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Postagens

Autoconhecimento e liberdade*

Se conhecer faz toda a diferença, pois é isso que nos permite não mais nos demorarmos tanto onde persistir é uma tarefa em vão. E curiosamente, é o fenômeno do autoconhecimento que nos dá poder e lucidez suficientes para deixar passar algumas circunstâncias ou recomeçar sempre que estivermos num caminho ruim ou que já não faz mais sentido, sobretudo, porque o seu lugar já é no passado. Somente o autoconhecimento nos liberta e nos ensina a dizer não quando é preciso doa a quem doer comova a quem comover. É pelo autoconhecimento que descobrimos a fundo o valor de compreender que tudo que nos tira a paz não merece durar ao nosso lado mais do que o tempo mínimo e inevitável. Enfim, se conhecer é fundamental demais porque é isso que melhor nos faz conhecer tão bem qualquer pessoa e sair tranquilamente de mãos dadas na direção de tudo que realmente importa, desde se ausentar em paz de um restaurante quando o menu não nos agrada até mesmo escolher conscientemente partir, tolerar ou se manter ...
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Linguagem e singularidade*

A noção de linguagem que Wittgenstein apresenta nas suas Investigações Filosóficas, cuja concepção é a de que o significado das palavras depende de seu uso na linguagem, em Filosofia Clínica se traduz como um dos princípios dos cuidados de que deve ter o filósofo clínico na sua atividade clínica, nas acolhidas existenciais a que se dispõe, e que, adversamente às técnicas tradicionais da psiquiatria ou das psicologias tradicionais - que não fazem senão hermenêutica sobre o discurso ou expressividade do indivíduo - permitirá guardar o sentido mais original da palavra no contexto discursivo do sujeito, ou seja, respeitando ou limitando-se a entendê-lo a partir e à medida de um sujeito em seu território. Sendo um projeto único, permite-se acessar todo um vocabulário, recheado de significados singulares para cada expressão de sua semiose. Aquilo a que chamou “jogos de linguagem” refere-se, segundo o próprio Wittgenstein, aos vários usos das palavras e ao conjunto das atividades com as quais...

Um lugar sagrado*

À primeira vista se acessa aquilo que salta aos olhos, como: espanto, dúvida, invisibilidade. Com essa aproximação se tem diante de si algo desconhecido. Eventos refugiados no esboço de uma irrealidade acontecendo, num vislumbre das quimeras e utopias esparramadas nos desvãos manuscritos da vontade inicial.    Os princípios de verdade consagram, em seu convívio diário, um espírito de rebanho. O cerceamento, a interdição, reapresenta a noção de paraíso e inferno. A recusa de ser encontra na cultura sua melhor escola aos freios existenciais. Quando refém desses agendamentos, as buscas seguem à deriva de seu melhor.   Em meio a essa vontade interditada se especula sobre as rotas de fuga para si mesmo. Aqui se cogita sobre a vertente não sufocada pelo contexto onde surgiu, aquilo que se mantém apesar de. Uma conjugação de habilidades e competências a transgredir os limites que não lhe pertencem. Assim, se pode decifrar a gramática da subjetividade ao rever suas páginas. ...

Críticas*

“Há apenas uma maneira de não receber críticas: não faça nada, não diga nada, não seja nada”.   Esta é uma frase que ouvi há muito tempo e que está na internet com diferentes nomes de autores, então prefiro não colocar nenhum. Mas o que interessa aqui para mim é que isso se torna mais verdadeiro hoje nos dias das mídias sociais e do enxame de pessoas com “coisas a dizer” na internet. A gama de informações aumentou vertiginosamente, mas a capacidade de se colocar aberto a críticas ou ao diálogo não acompanhou esse crescimento. Na era da subjetivação da personalidade, do acesso e exposição pessoal de cada vírgula pensada, a gama de opiniões e “verdades” assola nosso entorno em qualquer lugar que nos conectamos. Hoje não é somente as grandes mídias de televisão, jornal ou rádio que dão opinião e contam “verdades” ou fatos, mas qualquer um da rua, que cruzamos no dia a dia. As comunidades “tribais” cresceram vertiginosamente o que favoreceu aparecerem do ostracismo ou da margem a ...

Objetividade parcial*

Não é raro ouvirmos dizer sobre ver algo de cima ou de fora. Como se o melhor procedimento para enxergar determinada situação, evento ou experiência seria a partir de um distanciamento. Uma pretensão de objetividade ou imparcialidade. Mudar a perspectiva, seja ela qual for, pode viabilizar um outro olhar. Talvez isso soe consensualmente. Mas, não garante a neutralidade do olhar de quem observa. Quem nos deixa cientes disso são filósofos como: Dilthey, Heidegger, Gadamer e outros ao mostrar o quanto nossa existência é inserida em uma história. Nossos horizontes são viabilizados por elementos culturais, históricos, pelas experiências pessoais. Desse modo, é inevitável um olhar carregado por uma “bagagem existencial”. A pretensão de objetividade cessa na escolha do que é observado. Pois este foi selecionado com parcialidade, vontade, interesse etc. Talvez o caminho para uma investigação honesta seja a aceitação da ausência de qualquer ponto de vista absolutamente neutro. Reconhecer que há...

Primavera Irracional*

“Eu fechei os olhos para lembrar com todos os meus votos a verdadeira noite, a noite liberta da sua máscara de horrores, ela, a suprema reguladora e consoladora...”                                                                      André Breton   Equinócio que esconde a verdadeira face do mal, os homens não descansam. Nunca descansam. A humanidade vive para atravessar todas as adversidades, alguns destroem a vida, queimam as ideias e deixam a Terra arder. No hemisfério dos sonhos, a vida é salva pela natureza, os homens são excluídos pela ganância, que só existe no cérebro dos que dizem ser racionais. Nada separa o que está em pleno movimento de viver da finitude. E...

A metafísica de Alberto Caeiro*

  De todos os heterônimos de Fernando Pessoa talvez seja Alberto Caeiro, um dos meus neopagãos prediletos, ao acionar em nós o submodo em direção às sensações (da abstração intelectiva para sensação corpórea), que mais dialogue com sensorial & abstrato, o tópico 3 da estrutura de pensamento. Entendendo por sensorial o que deriva diretamente dos sentidos (dimensão do mundo sensível, concreto, plano dos fatos) e por abstrato o que se liga aos conceitos (dimensão do mundo inteligível ou arquetípico, plano das ideias). estrutura de pensamento, por sua vez, definida como um conjunto plástico e dinâmico de 30 tópicos que, em combinações várias, servem de constructos a serem preenchidos pela diversidade que em cada um de nós habita de modo peculiar. Em clínica observamos que nem sempre o reiteradamente analisado é real e propício à sua integralidade. Em algumas singularidades a ponderação excessiva pode fragmentar o olhar, impedir conexões necessárias, gerar pontos cegos, romper c...

Revista da Casa da Filosofia Clínica Inverno 2025 - Ed. 13

  A edição inverno/2025 se apresenta em um convite aos estudos,reflexões, leituras sobre o papel existencial do novo paradigma da Filosofia Clínica. Uma fonte de inspiração com conteúdo de qualidade aos profissionais da nova área terapêutica. Boa leitura! CLIQUE AQUI PARA LER

Era uma vez...*

“Às vezes, eu acredito em seis coisas impossíveis antes do café da manhã” (Alice no País das Maravilhas, Tim Burton, 2010)   As singularidades adentram os espaços terapêuticos das mais improváveis formas. Alguns chegam indecisos sobre o porquê de estarem ali, afinal nem sempre existe obviedade; outros talvez não saibam que seja uma porta para descobertas tão incômodas quanto difíceis. Existe a probabilidade de que um turbilhão os perpasse, podendo arremessá-los até a mais insana possibilidade de ser. Na verdade, percorrer caminhos de encontros pode ser tão inusitado quanto permanecer inerte no estado catatônico em que a normalidade desavisada costuma nos mergulhar. Cada um tem sua estrada, suas histórias na bagagem, que muitas vezes arrastam melancólicos ou sem vontade, desgostosos do que mais desejam. Na verdade, as histórias se misturam em potes, cujo fundo nem sempre é visível. Falas entrecortadas de peculiaridades trazem à tona que um dia fui assim... há muito tempo não sei mai...

Mais um***

Sinta a maciez no contato físico das mãos e dedos sobre o papel agradável de cada folha, nas páginas do mais recente livro de Hélio Strassburger. Um convite às sensações, Filosofia Clínica e Literatura: Conversações oferece, como submodo, um percepcionar. Em direção às ideias complexas, imagino esse livro sendo lido, no toque, em braile, pelos dedos de um leitor desprovido da visão física dos olhos Um livro de sinônimos. Se “sinônimo de amor é amar”, conforme música de Cláudio Noam e parceiros, sinônimo de sensações é ler! A leitura do trecho em que o autor diz que “É possível exercer uma atividade dessa natureza [papel existencial] mesmo ao distorcer a expressividade.”, causou um estranhamento e fez pensar na palavra “expressividade”. Ao continuar a leitura, tive minha compreensão do termo como tradução de singularidade. Daí a intuição de que esse texto do Hélio (não apenas esse) é um livro de sinônimos. Sinônimos como tradução, outro submodo bem característico nas obras deste autor. ...

Unanimidade científica?*

Amigos, não existe “a posição da ciência”. Como mostraram Bachelard, Kuhn, Feyerabend e muitos outros depois deles, a idéia de uma posição unitária da ciência não passa de uma idealização, de uma sinédoque, de uma personificação. "A ciência" não afirma nada; "a ciência" não sustenta posição nenhuma. Quem afirma, quem sustenta as suas posições, são "os cientistas" e "os grupos de pesquisa". E eles não afirmam nada em uníssono, eles não pensam em bloco: não existe unanimidade em nenhum campo científico. Como diz Feyerabend em "Ambiguità e armonia: lezioni trentine", "o monstro 'ciência' que fala com uma única voz é uma colagem feita por propagandistas, reducionistas e educadores. Dizer que 'somos obrigados a tomar a ciência como guia em questões relacionadas à realidade' não é só errado – é um conselho que não faz sentido". Afinal, em todos os ramos da investigação científica – na física, na biologia, na soci...

La aventura de ser filósofo clínico - entrevista*

*Entrevista a Fernando Fontoura: La aventura de ser filósofo clínico por Arantxa Serantes Introducción En este contexto, la figura de Fernando Fontoura se erige como un referente destacado en el ámbito de la Filosofía Clínica, desempeñando un papel crucial en la exploración y comprensión de los intrincados vínculos entre la mente y el cuerpo. Con una visión única, Fontoura aborda la tarea de desentrañar las complejidades de los pacientes psicosomáticos, cuyos síntomas, aunque reales, desafían la percepción convencional de la medicina. La entrevista promete arrojar luz sobre la aventura de ser filósofo clínico, ofreciendo una perspectiva esclarecedora sobre cómo la Filosofía Clínica se erige como un puente entre el pensamiento y la salud física. Exploraremos cómo este enfoque no solo busca abordar los síntomas superficiales, sino también indagar en las raíces emocionales que han tejido la trama de la enfermedad. Acompañaremos a Fontoura en su labor de revisar la historia de cada...

Encontro*

O contrário de perder é encontrar. Quando alguém se perde no mato precisa encontrar a saída. Se perder a carteira, é bom fazer uma reza pra encontrar. Quando se está perdido em um pensamento, um problema, uma adversidade ou uma agrura qualquer, procura-se encontrar a solução para resolver a aflição. Quando você marca um encontro com alguém, esta procurando uma saída, um desenlace ou simplesmente pretende ficar frente a frente, se deparar e ver no que vai dar? Os americanos têm uma expressão, “date”, que significa ter um encontro ou sair com alguém em um contexto romântico, para que se conheçam melhor. Linguisticamente falando, “ir ao encontro de” significa acolher, concordar. Por outro lado, “ir de encontro a” indica discordância, bater contra. Na prática, quando marcamos um encontro, usualmente imaginamos que estamos propondo uma junção convergente de pessoas. Só que nem sempre acontece. Tanto pode haver concordância como discordância, embaraço, discussão, indiferença ou até mesmo des...