"Por mais que o
conhecimento médico tenha evoluído e se apossado de recursos tecnológicos cada vez mais precisos,
ainda assim, muito se faz necessário para que possamos conhecer como funciona o
corpo humano. Quantos milímetros de pele, músculos, tecidos e ossos ainda
precisarão ser pesquisados para que possamos dizer com segurança que dominamos
integralmente a fisiologia e patologia do organismo humano?
Se o entendimento da
parte corpórea já apresenta tamanha dificuldade, imagine o lado emocional? Será
que algum dia teremos informação suficiente para decifrar os códigos do mais
intrínseco enigma da raça humana?
Muito se tem estudado,
mas ainda estamos engatinhando. A maioria das pesquisas direciona-se no sentido
das tendências. Podemos imaginar, perante uma criteriosa análise do
comportamento passado o que poderá se desenhar no futuro, mas nunca saberemos
com exatidão o que passa na cabeça do outro.
Existe um infinito
separando o intelecto das pessoas. Dizer que se conhece o outro é negar este
espaço sagrado. O outro é como um iceberg, nós vemos apenas uma fração que, às
vezes, ele se permite mostrar. A grande parte está escondida. O que o outro
mostra talvez não represente nem dez por cento do que realmente seja, sinta,
pense ou possa vir a se transformar.
Talvez resida aí uma
explicação para o fato de ser tão difícil relacionar-se emocionalmente.
Precisamos mesmo conhecer o máximo do outro? O que ganhamos com estas
informações? Seres inteligentes demais, sagazes demais, curiosos demais perdem
um tempo precioso buscando respostas que os permitam encurtar a incomensurável
distância que os separa de seus parceiros. Quase nunca conseguem, mas é comum
colocarem a culpa de seu fracasso no comportamento do outro.
Amar é tiro ao alvo no
escuro. É preciso certa dose de ignorância para amar. Que boba pretensão pensar
que nosso coração e nossa cabeça podem
adivinhar o querer do outro. Não
sabemos. Nunca saberemos. Talvez seja melhor trocar a lupa com que estamos
examinando o outro por um espelho. Olhar e confiar em si, entregar-se e
meramente viver sem a preocupação de entender a magia do encontro.
E se por acaso falhar,
se o outro não for a pessoa certa, se eu me arrepender? Esqueça as perguntas,
deixe seu sentimento decidir. Pode dar muito certo ou muito errado, mas
qualquer das alternativas é melhor que fechar os olhos e não sonhar com
ninguém; pensar em um beijo e não lembrar de uma boca em especial ou fazer
planos e estes serem sempre solitários.
Não é preciso
compreender o incompreensível. Basta a entrega.
*Ildo Meyer
Médico, escritor, palestrante, filósofo clínico
Porto Alegre/RS
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