Esta é uma breve introdução à Filosofia Clínica. Por meio dela, pretendo elucidar algumas dúvidas iniciais dos interessados em compreender esse método e, caso queiram conhecer mais, com as informações apresentadas, saberão como e o que buscar em outros textos e livros. A Filosofia Clínica, ao longo dos seus trinta anos, possui uma base sólida. Por isso, há muitos conceitos que requerem aprofundamento, pois apesar de ser “simples” na apresentação dos conteúdos constituintes do método, ela é complexa em sua aplicação, pelo fato de lidar com pessoas. Além disso, a prática muitas das vezes fundamentará a sua teoria.
A
Filosofia Clínica visa auxiliar a quem procura terapia a alcançar seu bem-estar
subjetivo, trabalhando suas questões existenciais conforme cada singularidade.
É importante dizer que sem a noção de singularidade ela seria apenas mais um
método terapêutico. Cada pessoa é única, possuindo a sua experiência de vida,
sua cultura, seu modo de ver o mundo, seu jeito de sentir e perceber a vida.
Uma pessoa não pode ser comparada a outra, nem a qualquer padrão externo e
convencionado pela sociedade; pois é única. Por isso, a clínica filosófica não
usa em seu método as tipologias ou os conceitos universais para compreender uma
pessoa; é ela mesma quem dirá de si para o terapeuta.
Para compreender melhor essa metodologia terapêutica, é necessário abordar as suas três bases fundamentais: os exames categoriais, a estrutura de pensamento e os submodos. Os exames categoriais é um recurso utilizado pelo filósofo clínico para entender onde se encontra a pessoa existencialmente. Essa é a primeira etapa do método e visa saber quem é o partilhante, onde habita, o que faz e quais são as suas relações. Segundo Lúcio Packter (apud Gaiardo, p. 2024, p. 8), os exames categoriais são “uma representação para si mesmo da representação do outro”. Os exames categoriais iniciam quando a pessoa conta para o filósofo clínico o assunto imediato. Essa pessoa agora passa a ser vista como um partilhante, pois partilha suas experiências e questões existenciais na clínica. O terapeuta, ao escutá-lo, usa o recurso mencionado para identificar as cinco categorias: assunto imediato e último, circunstância, lugar, tempo e relação.
As categorias nos ajudam a identificar as características potencialmente presentes do mundo, do contexto vivido, do sujeito. Todas as pessoas em algum momento da existência podem vivenciar as relações, recordar do passado ou se projetar para o futuro, ter uma situação marcante que pode lhe trazer uma boa lembrança ou outra experiência que deixará uma “marca” desagradável (um agendamento em sua memória). A terapia pode começar com o assunto imediato, o qual levou o partilhante a procurar o filósofo clínico para cuidar das suas questões existenciais, e ao longo das sessões, o cuidador busca identificar o assunto último, o que precisa ser trabalhado no consultório. Segundo Packter: “Os exames categoriais findam quando o filósofo clínico sabe localizar e contextualizar, com grande margem de aproximação, informações soltas ou agrupadas que a pessoa fornece” (Packter, 2001, p. 45). Se os exames categoriais são feitos com maestria, torna-se viável pesquisar e entender a estrutura de pensamento do partilhante. A estrutura de pensamento é o modo como a pessoa se encontra existencialmente. Para Fernando Fontoura (2024, p. 10), é nela que “tudo passa, começa ou termina”. Sendo assim, a estrutura de pensamento é um movimento entre ideias. É nela que estão os conceitos, as experiências, os tópicos do partilhante. Entretanto, o que são os tópicos? São elementos que compõem a malha intelectiva de uma pessoa. São divididos em 30 e mostram onde se encontram e como se organizam os conteúdos constituintes de um indivíduo. É como um mapa intelectivo onde o filósofo clínico irá exercer seu papel existencial de cuidador.
A terceira base da Filosofia Clínica são os submodos. Estes são estruturas metodológicas que viabilizam os movimentos internos e externos do sujeito. Em outras palavras, são meios utilizados pela pessoa para viabilizar o que está em sua estrutura de pensamento e interagir com o seu mundo. São divididos em 32 submodos e podem ser tanto ações no mundo físico quanto nas ações internas e conceituais da pessoa. Existem os submodos informais que são aqueles que um indivíduo possui e utiliza no seu dia a dia. Há também os submodos formais, utilizados pelo filósofo clínico em sua função terapêutica, seja a partir dos que já identifica no partilhante, seja novos ensinados ou “acrescentados”. Ambos aplicados como procedimentos clínicos para trabalhar as questões identificadas na estrutura de pensamento do partilhante como assunto último em uma via de construção compartilhada. Trata-se de remédios existenciais usados na terapia. Desta forma, o partilhante poderá encontrar caminhos ou entender melhor as suas questões existenciais.
A
filosofia clínica é inovadora e se diferencia das outras terapias que, por suas
teorias tipológicas, explicam o ser humano e o ajusta aos critérios normativos.
A clínica filosófica não define homem, mundo e sociedade. Sua principal
contribuição é a compreensão da pessoa segundo sua singularidade.
*Robson de Oliveira Santos
Filosofo. Filosofo Clínico.
Escritor.
Petrópolis/RJ
**Texto originalmente publicado na edição de inverno/2024. Revista da Casa da Filosofia Clínica.
Bibliografia:
GAIARDO, Dionéia. Sobre exames
categoriais. Revista Casa da Filosofia Clínica, Porto Alegre, 8ª edição, pp
08-09, outubro, 2024. Disponível:
https://casadafilosofiaclinica.blogspot.com/2024/03/revista-da-casa-da-filosofia-clinica-outono-2024-dicionario.html
. Acesso em: 17 de abril de 2024.
FONTOURA, Fernando. Estrutura de
pensamento (EP). Revista Casa da Filosofia Clínica, Porto Alegre, 8ª edição,
pp. 10-11, outubro, 2024. Disponível:
https://casadafilosofiaclinica.blogspot.com/2024/03/revista-da-casa-da-filosofia-clinica-outono-2024-dicionario.html
. Acesso em: 20 de abril de 2024.
PACKTER, Lúcio. FILOSOFIA
CLÍNICA: Propedêutica. 3ª Edição, Florianópolis: Editora Garapuvu, 2001.
CARUZO, Miguel Angelo. Introdução
à filosofia clínica. 1ª Edição, Petrópolis: Editora Vozes, 2021.
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