Podemos começar a falar
de inclusão, tentando entender o conceito de integração.
Integrar é agregar uma
pessoa em uma estrutura já pronta, definida, com seus processos já acertados e
rígidos. A pessoa integrada faz o esforço de se adaptar aos valores, hábitos,
normas e estruturas apresentadas a ela. A ação do integrador, do cicerone, é
mínima no sentido de dar atenção às necessidades da pessoa a ser integrada.
Apresenta e deixa à vontade para o integrado se adaptar.
Incluir é adaptar as
estruturas e processos às necessidades e capacidades da pessoa que chega. É
fazer dos hábitos e valores uma forma de ressonância com aquilo que o outro
pode e consegue dar dentro de suas capacidades. O currículo adaptado em algumas
escolas é um exemplo de inclusão. O aluno tem que atingir não o que toda a
turma precisa atingir, mas aquilo o qual sua capacidade suporta.
Tão importante quanto
exercer a atividade de incluir é como se faz isso. Incluir passa pelo
enfrentamento da alteridade e isso é tão difícil quanto mergulhar de
guarda-chuva aberto. O outro, sejam pessoas, ideias, conceitos, teorias, gostos
e desejos que não os seus, quase sempre é considerado uma ameaça, velada ou não
em nosso pensamento mais consciente. Claude Lévi-Strauss, antropólogo e
filósofo francês, dizia que essa necessidade de lidar com o outro, o
alienígena, o diferente gerou algumas estratégias. Uma, a antropoêmica que
consiste em vomitar, cuspir os estranhos. Impedir o contato físico, o diálogo,
a interação social e relações desse viés.
Zygmunt Bauman, sociólogo polonês,
diz que as variantes externas dessa estratégia são o encarceramento, a
deportação e o assassinato. A outra estratégia é a antropofágica, que consiste
em ingerir os alheios, devorá-los, de modo a fazer, pelo metabolismo, idênticos
aos corpos que os ingeriram. Bauman diz que as variantes externas dessa
estratégia são o canibalismo, a assimilação forçada como cruzadas culturais,
cultos, guerras contra costumes locais e afins.
Outra forma de encarar o
estranho, o outro, o diferente é uma forma mínima de respeito disfarçada de
tolerância e resumida pela frase “cada um no seu quadrado” ou “viva e deixe
viver”. Tipo, eu tolero, eu aceito desde que cada um no seu canto, no seu
bairro, no seu gueto e sem nenhuma interferência ou contato de ambos os lados
da fronteira. Não o puno por ser diferente, não entro em contato e não quero
fazer com que seja como eu, simplesmente tolero pela completa exclusão.
Tolerar o diferente não
é inclusão. É apenas não excluir. Tolerar é um primeiro passo tímido para estancar
a exclusão, mas ainda não é atividade de inclusão. Inclusão se dá pelo respeito
às diferenças do outro e à percepção do outro como um dos nossos. Como diz
Jürgen Habermas, filósofo alemão, a inclusão do outro significa que as
fronteiras da comunidade estão abertas a todos, também justamente àqueles que
são estranhos um ao outro e querem continuar sendo estranhos.
Esta questão é uma das
centrais no problema do multiculturalismo e do pluralismo cultural. Qualquer
preconceito de diferença onde um se ache mais especial, valoroso, merecedor,
inteligente ou outro atributo a mais que o outro, abre-se espaço para se
instalar a intolerância e todas suas formas de exclusão, pela violência física,
moral, política.
A inclusão não pode
virar moeda de troca, tipo eu te incluo se... Aceitar o outro como ele é
somente de forma incondicional, sem barganha. Aceitar o outro não é concordar
com todos seus valores e ideias, mas entender que valores e ideias que não as
suas também são valores e ideias válidas.
É muito mais fácil
excluir, tolerar, “deixar viver” do que incluir, aceitar e exercitar a empatia.
Mas em uma vida em comunidade cada vez mais plural e mais desigual política,
social e economicamente, quem não fizer sua parte na inclusão estará
trabalhando silenciosamente para a exclusão e para o aumento das desigualdades.
*Fernando Fontoura
Filósofo, Estudante na Casa da Filosofia Clínica
Porto Alegre/RS
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