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Fragmentos filosóficos delirantes XCXXVIII* Itinerário A que horas sai o trem para a saudade? Quero um lugar já nos primeiros bancos para chegar mais depressa ao que perdi, voltar aos sonhos da minha mocidade quando não tinha estes cabelos brancos e não pensava em sofrer o que sofri. Quero um lugar no trem que está partindo e que sai desta estação rumo ao passado em cima de infindáveis e invisíveis trilhos, onde quem hoje chora vai sorrindo, quem dorme para sempre está acordado e quem já é até avô não tinha filhos. Quero um lugar no trem antes que parta e eu não tenha outro modo de rever tanta coisa que ainda guardo na lembrança: uma foto amarelada, um lenço, a carta, o perfume que nunca mais pude esquecer e o lugar onde ficou minha esperança. Por favor, dê-me logo essa passagem, pois já escuto o sinal e até o apito que avisa a todos que é hora da partida. Eu não posso perder essa viagem, talvez a última que faço, ansioso e aflito, em
Fragmentos filosóficos delirantes XCXXVII* Almas perfumadas* Tem gente que tem cheiro de passarinho quando canta. De sol quando acorda. De flor quando ri. Ao lado delas, a gente se sente no balanço de uma rede que dança gostoso numa tarde grande, sem relógio e sem agenda. Ao lado delas, a gente se sente comendo pipoca na praça. Lambuzando o queixo de sorvete. Melando os dedos com algodão doce da cor mais doce que tem pra escolher. O tempo é outro. E a vida fica com a cara que ela tem de verdade, mas que a gente desaprende de ver. Tem gente que tem cheiro de colo de Deus. De banho de mar quando a água é quente e o céu é azul. Ao lado delas, a gente sabe que os anjos existem e que alguns são invisíveis. Ao lado delas, a gente se sente chegando em casa e trocando o salto pelo chinelo. Sonhando a maior tolice do mundo com o gozo de quem não liga pra isso. Ao lado delas,pode ser abril, mas parece manhã de Natal do tempo em que a gente acordava e encontrava o presente do Papai Noel.
Rotas polares* “E percebo que não importa onde eu esteja, seja em um quartinho repleto de ideias ou nesse universo infinito de estrelas e montanhas, tudo está na minha mente. Não há necessidade de solidão. Por isso, ame a vida como ela é e não forme ideias preconcebidas de espécie alguma em sua mente" (Jack Kerouac) Na vida, às vezes, é preciso traçar caminhos que nos levem de um ponto a outro por rotas aparentemente mais longas e difíceis. São percursos instáveis, que se delineiam quase que como atalhos e que podem inadvertidamente invadir territórios desconhecidos, demonstrando ser amigáveis ou não. Na verdade, dificilmente há como prever o que quer que seja, ainda que exista busca. Mesmo acontecimentos próximos, presumíveis e consequentes são passíveis de mudanças na rota, de instabilidades temporais e de revezes de humor. Já as possibilidades são absolutamente infinitas e a vida, traiçoeiramente inconsequente. Então ocorre que as linhas temporais se sobrepõem a cada í
O Limite que Liberta* Livre é quem aprende a viver com sabedoria e maturidade diante das escolhas que a vida apresenta. Vivemos em uma sociedade que convida-nos ao pleno exercício da liberdade. Contudo, a vida exige que aprendamos a ser livres em meio a outros que conosco trilham caminhos singulares que se encontram nos plurais existenciais de nossas experiências humanas, sociais e culturais. Em busca de uma liberdade fantasiosa muitas atrocidades têm sido cometidas em nosso meio. Ser livre está longe de fazer o que se quer sem pensar nas consequências. A liberdade verdadeira nasce do profundo e sincero desejo de ser ponte e não abismo que aprisiona e fecha possibilidades de uma vida plena e feliz. Tudo aquilo que escraviza o ser humano torna-se prisão. Liberdade sem limites é uma triste maneira de estar preso sem saber. Muitos estão presos na liberdade que buscaram para si mesmos. Tornaram-se escravos de uma liberdade perigosa. Vivem sem limites pela vida. A minha liberdade term
Divagações filosóficas descontinuadas* À percepção aristotélica é predominante a visão. Sua Metafísica a confirma. Mas, o verdadeiro para Platão nem está no que vemos. Nós só vemos a cópia. O original está nas Ideias. Husserl resolve ir às coisas mesmas. Heidegger aparece e diz que a questão fundamental ficou no esquecimento. Mas, a questão só tem valor enquanto questão. O erro não foi esquecer a questão, foi achar que a solucionaram. É mesmo? Tomás de Aquino pensa que resolve: Deus é o Ser, ato puro. Um verdadeiro cristão aristotélico. E o que diriam os (neo)platônicos? Agostinho que o diga. Nessa briga surge um alemão de sobrenome Lovejoy e diz que a história da filosofia não passa de notas de rodapé de Platão e Aristóteles. Será que é isso mesmo? Bom mesmo é Nietzsche, que resolve fazer uma filosofia à marteladas. Kierkegaard vai angustiar-se diante do que a filosofia não abarca, a fé. Ele diz que é necessário um salto qualitativ
Floripa* Querido leitor, que você esteja bem. Hoje vamos refletir sobre a nossa capital, exatamente sobre o nome de Florianópolis. Como você, ouvinte atento, deve lembrar, recentemente falei, em um artigo intitulado “Entre a Montanha e o Mar”, a minha relação com a água, com o mar. Naquela oportunidade escrevi que só fui conhecer o oceano quando tinha oito anos, antes disso, ficava imaginando como seria o mar. Também falei da minha relação com a orla marítima, com a água salgada, com as ondas, os ventos, os pássaros. Falei sobre o balneário Rincão e sobre as praias de Florianópolis. Lembro-me que deixei subentendido que muita coisa me fisgava em Floripa, e as praias era uma delas, e de uma importância decisiva. Contudo, algo jamais gostei da nossa capital, se é que você me entende: não gosto e assumo, não gosto do nome. Florianópolis. Como sabemos, seu nome é da junção de duas palavras: pólis, que significa cidade, e Floriano, que vem de Floriano Peixoto, primeiro presidente da
Fragmentos filosóficos delirantes XCXXVI* Jogos de sombras Sempre que me procuro não me encontro em mim, pois há pedaços do meu ser que andam dispersos nas sombras do jardim, nos silêncios da noite, nas músicas do mar, e sinto os olhos, sob as pálpebras, imersos nesta serena unção crepuscular que lhes prolonga o trágico tresnoite da vigília sem fim, abro meu coração, como um jardim, e desfolho a corola dos meus versos, faz-me lembrar a alma que esteve em mim, e que, um dia, perdi e vivo a procurar nos silêncios da noite, nas sombras do jardim, na música do mar... *Hermes Fontes 1888-1930

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