O homem capaz de
sacrificar de ânimo leve um hábito mental há muito tempo formado constitui uma
excepção. A grande maioria dos seres humanos não gosta e, na realidade, até
detesta todas as noções com as quais não estão familiarizados. Trotter, no seu
admirável Instincts of the Herd in Peace and War, chamou-lhes de «mente
estável» e colocou em oposição a eles uma minoria de «pessoas de mente
instável», apaixonados pela inovação em si própria.
A tendência do homem de
mente estável, quer seja introvertido ou extrovertido, visionário ou não
visionário, será sempre para verificar que «aquilo que está, está certo». Menos
sujeito aos hábitos de raciocínio formados na mocidade, os de mente instável
naturalmente que sentem prazer em tudo o que é novo e revolucionário. É aos de
mente instável que devemos o progresso em todas as suas formas, assim como
todas as formas de revolução destrutiva.
Os de mente estável, devido à sua
relutância em aceitar modificações, dão à estrutura social a sua sólida
durabilidade. Há no mundo muito mais gente de mente estável que instável (se as
proporções fossem trocadas viveríamos num caos); mas em todos menos em alguns
momentos muito excepcionais, eles possuem o poder e a riqueza mais do que
proporcional ao seu número.
Daí resulta que, ao aparecerem pela primeira vez,
os inovadores foram geralmente perseguidos e sempre escarnecidos como lunáticos
e loucos.
Um herético, de acordo
com a admirável definição de Bossuet, é aquele que «emite uma opinião singular»
- quer dizer, uma opinião sua, em oposição a uma que já foi consagrada pela
aceitação geral. Que se trata de um patife, não é preciso dizer. É também um
imbecil - um «cão» e um «demónio», no dizer de São paulo, que profere
«baboseiras vãs e profanas».
Nenhum herético (e a ortodoxia de que ele se
afasta não tem necessariamente de ser uma ortodoxia religiosa; pode ser
filosófica, ética, artística, econômica); nenhum autor de opiniões singulares é
alguma vez razoável aos olhos da maioria dos de mente estabilizada. Porque o
razoável é o familiar, é aquilo que os de mente estável estão no hábito de
pensar no momento em que o herege profere a sua opinião singular. Usar a
inteligência de qualquer outro modo que não seja o habitual não é usar a
inteligência; é ser irracional, delirar como um louco.
*Aldous Huxley
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