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Os buracos do espelho*

o buraco do espelho está fechado agora eu tenho que ficar aqui com um olho aberto, outro acordado no lado de lá onde eu caí pro lado de cá não tem acesso mesmo que me chamem pelo nome mesmo que admitam meu regresso toda vez que eu vou a porta some a janela some na parede a palavra de água se dissolve na palavra sede, a boca cede antes de falar, e não se ouve já tentei dormir a noite inteira quatro, cinco, seis da madrugada vou ficar ali nessa cadeira uma orelha alerta, outra ligada o buraco do espelho está fechado agora eu tenho que ficar agora fui pelo abandono abandonado aqui dentro do lado de fora *Arnaldo Antunes

Residência*

Para que partir se meu lugar contém todos os lugares? O que está longe não existe e em todo lugar é a mesma dor. Inútil partir, viajar, desesperar... Toda geografia é interior. *Hildeberto Barbosa Filho

A palavra mundo*

"As palavras são instrumentos de atos úteis, de modo que nomear o real é cobri-lo, velá-lo com familiaridades. (...) Para rasgar os véus e trocar a quietude opaca do saber pelo espanto do não-saber é preciso um 'holocausto das palavras'."                                   Jean-Paul Sartre Uma poética se anuncia num esboço de captura às múltiplas verdades. Nesse horizonte nem sempre coerente, a pessoa encontra um chão para integrar-se e experienciar suas possibilidades existenciais.   Ao ser a visão de mundo inseparável da subjetividade que a oferece, as formas da expressividade tentam obter o maior ângulo possível. Nela o teor dos termos agendados denuncia até onde se pode chegar. Um pouco antes dos movimentos de rebeldia, a linguagem, em vias de se ultrapassar, costuma emitir dissonâncias. Uma dessas características é o excesso de equívocidades discursivas, as quais, nem sempre se traduzem ao dicionário conhecido. O sentido de ser sem sentido surge como af

Descartes e a Filosofia Clínica*

Descartes foi um filósofo francês da modernidade. Segundo os estudos de historiadores da filosofia, foi ele quem inaugurou esse período. Mas que tem isso a ver com a Filosofia Clínica que é totalmente contemporânea? Um dos métodos estabelecidos por Lúcio Packter para a clínica propriamente dita é a epoké cética por parte do Filósofo Clínico. A suspensão dos juízos (epoké) é o que garante a subjetividade da construção de mundo do Partilhante e o que possibilita uma clínica bem sucedida. Descartes se vale desse método para encontrar sua primeira verdade indubitável: penso, logo existo. Na Filosofia, chamamos o método cartesiano de “dúvida hiperbólica”, porque ele duvida de TODO o conhecimento por ele adquirido durante toda sua vida. Em Clínica, não duvidamos do conhecimento por nós adquirido. Pelo contrário, temos que tê-los sempre em nosso auxílio. Porém, nos utilizamos da suspensão dos nossos juízos para entendermos a Representação (Schopenhauer) dos nossos Partilhantes. É a p

Quem é o cara?*

A motivação primeira de quem faz um curso ou oficina de criação textual é muito simples: o intuito é o de averiguar a real qualidade dos escritos que talvez há muito tempo o nosso iniciante venha fazendo em segredo e com certa vergonha, como se cagara, para lembrar a metáfora de João Cabral de Melo Neto. Esse ímpeto é mais poderoso do que, por exemplo, ampliar os conhecimentos sobre a arte da poesia. Enfim, a maioria quer saber se têm jeito pra coisa. Se o que escreve presta ou não. Infelizmente, não há resposta cabal para essa angústia. Primeiro porque, como afirma W. H. Auden, o percurso textual do verdadeiro artista denuncia um progressivo senso de dúvida. Isto é, quanto mais experiência ele adquire mais incerto o nosso herói se sente com relação à qualidade e ao alcance do seu trabalho. Mesmo a palavra do “ministrante” (expressão terrível), não será inteiramente de confiança.  Muitos autores consagrados falharam na avaliação de sujeitos que iniciavam suas carreiras

Não deixe sua menina ir embora*

Os amores são diferentes e são necessários, mas escolher viver só, com a sua companhia, é um direito seu. Viver só, sem o amor de um homem, não faz parte dos seus planos de vida? Não tem nada de errado nisto, nascemos homem e mulher côncavo e convexo para formarmos par. Ajusta-se aqui, recorta-se ali e um dia encaixamos. Acontece frequentemente. Muitas mulheres depositam na relação com um homem, toda a sua perspectiva de felicidade. – O outro deve me fazer feliz. – Acontece com os homens também, aliás, até muito mais com eles, entretanto, a capacidade deles em disfarçar melhor esta necessidade é algo de se tirar o chapéu. Cuidar da própria vida pode ser um bom caminho para a convivência. Acredito de verdade que é aí que os casais erram. Um quer cuidar da vida do outro e nenhum quer se cuidar para o outro e assim manter o encantamento. No sexo, onde de verdade o amor se manifesta, onde a expressão do desejo confirma a vontade de permanecer ao lado da pessoa amada indepe

Conversar*

Em um poema leio: conversar é divino. Porém os deuses não falam: fazem, desfazem mundos enquanto falam os homens. Os deuses, sem palavras, jogam jogos terríveis. O espírito desce e desata as línguas porém não pronuncia palavras: diz fogo. A linguagem, pelo deus incandescida, é uma profecia de chamas e um colapso de sílabas calcinadas: cinzas sem sentido. A palavra no homem é filha da morte. Falamos porque somos mortais: as palavras não são signos, são anos. Ao dizer o que dizem os nomes que dizemos dizem tempo: nos dizem, somos nomes do tempo. Conversar é humano. *Octávio Paz

Poéticas do existir*

Bate o silenciar Quietude da vastidão Gravidez do espirito Bate o recolhimento Quietude criativa Gravidez da alma Grávida quietude bate Talvez a espera do porvir Efêmera fresta no limite A fim de parir o indizível E, encontrar o amoral Nas entrelinhas do existir! *Rosângela Rossi Psicoterapeuta, Escritora, Filósofa Clínica Juiz de Fora/MG

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