Amigos, ao encontrar essa
que talvez seja uma das mais tristes tirinhas do Calvin - neste caso, uma
tirinha criada por um fã -, recordei vividamente de algo que passei há alguns
anos como professor numa escola privada.
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No último ano em que lecionei Filosofia no fundamental, para uma turma de oitavo ano (isto é: crianças de treze e catorze anos), havia um menino com olhos que faiscavam com o fogo da vida. Alegre, falante, brilhante.
Ele não conseguia participar das aulas sentado. Por isso, na minha classe podia andar pela sala livremente - e foi em uma aula de Filosofia que descobriu que recuperava a calma o foco ao se deitar sob o quadro, justamente no espaço em que o professor usualmente caminha durante as explicações.
Pois bem: durante uma aula, a coordenadora entrou na sala e viu o pequeno deitado ali. Imediatamente gritou com ele, que teria sido conduzido à direção se eu não houvesse interferido.
Quando expliquei, privadamente, que não somente autorizava, mas mesmo encorajava-o a participar das aulas deitado no chão - pois assim ele ficava mais confortável e atento -, a coordenadora olhou fundo nos meus olhos por alguns segundos.
Até hoje não sei se ela queria me intimidar ou me entender. Sei que, frente à minha impassibilidade, começou a rir: "Hahahaha, só você mesmo, hein, Bertoche". Acho que recebi naquele momento a indulgência reservada aos professores de Filosofia, esses esquisitões.
Resultado: ele continuou a participar das minhas aulas até o fim do ano letivo caminhando peripateticamente entre os colegas ou, qual um Diógenes, esparramado sob a lousa.
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Um tempo depois, o jovem foi meu aluno novamente, já no ensino médio.
O fogo dos seus olhos havia se apagado. Sentava-se encolhido na carteira escolar e nada falava durante as discussões de filosofia. Não procurava nenhum professor mais simpático para conversar animadamente na hora do recreio.
Às vezes, dormia durante a aula. Ajustando os medicamentos, me disseram.
Fui conversar com a coordenadora sobre ele.
"Ah, é sobre o aluno fulano de tal? A família medicou, os professores estão elogiando, ele agora está ótimo, né?"
O meu coração chorou.
*Prof. Dr. Gustavo Bertoche.
Filósofo. Escritor. Musicista. Filósofo Clínico. Além do doutoramento acadêmico (UERJ), possui o doutorado "Honoris Causa" conferido pelo Conselho da Casa da Filosofia Clínica em 2019.
Teresópolis/RJ
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