A maior responsabilidade
educacional dos pais é a de identificar os talentos e a vocação do seu filho.
Mas como podemos fazer isso?
* * *
Em primeiro lugar, o princípio
mais importante: não procure tornar o seu filho uma extensão dos seus projetos.
Não tente realizar os seus sonhos por meio do seu filho. Ele terá, ele já tem,
o seu próprio caminho, os seus próprios talentos, a sua vocação, os seus
sonhos. E lembre-se: o seu filho não está no mundo para fazer nada por você:
ele não lhe deve nada; tudo o que você faz por ele será retribuído aos seus
netos.
Em segundo lugar: preste atenção
no seu filho. Descubra aquilo que ele faz bem, o que ele realiza com pouco
esforço, os seus gostos, os seus interesses.
Não estou falando aqui de
matérias escolares. Na verdade, importa pouco se o seu filho "gosta de
História" ou "gosta de Biologia". Esses gostos são mediados pela
simpatia dos professores, pelas notas, por circunstâncias mil. Pense na vida
fora do contexto da escola.
O seu filho gosta de atividades
ao ar livre, ou prefere ambientes fechados? Ele gosta de realizar atividades em
grupo, ou prefere trabalhar sozinho? Qual é a capacidade atlética do seu corpo?
Como é a sua coordenação motora fina? Tem habilidades com brinquedos como Lego?
Curte mecanismos? Aprecia a companhia de animais? Que tipo de livros ele gosta
de ler? O que ele tem prazer de desenhar? Gosta de conversar com pessoas?
Prefere ouvir ou falar? Que assuntos ele gosta de pesquisar na internet? Gosta
de viajar? Toca algum instrumento musical? É mais interessado em experiências
ou em objetos? A lista de perguntas é infinita.
São
perguntas como essas que ajudam a conhecer melhor o seu filho - e,
conseqüentemente, a orientá-lo.
Para amadurecermos os nossos
sentimentos há um caminho e um atalho. O caminho é o da vida vivida: tivéssemos
como viver mil anos, ao fim reconheceríamos a necessidade de cozinhar em fogo
brando as nossas emoções.
E o atalho para o amadurecimento
sentimental é o da literatura. Ela nos permite viver mil vidas em uma - e
experimentar, e nomear, milhares de nuances emocionais. A literatura, a boa
literatura, amadurece com suavidade o nosso coração e põe as nossas mais violentas
inclinações sob o controle das palavras - e, por conseguinte, sob o controle do
pensamento.
* * *
De fato, ao lermos a boa
literatura aprendemos a reconhecer e a descrever as nuances e os detalhes do
mundo - dentro e fora de nós.
Quando aprendemos a nomear com
precisão o que vemos e sentimos, aprendemos a lidar melhor com a vida - pois
passamos a elaborar, num pensamento estruturado, as nossas fragilidades e as
nossas dores.
E aquilo que é reconhecido,
elaborado e estruturado no pensamento não se manifesta numa explosão, mas num
discurso lógico.
A estrutura da linguagem é a
estrutura do pensamento consciente, e a estrutura do pensamento consciente é a
estrutura da linguagem: somente quando somos capazes de desdobrar os nossos
sentimentos na linguagem tornamo-nos capazes de pensar sobre eles - e de agir
não como os brutos, mas como os humanos que somos. Em outras palavras: a
literatura ensina a nomear o invisível; assim nomeados, os nossos monstros
podem ser domados.
A literatura humaniza e amadurece
os corações imaturos. Por isso a literatura é a melhor política contra a
violência - que é o resultado do transbordamento emocional numa personalidade
cujas emoções permaneceram infantis.
* * *
Todavia, isso tudo é
incompreensível a quem não vive a vida da cultura - o que infelizmente é o caso
da maior parte dos nossos políticos, gestores escolares e professores, a quem o
papel civilizatório da literatura é somente uma idéia bonita para ser citada e
esquecida.
Prof. Dr. Gustavo Bertoche
Filósofo. Escritor. Musicista.
Mestre e Doutor em Filosofia. Educador. Filósofo Clínico. Em 2019 o Conselho e
a Direção da Casa da Filosofia Clínica lhe concedeu o título de “Doutor
Honoris Causa”, por reconhecimento ao seu trabalho.
Teresópolis/RJ
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