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Saber Poder*


Foucault diz que há um "Saber Poder", que é o saber que tem o poder de dar diagnósticos de valor em função daquele que tem o saber contra aquele que não tem o saber. A partir daí se desenha uma engenharia social baseada em um suposto saber que é efetivo poder, autorizado, é claro pelas instituições e, obviamente, defendido por elas. 

Mas há também muito Poder para um Saber: a psiquiatria. Ela está em todos os âmbitos de nossas vidas, crianças e adultos. Em exércitos, hospitais, empresas e, claro, em escolas. Esse saber tem muito poder (além do Saber Poder) e acaba por definir a sanidade mental daqueles que estão em sua órbita. 

A primeira coisa que as escolas deveriam fazer é cortar esse Poder desse Saber pela raiz e não permitir que desse Saber se marque, principalmente crianças, de forma tão covarde e embrutecedora. Como o Poder desse saber já se espalhou pela sociedade em geral, não apenas pseudo-médicos (os psiquiatras), mas coordenadoras de escolas, supervisoras e até professoras, já admitem a linguagem desse Saber e a usam, inadvertidamente, para olhar e construir sua imagem dos alunos. 

Os professores, através de uma inércia mental e embebidos pelo Poder desse Saber dentro das instituições escolares, hoje, são os primeiros a fazerem um "diagnóstico". São tão culpados quanto os detentores desse Saber em medicalizar e colocar as crianças em marginalização de si mesmas.

Tem a história de um menino que ia para o campo para fazer arapucas e pagar alguns passarinhos, Quando conseguia pegar um, antes de soltá-lo novamente, pintava ele com várias tintas. Colorido em sua plumagem, o menino o soltava e ele voltava alegre e rápido para o seu bando. o menino ficava observando o que acontecia com os pássaros pintados quando eles chegavam perto de seu bando novamente.

Durante um instante os pássaros do bando ficavam confusos. O pássaro pintado voava de um lado para o outro tentando entrar no bando, mas não conseguia. O bando, no começo, não deixava que ele entrasse junto deles, voando para longe do pássaro pintado, mas logo em seguida, com a insistência do pássaro pintado em tentar voltar ao bando, era empurrado por alguns para fora e o colocavam cada vez mais longe dos outros. 

Com a insistência de voltar ao bando, um pássaro atrás do outro começava o atacar violentamente até que o pássaro pintado não resistia e caía ao chão. Isso acontecia todas as vezes que o menino conseguia pegar um pássaro e o pintava antes de soltá-lo novamente. Quando ele corria para ver o pássaro pintado caído, via o sangue que escorria de suas penas e seu corpo todo mutilado pelas ferozes bicadas dos pássaros de seu bando.

Thomas Szasz, em seu livro onde conta essa história - A fabricação da Loucura - diz que os psiquiatras tiram a cor de seus pacientes e esta é a maior estratégia de discriminação, invalidação da singularidade e fabricação de doentes que necessitem de suas assistências. E a sociedade aceita e avaliza uma barbaridade dessas e com a ajuda das instituições escolares e seus professores.

*Fernando Fontoura
Filósofo. Mestrando em Filosofia. Trabalha na Fundação Tênis. Estudante na Casa da Filosofia Clínica.
Porto Alegre/RS 

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