Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de janeiro, 2023

Percepções e reflexões em Filosofia Clínica*

A Filosofia Clínica tem um jeito próprio de pensar, diferente. Traz para a terapia o olhar, os modos de compreensão e de entendimento das tradições filosóficas ocidentais. A sua originalidade é colocar como central a ideia de singularidade, que cada pessoa é diferente de cada uma das outras. Não há uma noção de ser humano a priori, pré-estabelecida. Cada um virá do seu modo e será recebido com o que lhe é próprio, em suas tonalidades afetivas, com aquilo que tem feito em sua história, nas circunstâncias de sua vida. Com sua loucura, suas maneiras de lidar com o mundo, com a existência, com os outros, consigo. Não trabalha com a noção de doença, nem com tipologias psicopatológicas. O que não quer dizer que não reconheça e trate dos fenômenos da depressão ou de comportamentos tidos como bipolares. Ansiedade, angústias, tédio e tantas outras formas de viver, de sofrer, fazem parte daquilo que se cuida em Filosofia Clínica. Cada vida pode ser vista como um fluxo de emoções, afetos e

O que é a Filosofia Clínica ?*

A resposta geralmente adotada pelos filósofos clínicos é: “a Filosofia Clínica é a filosofia acadêmica aplicada à terapia”.  Esta resposta é boa. E não é. É uma boa resposta porque é exatamente isso que a Filosofia Clínica faz: aplica a filosofia da tradição ocidental, a filosofia acadêmica, à terapia. Por outro lado, é uma resposta abrangente demais. Afinal, o conjunto da “filosofia acadêmica” tem uma quantidade muito grande de elementos, que podem ser tão diferentes entre si quanto podem ser diferentes variadas espécies de, digamos, frutas. Por essa razão, a afirmação de que “a Filosofia Clínica é a filosofia acadêmica aplicada à terapia” é inútil. Aos olhos do leigo – e mesmo de muitos estudiosos – a filosofia é um emaranhado de teorias contraditórias, quando não bizarras; parece que qualquer coisa pode ser filosofia, e que filosofia pode ser qualquer coisa. Mas isso não é verdade. A filosofia tem um fio condutor muito claro. Para explicar isso, vou fazer uma analogia com

Anotações do 1º Encontro online Epoché de Filosofia Clínica*

  Na noite do dia 19/01/2023 em uma parceria entre Epoché Filosofia Clínica e Casa da Filosofia Clínica, aconteceu o "1º Encontro Online Epoché: A Prática da Filosofia Clínica" com a coordenação e condução do Filósofo Clínico Fernando Fontoura.  Nesse evento de construções compartilhadas tivemos a honra de ouvir e conversar com o professor Hélio Strassburger, referência em prática clínica.  Ele que publicou recentemente o artigo intitulado: " Filosofia Clínica e Discurso Existencial" , na edição de n. 12 da revista Silex pela UARM - Universidade Antonio Ruíz de Montoya, de Lima no Peru. Uma das marcas do professor Hélio em sua trajetória tem sido ouvir e cuidar das singularidades postas à margem, internadas, se não em hospitais psiquiátricos, em diagnósticos, tipologias, medicações psiquiátricas que anulam ao invés de revelar as singularidades de cada um. Em seguida, ouvimos o relato de três alunos do professor Hélio, formados pela Casa da Filosofia Clínica. F

A escuta compreensiva na clínica filosófica*

  Ao iniciar essa análise faço um convite a você, caro leitor. Partirmos da noção de singularidade como pressuposto para que possamos, juntos, seguir no progresso deste estudo. De maneira breve a singularidade, na Filosofia Clínica, é um conjunto de fenômenos que compõem o partilhante e sua medida de relação e interseção com o mundo interno, externo e, também, com outras pessoas. O esperado é que o Filósofo Clínico mantenha- se despido de seu juízo e valor pessoal. Por sua vez, essa atitude propicia um ambiente onde aquele que compartilha sua história pode ser conhecido através de seus próprios critérios. A escuta realizada na prática terapêutica prevê a literalidade, ou seja, aquilo que é dito deve ser compreendido e não interpretado. O ser humano singular é o mar por onde o filósofo clínico navega. É dentro das condições apresentadas por este mar que se manifesta a Filosofia Clínica. Articulando os elementos citados acima cria-se uma atmosfera que protege o partilhante. Constit

Primeiro Encontro Online Epoché*

  Bom dia! Hoje 19/01/2023 (quinta-feira) a partir das 19hs, teremos um evento inédito, promovido pelo Instituto Epoché , com apoio da Casa da Filosofia Clínica , sob a coordenação do Prof. Dr. Fernando Fontoura.  Trata-se do Primeiro Encontro Online Epoché . O evento será aberto e gratuito . Quem quiser e puder, tem a possibilidade de uma doação espontânea para o projeto "Altruísmo Eficaz". Os dados para participar do encontro pela plataforma Zoom estão no flyer acima. Basta acessar o site e colocar o ID. Caso peça a senha, também está compartilhada no flyer. Essa é mais uma oportunidade de se ouvir uma fonte de matéria-prima - confiável - aos estudos e pesquisas, pois teremos a participação de alguns filósofos e filósofas clínicas com efetiva atuação em consultório há vários anos com a abordagem precursora da Filosofia Clínica. Bem-vindos! Bem-vindas! Dra Márcia Ribeiro Baroni Diretora da Casa da Filosofia Clínica www.casadafilosofiaclinica.blogspot.com

Pretéritos Imperfeitos*

“A experiência trivial do dia a dia sempre nos confirma alguma antiga profecia (...)”          Ralph Waldo Emerson   Existem eventos que possuem um começo sem fim. Perseguem uma in_de_termin_ação futura na travessia pelas antigas pontes. Neles é possível vislumbrar uma sombra suspeita, como algo mais a perturbar a lógica bem ajustada das convicções. Assim a grafia parece se orientar por um ontem a perdurar. Atitude rarefeita de olhares a perseguir buscas contaminadas. Esse contágio parece querer singularizar a pluralidade de cada um. Aprecia a menção de fatos acontecidos no prolongamento do instante. Aparecem como atuação simultânea de um em outro, seu paradoxo dilui-se numa dialética de integração.    Uma de suas características é realçar fatos no momento em que ocorriam. Essa incerteza quanto ao amanhã, parece coincidir com o desfecho provisório de seu inacabamento.   Nessa terra de ninguém uma infindável trama de acontecimentos se refugia. Parece com algo que não se deixa

O que é Filosofia Clínica ?*

A Filosofia Clínica foi criada pelo médico gaúcho, Lucio Packter que, insatisfeito com algumas abordagens terapêuticas, na década de 80, pôs-se a viajar pelo mundo em busca de novos métodos para conhecer e cuidar o ser humano em sua integralidade. Mesmo conhecendo a filosofia de aconselhamento na Europa e a filosofia prática, nos EUA, iniciou suas próprias pesquisas, resultando no que chamou de Filosofia Clínica.   A Filosofia Clínica é uma abordagem terapêutica que visa trabalhar as questões existenciais do paciente que, em Filosofia Clínica, é chamado de partilhante, porque na dinâmica da clínica filosófica, o que existe é uma construção partilhada que se dá através da interseção (modo de relação) de ambos na busca por um conforto existencial. É Filosofia porque parte da inspiração de seu método a partir da pesquisa dos filósofos ao longo da história do pensamento ocidental. É clínica porque pretende ser aplicada ao todo do homem, do sujeito que procura a terapia, na intenção de

As dores e as delícias do estudo da Filosofia Clínica*

Andei perdida de textos escritos, pensei que esse lado escritora meu havia se perdido por entre a vida corrida do dia a dia. As palavras iam e vinham na minha mente, mas eu não conseguia capturá-las com precisão. Terminando a pós esse ano me deparo com o trabalho final e petrifico entre mil e uma ideias. Conflitos, incertezas, questionamentos, dúvidas quanto a tudo o que aprendi e tudo que experienciei... Sinto-me mais conhecedora das minhas sombras e da minha luz. Entretanto, questiono o porquê dessa escolha dentre tantas outras que envolvem a filosofia. Sempre tive vocação para as questões existenciais, seja na minha representação de mundo, como na representação de mundo de outros. Mas vir a ser - filósofa clínica - é uma tarefa delicada que me faz temer muitas coisas. Ser cuidadora é algo muito frágil e precioso. Tenho percebido carências tão primárias nas pessoas com as quais convivo que penso se realmente há uma segurança de "melhor viver" através de qualquer terapia

Aparências enganam*

Aparências enganam. Palavras também. Parecia um casal em perfeita harmonia, conversavam bastante, discutiam a relação, mas por baixo dos lençóis as coisas não estavam bem.   Aos poucos o “eu te amo” foi sendo trocado pelo “se cuida”, o beijo apaixonado foi reduzido a um selinho, o abraço apertado virou um tchau com cara de adeus. Decidiram então que já não se amavam, os corações não mais se encaixavam e não precisariam ficar a espera de um final penoso e litigante. O melhor que tinham a fazer era a separação.   Decidiram também que o melhor para eles seria não se encontrarem dali para frente. Trocaram olhares profundos, palavras de desfecho,   fizeram as divisões necessárias   e nunca mais se viram.   Os bens materiais foram repartidos como se estivessem jogando cartas, metade para cada um quase que aleatoriamente, sem desentendimentos.   A desarmonia surgiu na sutileza do imaterial e impalpável.   Visto que não queriam mais se encontrar, precisavam repartir também a cidade. Um

A matemática simbólica e a singularidade**

  A novidade da filosofia clínica é a afirmação da singularidade. Cada partilhante é critério de si, a partir de sua historicidade, fornecendo parâmetros à realização dos procedimentos clínicos ao terapeuta. Mas, alguns desdobramentos dessa abordagem terapêutica são questionáveis. Refiro-me a questões relativas à matemática simbólica.    Para refletirmos, uso a filosofia clínica como o método para melhor explicá-la, corrigi-la e desenvolvê-la. As linhas seguintes demandam concisão. Considero a filosofia clínica capaz de compreender formulações complexas ao analisar suas composições estruturais. No início da “Filosofia Clínica: propedêutica”, Lúcio Packter destinou as primeiras linhas para explicar o contexto histórico que permeou sua vida no período no qual iniciava suas pesquisas para a sistematização daquilo que mais tarde receberia o nome de filosofia clínica. A categoria circunstância descrita pelo autor nos ajuda a suspeitar que como o mundo parece é um tópico determinante em

Prática em Filosofia Clínica*

“Nesse sentido, a nova abordagem possui uma representação diferenciada do fenômeno humano; as pessoas passam a ter nome, sobrenome, uma história de vida singular, linguagem própria, expressividade peculiar, estabelecendo um abismo com as lógicas da tipologia, da classificação desumana dos manuais psiquiátricos, os quais, ao oferecer diagnósticos, prognósticos, curas, normalidades, destituem a pessoa de seu ser sujeito em ação.” – Hélio Strassburger em Filosofia Clínica: anotações e reflexões de um consultório. Ed. Sulina. Porto Alegre/2021.   Pode ser que muitos que não sejam terapeutas e leiam as linhas acima se perguntem, meio frustrados ou estupefatos pela afirmação feita, “Mas não é assim com qualquer terapia séria? Não é assim que todas fazem? Como poderia uma terapia ser diferente disso? Então, qual é a vantagem da filosofia clínica ao afirmar tudo isso?”   Vamos começar pelo maior contraste, já que, às vezes, o mais próximo é o mais difícil de enxergar as nuances. Hélio já c

Poéticas do amanhã*

                   “Antes eu era transparente, agora sou cheio de cores”                                                                                                                                                                    Arthur Bispo do Rosário   A inédita conversação nos recantos da palavra delirante possui característica de anúncio. Sua perspectiva de grande abertura oferece derivações a insinuar vontades e perseguir refúgios existenciais. Uma filosofia dos devaneios sugere novas menções. O hospício cotidiano, esse lugar legitimado por força de lei, atualiza seu discurso em paradoxos com olhares desfocados. Enquanto a enfermaria multiplica a fenomenologia dos delírios, o lugar reinventa a camisa de força da normalidade e persegue os poetas enlouquecidos pelo não dizer. No caso da vírgula contida nesses atalhos, dizeres desconsiderados prosseguem em rituais de ilusão. Sua estrutura significante faz referência aos incríveis vislumbres, numa palavraria sem sentido

Visitas