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A palavra*

   Tanto que tenho falado, tanto que tenho escrito - como não imaginar que, sem querer, feri alguém? Às vezes sinto, numa pessoa que acabo de conhecer, uma hostilidade surda, ou uma reticência de mágoas. Imprudente ofício é este, de viver em voz alta.    Às vezes, também a gente tem o consolo de saber que alguma coisa que se disse por acaso ajudou alguém a se reconciliar consigo mesmo ou com a sua vida de cada dia; a sonhar um pouco, a sentir uma vontade de fazer alguma coisa boa.    Agora sei que outro dia eu disse uma palvra que fez bem a alguém. Nunca saberei que palavra foi; deve ter sido alguma frase espontânea e distraída que eu disse com naturalidade porque senti no momento - e depois esqueci.    Alguma coisa que eu disse distraído - talvez palavras de algum poeta antigo - foi despertar melodias esquecidas dentro da alma de alguém. Foi como se a gente soubesse que de repente, num reino muito distante, uma princesa muito triste tivesse sorrido. E isso fizesse bem ao co

Cartas a um jovem poeta * (Primeira carta)

Prezadíssimo Senhor, Sua carta alcançou-me apenas há poucos dias. Quero agradecer-lhe a grande e amável confiança. Pouco mais posso fazer. Não posso entrar em considerações acerca da feição de seus versos, pois sou alheio a toda e qualquer intenção crítica. Não há nada menos apropriado para tocar numa obra de arte do que palavras de crítica, que sempre resultam em mal-entendidos mais ou menos felizes. As coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizíveis quanto se nos pretenderia fazer crer; a maior parte dos acontecimentos é inexprimível e ocorre num espaço em que nenhuma palavra nunca pisou. Menos suscetíveis de expressão do que qualquer outra coisa são as obras de arte, — seres misteriosos cuja vida perdura, ao lado da nossa, efêmera. Depois de feito este reparo, dir-lhe-ei ainda que seus versos não possuem feição própria, somente acenos discretos e velados de personalidade. É o que sinto com a maior clareza no último poema Minha alma. Aí, algo de peculiar procura

Imaginação*

Querido leitor, que você esteja bem. Nosso tema de hoje é imaginação. O filósofo Blaise Pascal em sua obra mais conhecida, "Pensamentos", discutia a imaginação, com poucos fundamentos, apenas preocupado em anotar pensamentos sobre o tema. E olha que sua especialidade era matemática. Na visão de Pascal, a imaginação é a força mais poderosa nos seres humanos e também uma de nossas principais fontes de equívoco. Para o matemático, a imaginação pode ultrapassar nossa razão, pois é ela que nos leva a confiar nas pessoas, apesar do que nos diz a razão. Um exemplo: médicos e advogados vestem-se com distinção, tendemos a confiar neles. Ao contrário, dedicamos menos atenção a quem parece desmazelado, mesmo que suas palavras sejam sensatas e seus exemplos coerentes. Lembrando que isso era assim para Pascal. Ele continua: Embora a imaginação leve a falsidade, por vezes também conduz a verdade, pois se fosse apenas falsa, então poderíamos usá-la como fonte de certeza ao acei

Estudo 175*

Estar com o rio não é molhar-se na água. Nem ser leito. É ser a água e o leito. E o mar. E ser as nuvens do céu. Nosso destino é o que somos. Somos o destino – o olho d’água e a foz. Somos a foz e o ruído das águas se encontrando. E as nuvens do céu e o homem sentado numa pedra. E a pedra. *Antonio Brasileiro

Nas sombras da minha escuridão*

Sou quem eu sou Mas não sou quem gostaria de ser. Penso ser quem eu deveria ser (À maneira dos outros) Penso ser aquilo que sou E penso querer ser somente eu Sem a influencia de ninguém Ser quem somente sou Mas quem sou eu? Mas o que sou eu? Esgueiro-me por entre os escombros De um eu que pensa ser Quem deveria ser, Quem gostaria de ser, Quem sou E não me encontro em nenhum desses Quem sou eu? O que sou eu? Palavras, pensamentos e atitudes Não me definem Por entre os escombros de mim Procuro uma luz pra entender quem sou Procuro um lugar além-mim Uma palavra de definição e fechamento Percebo que sou modificações Penso que sou devires Fervilho elucubrações sobre-mim Em mim me encontro e me perco. Mas quem eu sou? Mas o que eu sou? Não sou definição Não sou fechamento Não sou devir Não sou modificações Ou será que sou tudo isso? Quem eu sou? O que eu sou? *Vinicius Fontes Filósofo Clínico Rio de Janeiro/

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