A Filosofia Clínica oportuniza um fluxo existencial mais harmônico a partir da singularidade acolhida, escutada, viabilizada e preservada. Aí se inserem aportes da filosofia que facilitam a colheita da historicidade, detectando como essa subjetividade se posiciona no mundo, como ela é e como ela age. Alicerce do planejamento clínico, que promove ajustes e sustentações rumo a um caminhar mais expressivo e menos tensionado, considerando-se a pluralidade do meio.
É no âmbito da reciprocidade da
relação que se fala em eu, é no encontro que as questões se colocam. Aí a
responsabilidade do contato existencial. Enquanto entidade que partilha a
existência de outro ser, a identidade do terapeuta reside em sua posição de observador
dentro da situação vivenciada.
A plasticidade se mantém por
escuta máxima e agendamento mínimo, a fim de melhor captar dados sutis de
semiose e processos de significação que abundam ao longo da narrativa. Manuais
e protocolos estão para favorecer e não soterrar o movimento vivo da clínica.
A cadência rítmica de assombros
humanos se expressa em patamares autogênicos dinâmicos que guardam trajetos
existenciais percorridos coletivamente, onde sociedades interagem com padrões
de época. É a visão relativa do método que promove o constante desvelar,
revelar, esclarecer.
O Partilhante se apresenta com o
que o traz a terapia, o Assunto Imediato, que poderá ou não coincidir com o
Último, que ocupa a Clínica. Nesse momento se dá o laço primeiro da interseção
sustentada por alteridade estabelecida, acolhimento compreensivo e
singularidade resguardada. Assim, a música toca e o Nós emerge em forma de
dança, construção compartilhada onde Filósofo Clínico dá passagem e sustenta a
expressão do Partilhante. Assumem posições assertivas na nascente coreografia:
Lugar (como a pessoa sente e pensa o ambiente), Tempo (como dialogam os tempos
convencionado
e subjetivo), Relação (qualidade
estabelecida em interseção com algo ou alguém) e Circunstância (somatório de
singularidades da situação, levantamento das variáveis). Junto do Assunto,
esses elementos compõem as categorias que localizam existencialmente a pessoa,
minimizando equívocos e possibilitando leituras mais aproximadas.A narrativa
respeita semioses preferenciais e as categorias podem inibir ou favorecer uma
em detrimento de outra. Não há pretensão de um saber imutável. Pretendê-lo
seria negar a imprevisibilidade e a incerteza próprias do existir, além de
usurpar o direito de composição continuada, revisando tons e equalizando
ritmos. Inviabilizar essas ponderações faria emergir o conceito de clínica
serial, robotizada e pasteurizada. A prática a tem mostrado única, humana e
visceral.
A aproximação ao mundo do outro
se dá por meio do saber que é a constatação do não saber. Sustentado no relato
da historicidade, assistido por intervenções pontuais e precisas, um exame
categorial robusto nos liga a esfera do conhecer e facilita o objetivo da
Clínica: alcançar diacronicamente um fluxo existencial mais harmônico no mundo,
espaço e tempo do outro.
*Ana Rita de Calazans Perine
Filósofa. Escritora. Filósofa
Clínica.
Canela/RS
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