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Momentos possíveis do imaginário*

“O esquecimento do esquecimento não dá oportunidade apenas às encenações realistas, ele é essencial a qualquer metafísica: ao esforçar-se por apresentar a própria coisa, fundamento último, Deus, ser, a metafísica esquece-se de que a presença é ausente. Ter tudo presente é a bulimia do pensamento ocidental.” Jean-François Lyotard (Moralidades pós-modernas, p. 155-156, Papirus, 1996.) A escritura é o fortalecimento e também poder ser o que se esquece durante o passar do tempo.  O tempo aqui como conceito diante do que é visto, do que tem diante dos olhos. Tanto faz olharmos por através da vidraça ou mesmo diante de um real supostamente dito, dentro do mesmo espaço, porque o imaginário criado nisso tudo é como o fogo que une o todo. O que estava separado, o que estava distante acaba se unindo nas chamas.  A escritura tem um pouco disso, mas se diferencia por sua unidade de ser, por sua fonte longe do imortalizado, é como Lyotard falou de Beckett que fez a “assinatura

A palavra indefinida*

Existe uma infinidade de expressividades alojadas nalgum ponto entre a percepção de uma quase ideia e sua adequada manifestação. Esse discurso persegue a ordem  de um caos. Nele os subterfúgios se destacam das evidências objetivadas pela definição. Sua tez de promessa extraordinária permanece em aberto.  É possível ser o convívio com as lógicas da desrazão, a fonte de onde jorra a matéria-prima em busca de descrever-se. Numa atitude de estado nascente, sua inexatidão aproxima a inteligibilidade do absurdo discursivo. Sua noção descortina-se nas páginas da originalidade por vir.   Um relato assim, longe de instituir fechamentos, refere uma atitude de não-propriedade em relação ao conhecimento. Seu discurso inacabado aguarda preenchimentos. As clausuras recém desconstruídas, acolhem as dúvidas, abrigam especulações irrefletidas. Num traço assim descrito, a ressonância dos deslocamentos pessoais permanece em aberto, parecem querer dizer sobre a presença de uma ausência.  Ne

Poética*

Estou farto do lirismo comedido Do lirismo bem comportado Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente protocolo e manifestações de apreço ao sr. diretor. Estou farto do lirismo que para e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo. Abaixo os puristas Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis Estou farto do lirismo namorador Político Raquítico Sifilítico De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo De resto não é lirismo Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc Quero antes o lirismo dos loucos O lirismo dos bêbedos O lirismo difícil e pungente dos bêbedos O lirismo dos clowns de Shakespeare — Não quero mais saber do lirismo que não é libertação. *Manuel Bandeira

Por falar de amor*

Se o amor me leva  a adentrar a casa, por um lado a dor me leva a buscar a chave para sair.                   Jesus Aguiar                   Vânia Dantas O amor é algo que talvez não possa ser definido, mas que tentamos sentir ou demonstrar por meio de linguagens e gestos. São abraços, palavras, sonhos, flores e presentes que veem em nome dele e que são direcionados para a pessoa em que encontramos o destino, a fim de entregar esse tesouro tão nobre que existe dentro de nós. Amor que anestesia o tempo, rompe com a cronologia, instaura um tempo eterno onde parece só existir o início, pois ele não termina jamais. Emoções congeladas num sorriso; é o vencedor que serve. O pensamento e a alma se unem e neste espaço sagrado criado e só a pessoa amada nele permanece. O amor exige uma exclusividade, talvez a nominemos de fidelidade. Queremos um vínculo, uma entrega total entre o amado e a amada. As estrelas são assim

Fragmentos poéticos, filosóficos*

 Em Março de 79 “Farto de todos aqueles que com palavras fazem palavras mas onde não há uma linguagem; Dirigi-me para a ilha coberta de neve. A veação não conhece palavras. As páginas em branco dispersam-se em todas as direcções. Eu dei com vestígios de cascos de corça na neve. Linguagem, mas nenhuma palavra.” Graus Negativos “Encontramo-nos numa festa que não gosta de nós. Ao fim, a festa deixa cair a sua máscara e mostra-se tal como é: uma estação de manobras. Colossos gelados estão de pé, sobre os carris, no nevoeiro. Um pedaço de giz riscou as portas da carruagem. Não se devia mencionar, mas aqui há muita violência reprimida. Por isso os pormenores são tão pesados. E é tão difícil vermos o outro, que também existe: um raio de sol reflectido que se movimenta por cima do muro da casa, que desliza através do bosque ignorado, de rostos cintilantes; uma frase bíblica que nunca se escreveu: 'vem até mim, pois eu sou contraditório como tu'. Ama

Feira do Livro*

Anuncia-se no horizonte a Feira do Livro de POA, junto com a primavera e os ipês floridos. Preparar uma Feira do Livro é uma obra quixotesca. E é bom que se ande de mãos dadas com Dom Quixote. Anda-se, assim, em harmonia com moinhos de vento. Ou de montanhas de livros. E livros bons e fantásticos. Circula-se entre a Feira do Livro de Caxias do Sul e de Porto Alegre. Os olhos da gente voltando-se para duas direções. Um olho direciona-se em obras e autores criteriosamente selecionados. O outro olho, antecipadamente, no contentamento dos leitores ao encontrar os livros que procuram. Supera-se, assim, qualquer cansaço físico pela alegria da alma. E da alma do leitor. Tranquiliza-me esta preparação para a Feira. Sei que noventa por cento dos livreiros focam-se num frenesi desesperado em busca dos best-sellers. Uma saturação da mesmice. Uma repetição do mesmo. Estive ontem numa distribuidora e recolhia o que os outros deixavam para trás. Acho que não conheciam. Ou não

Pensar é transgredir*

Não lembro em que momento percebi que viver deveria ser uma permanente reinvenção de nós mesmos - para não morrermos soterrados na poeira da banalidade embora pareça que ainda estamos vivos. Mas compreendi, num lampejo: então é isso, então é assim. Apesar dos medos, convém não ser demais fútil nem demais acomodada. Algumas vezes é preciso pegar o touro pelos chifres, mergulhar para depois ver o que acontece: porque a vida não tem de ser sorvida como uma taça que se esvazia, mas como o jarro que se renova a cada gole bebido.  Para reinventar-se é preciso pensar: isso aprendi muito cedo. Apalpar, no nevoeiro de quem somos, algo que pareça uma essência: isso, mais ou menos, sou eu. Isso é o que eu queria ser, acredito ser, quero me tornar ou já fui. Muita inquietação por baixo das águas do cotidiano. Mais cômodo seria ficar com o travesseiro sobre a cabeça e adotar o lema reconfortante: "Parar pra pensar, nem pensar!"  O problema é que quando menos se espera e

Futebol: uma paixão pelo ridículo!*

Quando vejo um estádio de futebol com as pessoas apontando e denunciando um torcedor como aquele que atirou o tênis para dentro do campo para assim livrarem o time que trocem de sofrer uma punição, lembro que é exatamente assim que agem as pessoas dentro de uma ditadura onde o poder superior incute na mente do povo que devem agir como polícia de seus próprios vizinhos e familiares.  Na Alemanha nazista chegou um momento em que filhos denunciavam os pais, filhas acusavam mães e vizinhos deduravam qualquer vizinho que estivesse agindo contra seu país, isso na visão manipulada pelo poder superior. Não estou nem discutindo o mérito da ação de quem atirou o tênis para dentro do gramado, mas de uma massa que acaba por aceitar e ser subserviente de um poder maior, seja a CBF ou o tribunal que julga e decide as questões esportivas. Outra questão é a da punição contra o jogador que falou mal ou desabafou em campo contra a entidade máxima do futebol. O problema é que contra entidade

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