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Procura-se um amigo*

Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.. Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar. Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena das pessoa tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não pud

A plenitude do agora*

Pode não haver sol, porém, sempre há beleza. A natureza, em sua sabedoria, contrabalança luz e sombra. Pode não haver sorrisos, porém, sempre há silêncios. A natureza, em sua dialética, promove a pausa harmónica. Pode não haver antes e depois, porém, sempre há agora. A natureza, em sua plenitude, nos presenteia com o existir. Isto nos basta! *Rosângela Rossi Psicoterapeuta Analítica. Filósofa Clínica. Escritora. Juiz de Fora/MG

Poética*

Estou farto do lirismo comedido. Do lirismo bem comportado. Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente, protocolo e manifestações de apreço ao Sr. Diretor. Estou farto do lirismo que para e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo. Abaixo os puristas. Todas as palavras, sobretudo os barbarismos universais. Todas as construções sobre tudo as sintaxes de exceção. Todos os ritmos, sobretudo os inumeráveis.  Estou farto do lirismo namorador. Político, Raquítico, Sifilítico. De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo. De resto não é lirismo. Será contabilidade tabela de co-senos, secretário  do amante exemplar, com cem modelos de cartas  e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.  Quero antes o lirismo dos loucos. O lirismo dos bêbados. O lirismo difícil e pungente dos bêbedos. O lirismo dos clowns de Shakespeare - Não quero mais saber do lirismo que não é libertação. *Manuel Bandeira

O sentido do sentimento*

“Mas só sabemos que sentimos uma emoção quando percebemos que essa emoção é sentida como algo que está acontecendo em nosso organismo.” António R. Damásio “For I never dreamt that you'd be loving…” Duke Ellington (Ler ouvindo "In a sentimental mood" com Duke Ellington and John Coltrane) Já escrevi esse texto antes alguns anos atrás, acho que lá por 2002. Deve estar em algum lugar da memória, guardado na nuvem, está dentro de um romance que comecei, parei, no “Editor de romances”.  Acordei no meio da noite, zonzo, como se tivesse sido atropelado por algo, pelo sonho, pela música que tocava distante... Olhei para os lados, me certifiquei que estava na minha casa, não reconheci a cama, mas o velho teto mofo estava bem acima de mim. Acendi a luz. Fui até a peça que tinha o som, onde costumava tocar meus discos, era John Coltrane e Duke Ellington ao fundo. Não tinha nada ligado, voltei ao quarto, a velha TV ligada, um filme na madrugada que estava toca

Sou um evadido*

Sou um evadido. Logo que nasci Fecharam-me em mim, Ah, mas eu fugi. Se a gente se cansa Do mesmo lugar, Do mesmo ser Por que não se cansar? Minha alma procura-me Mas eu ando a monte, Oxalá que ela Nunca me encontre. Ser um é cadeia, Ser eu é não ser. Viverei fugindo Mas vivo a valer. *Fernando Pessoa

Paixão*

Sim! É muito possível um casal se manter apaixonado até o ultimo dia de suas vidas juntos e, consta da lista de fatores que contribuem para esta proeza, o nosso antigo amigo respeito que gera admiração, autoestima, segurança e, enfim, tesão em viver junto, em cuidar do bem-estar do outro em querer proporcionar prazer. Uma relação apaixonada não precisa ser somente aquela coroada de sexo a qualquer custo. É certo que sexo com a pessoa que a gente ama é bom de qualquer jeito e a qualquer hora, contudo um casal que presta atenção no que é importante para cada um, consegue manter viva a luz do encantamento em todos os momentos da vida que dividem. A química do amor é mantida com doses permanentes de cuidados. É bom lembrar que um casal é constituído de duas pessoas e que a vontade de manter para sempre o ar de namoro, depende dos dois. Buscar encantar um ao outro com paciência, silêncio quando necessário, carinhos inesperados e cuidados com a aparência, ajuda muito. Encantar

Permanência*

Não peçam aos poetas um caminho. O poeta não sabe nada de geografia celestial. Anda aos encontrões da realidade sem acertar o tempo com o espaço. Os relógios e as fronteiras não tem tradução na sua língua. Falta-lhe o amor da convenção em que nas outras as palavras fingem de certezas. O poeta lê apenas os sinais da terra. Seus passos cobrem apenas distâncias de amor e de presença. Sabe apenas inúteis palavras de consolo e mágoa pelo inútil. Conhece apenas do tempo o já perdido; do amor a câmara escura sem revelações; do espaço o silêncio de um vôo pairando em toda a parte. Cego entre as veredas obscuras é ninguém e nada sabe - morto redivivo. Tudo é simples para quem adia sempre o momento de olhar de frente a ameaça de quanto não tem resposta. Tudo é nada para quem descreu de si e do mundo e de olhos cegos vai dizendo: Não há o que não entendo. *Adolfo Casais Monteiro

Poéticas do tempo*

Lembro-me do inverno, quando criança. E dos dias prolongados de chuva. Não era preciso ficar triste. O céu chorava por nós... Muitas vezes não tínhamos o que fazer. Quando não havia o que fazer, fazia-se o melhor. Tínhamos um potreiro. Com alguns pinheiros. Lembro-me do meu pai. Vestia-se de anjo ou de pássaro. Imitava uma gralha azul. Recolhia pinhões. E enfiava no chão. Pinheiros levam uma vida inteira para ficar adultos. Isto não importava para ele. Importava a alegria dos que viessem depois. O potreiro continua lá. Nas terras do meu pai. Não é mais o mesmo potreiro. Existe lá, agora, uma floresta de pinheiros. Quando vou lá descanso na grama junto com meu pai. Para lembrar-me que ainda sou criança, chupo frutas e cuspo as sementes na terra. Sei que elas germinarão. É que eu tenho mais afeição pelas coisas minúsculas, que pelas maiúsculas. Lembro-me de amores... Sinto-me menor do que sou com tudo isto. Quebro com facilidade. Contudo, não me jogo fora. Co

A felicidade*

O que abraça a uma mulher é Adão. A mulher é Eva. Tudo acontece por primeira vez. Hei visto uma coisa branca no céu. Dizem-me que é a lua,  mas  que posso fazer com uma palavra e com uma mitologia. As árvores me dão um pouco de medo. São tão formosas. Os tranquilos animais se aproximam para que eu lhes diga seu  nome. Os livros da biblioteca não têm letras. Quando os abro surgem. Ao folhear o atlas projeto a forma de Sumatra. O que ascende um fósforo no escuro está inventando o fogo. No espelho há outro que está à espreita. O que olha o mar vê à Inglaterra. O que profere um verso de Liliencron há entrado na batalha. Hei sonhado a Cartago e as legiões que desolaram a Cartago. Hei sonhado a espada e a balança. Louvado seja o amor no qual não há possuidor nem possuída,  mas os dois se entregam. Louvado seja o pesadelo, que nos revela que podemos criar o  inferno. O que descende a um rio descende ao Ganges. O que olha um relógio de areia vê a di

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