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O que nos leva ao consultório?*

A primeira questão fundamental é: o que é para cada pessoa o "consultório"? Bem como: o que é para cada pessoa o "terapeuta" e a "ajuda"? Tem-se como noção geral que quem procura a terapia procura a ajuda. Isso se mostra em Filosofia Clínica uma falácia, mais um dos pré-juízos generalizados, termos universais da nossa época. Em grande monta, sim, podemos dizer que a grande maioria das pessoas procura o terapeuta buscando ajuda, porém, não podemos tomar isso como universal, como se soubéssemos que aquele que adentra ao nosso consultório buscasse obrigatoriamente ajuda, esquecendo-se da velha máxima filosófica "só sei que nada sei", esquecendo-se que nada sabemos sobre aquela pessoa, nem mesmo se ela procura ajuda. Há pessoas que vêm até o consultório, por exemplo, não para pedir ajuda, mas apenas para ter alguém com quem conversar, procurando um espaço de diálogo, um espaço de relação, não no sentido de um socorro, mas no sentido de poder

Poema*

Se morro universo se apaga, como se apagam as coisas deste quarto, se apago a lâmpada:  os sapatos - da - ásia, as camisas  e guerras na cadeira, o paletó -  dos - andes,  bilhões de quatrilhões de seres  e de sóis morrem comigo.  Ou não: o sol voltará a marcar  este mesmo ponto do assoalho  onde esteve meu pé;  deste quarto  ouvirás o barulho dos ônibus na rua;  uma nova cidade  surgirá de dentro desta  como a árvore da árvore.  Só que ninguém poderá ler no esgarçar destas nuvens  a mesma história que eu leio, comovido. *Ferreira Gullar

Varal de Poesias*

De uma forma ou de outra Somos todos escritores De sonhos, de utopias, de palavras Costuramos poesias. Melodias Escrevendo nossas vidas. Falamos ao ritmo de poemas Escrevemos em forma de poesias Cantamos ao ritmos de versos Dançamos ao som de músicas Vivemos poeticamente nossa vidas. Eu amo, amando Amo escrevendo o que amo Amo falando o que amo. Conto baixinho... Fiz minhas melhores viagens Sem sair do lugar.... Fiz -me nuvem de chuva Para despertá-la do sono É que ela andava adormecida Até pedi-lhe de vez em vez: "Volta a escrever Pequena e serena" Por ti... E também por mim.... Devo esperar Ainda não é o tempo dela. Enquanto isto Pendurarei minhas poesia Tristes e incompletas Num varal sobre a estrada Que cruza rumos no horizonte Para balançarem ao vento.... *José Mayer Filósofo. Livreiro. Poeta. Formação na Casa da Filosofia Clínica Porto Alegre/RS

Procura-se um amigo*

Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.. Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar. Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena das pessoa tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não pud

A plenitude do agora*

Pode não haver sol, porém, sempre há beleza. A natureza, em sua sabedoria, contrabalança luz e sombra. Pode não haver sorrisos, porém, sempre há silêncios. A natureza, em sua dialética, promove a pausa harmónica. Pode não haver antes e depois, porém, sempre há agora. A natureza, em sua plenitude, nos presenteia com o existir. Isto nos basta! *Rosângela Rossi Psicoterapeuta Analítica. Filósofa Clínica. Escritora. Juiz de Fora/MG

Poética*

Estou farto do lirismo comedido. Do lirismo bem comportado. Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente, protocolo e manifestações de apreço ao Sr. Diretor. Estou farto do lirismo que para e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo. Abaixo os puristas. Todas as palavras, sobretudo os barbarismos universais. Todas as construções sobre tudo as sintaxes de exceção. Todos os ritmos, sobretudo os inumeráveis.  Estou farto do lirismo namorador. Político, Raquítico, Sifilítico. De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo. De resto não é lirismo. Será contabilidade tabela de co-senos, secretário  do amante exemplar, com cem modelos de cartas  e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.  Quero antes o lirismo dos loucos. O lirismo dos bêbados. O lirismo difícil e pungente dos bêbedos. O lirismo dos clowns de Shakespeare - Não quero mais saber do lirismo que não é libertação. *Manuel Bandeira