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Mostrando postagens de abril, 2023

Idioma dos olhos*

Aprendi com uma fotógrafa que para demonstrar felicidade em uma foto não é preciso sorrir com a boca, são os olhos que transmitem o estado de humor. Quantas vezes você já viu aquilo que chamamos de “sorriso amarelo”? Boca sorrindo e olhos chorando, denunciando o estado de espírito em sofrimento.   Quando uma pessoa está bem, seus olhos transmitem essa energia positiva que se projeta direto na foto. Não há como enganar. Aprendi com meu neto Bernardo, que agora completou um ano de idade, que a boca também não é necessária para ser entendido, os olhos conseguem dizer quase tudo. Quando brinco com ele e faço uma bolha de sabão, na tentativa de agarrá-la com as mãos, invariavelmente estoura. Ele me encara e seus olhos perguntam “onde foi parar a bola”? Ainda não tem capacidade de raciocínio para entender a fragilidade de uma bolha de sabão, o que ele quer mesmo saber é onde se meteu a tal bola que estava bem à sua frente, diante dos olhos. Bernardo ainda não sabe que sou seu avô, não

Investigação das águas*

“A imagem mental é a imagem que é descrita quando alguém descreve sua imaginação”. (Wittgenstein) Comer todas as palavras e certezas de palavras, vãos em muros, filamentos do tempo, a história, paixão e fome dos olhos, diafragma da alma, um escape de som, uma luz entre os corpos, um resto de palavras, o som quase silêncio entre o medo e a revelação, a fome do desejo nas paredes do tempo, e o corpo abundantemente dança em luz que suaviza os movimentos, o som perdido entre os livros, uma letra entre as letras, a formação de nuvens no outono, o céu se fecha, os olhos de sal, mareados, o instante final do esquecimento desaparece entre os restos dos dias, afasia da desrazão em águas profundas, um mar de realidade, um revestimento encobrindo a palavra, a claridade na luz do sol cortando o revestimento, o emergir. De volta. É como trazer as palavras e o corpo de volta à superfície. E os braços em longos, demorados movimentos, chapinhar entre plantas submersas, mistura de cansaço e carpas

Nota Dez*

Dez foram os encontros, dez as oportunidades de ampliar mundos e nos fazer um pouco mais presentes. Aguçamos leituras de contextos, exercitamos formas outras de estar, sem deixar de ser. Individualidades oceânicas espraiaram-se generosamente na vazão coletiva de fazer e aprender juntos. Respeitamos tempos, espaços e comandos. De bom grado, em confiantes acordos tácitos.     Com a entrega ao processo, ondas desaguaram na gente, ora como tormenta, ora como calmaria. Incomodados ou fascinados, nunca indiferentes. Soubemos não só sobreviver como tirar proveito da travessia.   Ingressei buscando maior materialidade, canalização corporal (sensorial) às abstrações que me são próprias. Meu corpo, tolhido e tiranizado em tempos de exceção, farto de tamanhas contenções, clamava por expressão, toque, contato, chão.   Pina Bausch, em meio a padrões de repetição, destamponou o mote do movimento. O grito contido que libera a ação. O salto felino que liga a terra ao céu.   Jerzy Grotowski d

Apontamentos de um Filósofo Clínico*

Ouvir de fato será sempre um desafio muito maior do que falar porque qualquer escuta qualificada ou, pelo menos, funcional, depende prioritariamente de competências afetivas muito ligadas a empatia, a compaixão, a solidariedade e a cidadania.  Já a fala é um impulso que pode até mesmo sair pelos cotovelos, sobretudo, quando a precariedade da observação e do sentir prevalecem. E tanto ouvir como falar nunca se limitou ao trivial. Pois, podemos desenvolver uma escuta através do sentir em diversas formas... Podemos ouvir com o coração, através do tato ou de um simples olhar! Podemos ouvir até a geografia de um sorriso ou o percurso das lágrimas no rosto de uma pessoa em prantos. E podemos falar com as mãos, com os olhos ou por meio das nossas próprias posturas e imposturas diante das circunstâncias presentes na jornada da vida. Mas sempre estará repousada nas nossas mãos a escolha de como sentir o outro e de como nos expressar na direção do outro, uma vez que essa responsabilidade nos

A Filosofia Clínica e o robô de escuta***

        O site: www.mittechreview.com.br publicou em janeiro/2022: “Terapeutas podem usar Inteligência Artificial para melhorar os resultados das terapias”. O artigo foi assinado pelo: MIT- technology review.    Inicialmente a proposta é de auxílio ao trabalho clínico do profissional da área PSI. Trata-se de uma pesquisa para saber como a terapia funciona. Uma verificação das linguagens utilizadas na hora clínica. Segundo o artigo: “busca identificar as expressões e devolutivas de resposta mais eficazes no tratamento de diferentes distúrbios”. Oferece uma “automação dos princípios ativos da terapia”. O projeto se desenvolve em universidades como: Washington e Pensilvânia (EUA), numa parceria da IA – inteligência artificial com a psicologia. Diz assim: “Busca-se desvendar os segredos de porque alguns terapeutas obtêm melhores resultados que outros (...) a tecnologia funciona semelhante a um algoritmo de análise de sentimentos”. Prossegue afirmando: “a IA converte a linguagem de

Dialogar*

Sobre a Filosofia Clínica dialogar ou não com as outras linhas Terapêuticas. Estudei por sete anos Psicologia e por questões circunstanciais, tive contato direto com a Psiquiatria, estudando e aprendendo durante 12 anos. Convivi com terapeutas do Brasil inteiro, tive uma clínica de terapia comportamental e eu mesma como paciente fiz terapia cognitiva, Gestáltica, psicanalítica até chegar na Filosofia Clínica. Com isso, acredito que posso dizer alguma coisa enquanto paciente e como estudante e pesquisadora. Entendo que se tem uma linha que dialoga com as outras é a Filosofia Clínica, primeiro por ser honesta no sentido de dar o mérito de sua fundamentação a mãe de todas, ou seja, a própria Filosofia, que por si só já é um oceano tão grande e recheado de conteúdos que poderíamos dela já ter múltiplas e infinitas linhas terapêuticas. Segundo porque profissionais de todas as áreas podem fazer o certificado B, que dá a base teórica a clínica filosófica, porém para a prática e para o c

Uma perspectiva prática da recíproca***

A metodologia da Filosofia Clínica contempla elementos que constituem a estrutura de pensamento e os modos de agir de cada pessoa. Alguns elementos, como a inversão e a recíproca, podem estar tanto na espacialidade intelectiva quanto nas ações do indivíduo. Simplificadamente, inversão é o movimento de trazer o outro ao seu próprio mundo, enquanto a recíproca é ir em direção ao outro. No espaço terapêutico, a recíproca pode fazer parte da qualificação da relação terapeuta/partilhante, sendo utilizada pelo terapeuta que escuta, acolhe e, principalmente, se isenta de suas perspectivas do mundo e das relações diante do discurso existencial do partilhante. Assim, considera essencialmente o outro para possibilitar o espaço da construção compartilhada. Em um esboço preliminar, através do discurso existencial do partilhante, a recíproca pode aparecer como tópico importante da estrutura de pensamento. Com a evolução do tempo terapêutico, através do acesso à historicidade, às circunstâncias,

Projeto resgata identidades por meio da cultura do cineclube***

Sim: Cinema Paradiso é um dos seus filmes preferidos. A proposta de levar o cinema “onde o povo está” foi o que motivou a inscrição do projeto de um cineclube com sede em São Tiago, sua cidade natal, em um programa do Ministério da Cultura, que ambiciona implantar salas de cinema pelo interior do país. A formação em Filosofia e a especialização em Filosofia Clínica, ambas na UFSJ (Universidade Federal de São João del Rei/MG), deram substrato à paixão pela imagem como elemento de fruição estética e de transformação social, via resgate de identidades culturais. A matrícula recente no Curso de Comunicação viabilizou o desejo de tornar-se uma documentarista glauberiana, daquelas que trabalhariam bem com uma câmera (digital) na mão e uma ideia (aglutinadora) na cabeça (revolucionária). Mariana Fernandes, autora do projeto Cine Mais Cultura de São Tiago, quer resgatar o ritual do cinema, aquele que motiva as pessoas a saírem de casa para assistir a uma história projetada numa tela. Ma

Recomeços*

Desbravo caminhos que em minha alma acordam com os primeiros raios do sol. No caminho da vida peregrino sem cessar. Contemplo as tardes com saudades das manhãs. O fruto doce das alegrias se mistura ao verde das esperanças. Em cada canto um novo canto que na melodia da alma se faz sinfonia no silêncio dos meus tantos cantos. Alma peregrina que encontra nos portos seguros os mais belos horizontes. Assim é a vida... Um eterno amanhecer que nas tardes de outono sonham com as primaveras que hão de vir. No passado de pretéritos os amores sempre novos com saudades do passado. Sempre caminhar, se perdendo nos encontros e encontrando-se nas perdas. Viver assim como o caboclo que no chão lavra a terra de certezas da chuva sempre incerta. Olhar sem desanimar, e caminhar rumo ao meu avesso que tece esperanças com as estrelas que anunciam o presente das estações. Trilhar... a vida sem medo e mesmo com medo arriscar... Perder-se... Encontrar-se... E perder-se novamente... O que de mim não sei

ESQUIZOFRENIA?*

  O que quero enfatizar agora, desde o início, é que a alegação de que algumas pessoas têm uma doença chamada esquizofrenia (enquanto outras supostamente não têm) foi baseada apenas na autoridade médica e não em qualquer descoberta médica; que foi, em outras palavras, resultado de uma decisão política e ética e não de um trabalho empírico ou científico. – Thomas Szasz; Mercedes Benet. Esquizofrenia: el símbolo sagrado de la psiquiatria . p. 13. Os comportamentos humanos podem ser considerados normais ou anormais somente em referência a algum padrão. E isso não é novo. Os primeiros estabelecimentos de reclusão ou confinamento de pessoas “anormais” vêm antes do século XV e essa prática de avaliação de anormalidade muito antes desse tempo. No entanto, as explicações sobre esses comportamentos podem ser de várias áreas tais como sociais, antropológicas, éticas, políticas etc., mas não médica. A não ser que esta pessoa tenha uma lesão no cérebro onde diretamente esteja afetada suas condiç

Anotações e percepções de um Filósofo Clínico*

  A maior responsabilidade educacional dos pais é a de identificar os talentos e a vocação do seu filho.  Mas como podemos fazer isso? * * * Em primeiro lugar, o princípio mais importante: não procure tornar o seu filho uma extensão dos seus projetos. Não tente realizar os seus sonhos por meio do seu filho. Ele terá, ele já tem, o seu próprio caminho, os seus próprios talentos, a sua vocação, os seus sonhos. E lembre-se: o seu filho não está no mundo para fazer nada por você: ele não lhe deve nada; tudo o que você faz por ele será retribuído aos seus netos. Em segundo lugar: preste atenção no seu filho. Descubra aquilo que ele faz bem, o que ele realiza com pouco esforço, os seus gostos, os seus interesses. Não estou falando aqui de matérias escolares. Na verdade, importa pouco se o seu filho "gosta de História" ou "gosta de Biologia". Esses gostos são mediados pela simpatia dos professores, pelas notas, por circunstâncias mil. Pense na vida fora do contex

Tempo*

Os homens não conseguiriam viver muito tempo em sociedade se não se deixassem enganar uns pelos outros. Uma dessas armadilhas é a contagem do tempo, uma convenção que não se adapta a todos. A sociedade criou o controle do tempo objetivo, medido em relógios e calendários, aspirando organizar agendas e encontros. Utilizamos relógios no pulso, nos celulares, nos luminosos das ruas. Somos avisados por alarmes para não atrasarmos ou esquecermos determinados compromissos. Viramos dependentes do relógio. Talvez a melhor expressão nesse caso seja escravos, viramos escravos do tempo. Algumas pessoas não estruturam seu tempo dessa maneira. Existe um tempo subjetivo, interno, vivenciado. As horas não fazem mais sentido. Não é com o relógio que contam as horas; é com a saudade. Só vivem o tempo que recordam. Não querem ficar com a herança da avó velhinha, querem ficar com a saudade da vovó. Dependendo da companhia, lugar, circunstância, o tempo pode passar mais rápido ou devagar. Existem mom

Terapia é...*

Terapia é um espaço, com uma terra fértil, que ajuda a desabrochar as mais lindas flores. Ao desabrochar se descobre espinhos, folhas mortas e até galhos tortos. Detalhes que compõe uma flor única. Mas são apenas partes que constituem o todo da flor.  Terapia é significar, é ressignificar, é dançar entre as linguagens que formam o mundo de cada um. É descobrir para onde as tuas asas podem te levar, ou melhor ainda, é poder escolher para onde deseja que tuas asas te levem. Terapia é contato com as suas verdades, é poder brincar com essas verdades e, quiçá, descobrir que o que existe é apenas um espaço infinito de possibilidades de verdades. Terapia é descobrir que você faz parte de um todo, mas também é autônomo e tem as suas próprias escolhas. Fazer terapia é escolher para si mesmo desprender-se das grades de uma prisão, é poder se colocar sem se defender das mesmas e de se mudar para um local no qual lhe traz felicidade existencial. É escolher ser Feliz a ter razão! *Let

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