão que destrói, prefiro viver à margem das ideias construtoras de um mundo melhor.  Se o mundo começasse pelo desejo de ser um mundo melhor, se o mundo fosse a projeção daquilo que dos sonhos resultasse em algo, certamente não estaria aqui para pensar sobre o mundo. A perfeição existiria, nada de novo e assustador nos aconteceria, acontecimento seria o retorno do Todo, do Mesmo.  Então, prefiro mesmo que tenha que ter de errar, de pensar em tudo que não seja uniformizado, só assim eu posso me contradizer e refazer meu pensamento logo ali adiante. Isso não é um pecado. Mas os princípios universais, os existentes, não me encorajam a errar até à morte.  Prefiro viver com o bem ao meu lado, com as vicissitudes do engano mas prefiro, também, ver que meu pensamento está na direção do que sonhei e sonho tod

Mergulho ao vento*

Agora o silencio Voz engolida Na noite interna Beijos intensos Gozo da alma No olhar intenso Vou sem ir Fico sem ficar Desfaço nós Quebro o invisível Para que? Para quem? Recortes de muitos eus Vastidão indizível Rasgo o tempo Voo ao mar Mergulho ao vento Tomada pelos deuses Devoro Silencio sem medo Beijo os beijos De tanto amar *Rosângela Rossi Psicoterapeuta, Filósofa Clínica, Escritora, Poetisa Juiz de Fora/MG

Inclusão!*

Podemos começar a falar de inclusão, tentando entender o conceito de integração.  Integrar é agregar uma pessoa em uma estrutura já pronta, definida, com seus processos já acertados e rígidos. A pessoa integrada faz o esforço de se adaptar aos valores, hábitos, normas e estruturas apresentadas a ela.  A ação do integrador, do cicerone, é mínima no sentido de dar atenção às necessidades da pessoa a ser integrada. Apresenta e deixa à vontade para o integrado se adaptar. Incluir é adaptar as estruturas e processos às necessidades e capacidades da pessoa que chega. É fazer dos hábitos e valores uma forma de ressonância com aquilo que o outro pode e consegue dar dentro de suas capacidades. O currículo adaptado em algumas escolas é um exemplo de inclusão. O aluno tem que atingir não o que toda a turma precisa atingir, mas aquilo o qual sua capacidade suporta. Tão importante quanto exercer a atividade de incluir é como se faz isso. Incluir passa pelo enfrentamento da alterida

Viagem*

"É mais fácil pousar o ouvido nas nuvens e sentir passar as estrelas do que prendê-lo à terra e alcançar o rumor dos teus passos. É mais fácil, também, debruçar os olhos no oceano e assistir, lá no fundo, ao nascimento mudo das formas que desejar que apareças, criando com teu simples gesto o sinal de uma eterna esperança. Não me interessam mais nem as estrelas, nem as formas do mar, nem tu. Desenrolei de dentro do tempo a minha canção: não tenho inveja às cigarras: também vou morrer de cantar." *Cecília Meireles

A palavra reminiscência*

    Em uma recordação se pode reescrever fatos, reviver memórias esquecidas, alterar evidências, efetivar desconstruções, reconstruções, reinventar a própria estória. Sua matéria-prima, ao mesclar-se com a ótica atual, é capaz de apontar novas interseções, propor inéditos achados. Inicialmente por fragmentos sem conexão aparente, esses relatos apreciam multiplicar-se, emancipar periferias, descrever vontades marginais.  Ao rememorar eventos, esses já são outros eventos. As novas ideias, representações, vivências, ainda na perspectiva subjetiva, podem promover modificações de grande alcance no cotidiano de cada um. Esse movimento permite a contemplação das próprias ideias em deslocamento na malha intelectiva, alternância de endereços existenciais.    É comum as antigas referências de lugar, tempo e demais circunstâncias, expressarem, ao olhar atualizado, um território de verdades estranhas, as quais, ao transbordar num aqui_agora, já são outras. Assim, as relembranças, em sua

O Homem que Contempla*

Vejo que as tempestades vêm aí pelas árvores que, à medida que os dias se tomam mornos, batem nas minhas janelas assustadas e ouço as distâncias dizerem coisas que não sei suportar sem um amigo, que não posso amar sem uma irmã. E a tempestade rodopia, e transforma tudo, atravessa a floresta e o tempo e tudo parece sem idade: a paisagem, como um verso do saltério, é pujança, ardor, eternidade. Que pequeno é aquilo contra que lutamos, como é imenso, o que contra nós luta; se nos deixássemos, como fazem as coisas, assaltar assim pela grande tempestade, — chegaríamos longe e seríamos anônimos. Triunfamos sobre o que é Pequeno e o próprio êxito torna-nos pequenos. Nem o Eterno nem o Extraordinário serão derrotados por nós. Este é o anjo que aparecia aos lutadores do Antigo Testamento: quando os nervos dos seus adversários na luta ficavam tensos e como metal, sentia-os ele debaixo dos seus dedos como cordas tocando profundas melodi

A(pro)fundando Narciso*

Inclino-me uma vez mais sobre Narciso.  Para tentar entendê-lo. Ou salvá-lo... Narciso puniu-se a si mesmo por ter se olhado no reflexo das águas.  Não parece ser tão simples assim. Parece que Narciso perdeu-se a si mesmo por não ter conseguido mais sair deste movimento fixo. Movimento que saía de si mesmo e retornava sobre si, sem nada lhe acrescentar. Preferiu sua própria imagem, oca e vazia, a si mesmo. Tentou buscar-se onde ele se via, isto é, onde ele não era. Nada mais desviaria seu olhar sobre si mesmo. Acontecia assim: Narciso sorria e a imagem lhe sorria. Chorava e a imagem vertia-lhe uma lágrima. Aproximava-se ou se afastava do espelho das águas e a imagem lhe retribuía com o mesmo movimento de aproximação ou de afastamento. Ensaiava um abraço e sua imagem retribuía-lhe de braços abertos. Porém, Narciso não se sentia abraçado... Narciso tornou-se refém da armadilha de um olhar que nada mais lhe acrescentava. Imagem sem substância, que se

O Poeta é Belo*

O poeta é belo como o Taj-Mahal feito de renda e mármore e serenidade O poeta é belo como o imprevisto perfil de uma árvore ao primeiro relâmpago da tempestade O poeta é belo porque os seus farrapos são do tecido da eternidade *Mario Quintana 

Cogitação Filosófica*

                Umas vezes sinto sono, mas quase nunca sonho. Outras vezes realidade, mas quase sempre engano. Umas vezes aspiro ao mito, outras vezes entendo o fato. Umas vezes rosa, outras machado.                                                                          Rogério de Almeida Nem pense em encontrar, no aqui exposto, a precisão cirúrgica dos deuses doentes da modernidade, que passavam os seus extensos dias ceifando sentidos, separando as línguas clássicas das bárbaras e situando as boas e más palavras. Primeiro, que qualquer tipo de conceito que possa traduzir o desconforto, não serve ao nosso propósito. Não é fácil encontrarmo-nos em um amontoado de conceitos que não se compreende e constatar que, sobre os mesmos, muito pouco se sabe. Inúmeras vezes, nossa desgraça se torna nossa redenção. Não sabemos exatamente, nem como nem por que. A inquietação que mobiliza, também conduz à construção filosófica e a expressão dos martírios que nos consomem, nes

São os rios*

Somos o tempo. Somos a famosa parábola de Heráclito o Obscuro. Somos a água, não o diamante duro, a que se perde, não a que repousa. Somos o rio e somos aquele grego que se olha no rio. Seu semblante muda na água do espelho mutante, no cristal que muda como o fogo. Somos o vão rio prefixado, rumo a seu mar. Pela sombra cercado. Tudo nos disse adeus, tudo nos deixa. A memória não cunha sua moeda. E no entanto há algo que se queda e no entanto há algo que se queixa. *Jorge Luis Borges

Noites, sonhos, fronteiras*

A noite embesta-se no emaranhado de meus cabelos sem vinho sem ninho corre esconde-se em meio as luas cheias e estrelas cadentes assombra as meninas assanha os meninos a noite desvia-se na contra mão e me instiga a deixar os olhos abertos esperar os vampiros passarem até o nascer do sol para me lambuzar de sonhos e me fartar de amores a noite... é noite obediente rebelo-me pois nada mais é além da fronteira do meu eu e teu tu. *Rosangela Rossi Psicoterapeuta, Escritora, Poeta, Filósofa Clínica Juiz de Fora/MG

Momentos possíveis do imaginário*

“O esquecimento do esquecimento não dá oportunidade apenas às encenações realistas, ele é essencial a qualquer metafísica: ao esforçar-se por apresentar a própria coisa, fundamento último, Deus, ser, a metafísica esquece-se de que a presença é ausente. Ter tudo presente é a bulimia do pensamento ocidental.” Jean-François Lyotard (Moralidades pós-modernas, p. 155-156, Papirus, 1996.) A escritura é o fortalecimento e também poder ser o que se esquece durante o passar do tempo.  O tempo aqui como conceito diante do que é visto, do que tem diante dos olhos. Tanto faz olharmos por através da vidraça ou mesmo diante de um real supostamente dito, dentro do mesmo espaço, porque o imaginário criado nisso tudo é como o fogo que une o todo. O que estava separado, o que estava distante acaba se unindo nas chamas.  A escritura tem um pouco disso, mas se diferencia por sua unidade de ser, por sua fonte longe do imortalizado, é como Lyotard falou de Beckett que fez a “assinatura

A palavra indefinida*

Existe uma infinidade de expressividades alojadas nalgum ponto entre a percepção de uma quase ideia e sua adequada manifestação. Esse discurso persegue a ordem  de um caos. Nele os subterfúgios se destacam das evidências objetivadas pela definição. Sua tez de promessa extraordinária permanece em aberto.  É possível ser o convívio com as lógicas da desrazão, a fonte de onde jorra a matéria-prima em busca de descrever-se. Numa atitude de estado nascente, sua inexatidão aproxima a inteligibilidade do absurdo discursivo. Sua noção descortina-se nas páginas da originalidade por vir.   Um relato assim, longe de instituir fechamentos, refere uma atitude de não-propriedade em relação ao conhecimento. Seu discurso inacabado aguarda preenchimentos. As clausuras recém desconstruídas, acolhem as dúvidas, abrigam especulações irrefletidas. Num traço assim descrito, a ressonância dos deslocamentos pessoais permanece em aberto, parecem querer dizer sobre a presença de uma ausência.  Ne

Poética*

Estou farto do lirismo comedido Do lirismo bem comportado Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente protocolo e manifestações de apreço ao sr. diretor. Estou farto do lirismo que para e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo. Abaixo os puristas Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis Estou farto do lirismo namorador Político Raquítico Sifilítico De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo De resto não é lirismo Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc Quero antes o lirismo dos loucos O lirismo dos bêbedos O lirismo difícil e pungente dos bêbedos O lirismo dos clowns de Shakespeare — Não quero mais saber do lirismo que não é libertação. *Manuel Bandeira

Por falar de amor*

Se o amor me leva  a adentrar a casa, por um lado a dor me leva a buscar a chave para sair.                   Jesus Aguiar                   Vânia Dantas O amor é algo que talvez não possa ser definido, mas que tentamos sentir ou demonstrar por meio de linguagens e gestos. São abraços, palavras, sonhos, flores e presentes que veem em nome dele e que são direcionados para a pessoa em que encontramos o destino, a fim de entregar esse tesouro tão nobre que existe dentro de nós. Amor que anestesia o tempo, rompe com a cronologia, instaura um tempo eterno onde parece só existir o início, pois ele não termina jamais. Emoções congeladas num sorriso; é o vencedor que serve. O pensamento e a alma se unem e neste espaço sagrado criado e só a pessoa amada nele permanece. O amor exige uma exclusividade, talvez a nominemos de fidelidade. Queremos um vínculo, uma entrega total entre o amado e a amada. As estrelas são assim

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