Amigos, não basta saber ler para
compreender um texto. Para absorvê-lo mais ou menos inteiramente, é preciso
conhecer o campo de sentidos em que foi escrito.
Isto é: o domínio da língua não
se esgota na leitura e na escrita proficiente. A língua é composta por muitas
linguagens que se inscrevem em diferentes regiões hermenêuticas.
Ao transitarmos por um texto
escrito numa região hermenêutica desconhecida, encontramo-nos numa situação de
analfabetismo simbólico; não o interpretamos corretamente porque desconhecemos
os complexos nos quais os seus símbolos se relacionam. Estamos como que diante
de um texto escrito noutra língua, uma língua ignorada. Todavia – e aí está a
tragédia –, acreditamos compreender o lá está colocado, porque sabemos o
significado ordinário daquelas palavras.
O exercício intelectual mais
difícil é o reconhecimento da própria ignorância: se somos capazes de ler todas
as palavras de um texto, como podemos chegar à conclusão de que talvez não o
compreendamos? E que a ordem em que as palavras são dispostas faz emergir um
nível hermenêutico - de cuja existência podemos não suspeitar - que
eventualmente cria um significado completamente diferente, e mesmo invertido?
* * *
Uma certeza: a perda da
capacidade interpretativa do brasileiro comum é conseqüência do abandono da
nossa literatura e da nossa poesia.
Temos escritores e poetas? Sim.
Mas temos os leitores correspondentes? Quantos romances brasileiros lançados
recentemente você leu? Quantos livros dos nossos poetas vivos você comprou
neste ano?
Não duvidemos: a morte da nossa
literatura, o desaparecimento da nossa poesia, é o augúrio da insuficiência
civilizacional brasileira.
*Prof. Dr. Gustavo Bertoche
Filósofo. Educador. Escritor.
Musicista. Filósofo Clínico.
Casa da Filosofia Clínica
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