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Dá-me a tua mão*

Dá-me a tua mão: Vou agora te contar como entrei no inexpressivo que sempre foi a minha busca cega e secreta.   De como entrei naquilo que existe entre o número um e o número dois, de como vi a linha de mistério e fogo, e que é linha sub-reptícia.   Entre duas notas de música existe uma nota, entre dois fatos existe um fato, entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam existe um intervalo de espaço, existe um sentir que é entre o sentir - nos interstícios da matéria primordial está a linha de mistério e fogo que é a respiração do mundo, e a respiração contínua do mundo é aquilo que ouvimos e chamamos de silêncio. *Clarice Lispector

Sobre a arte de redigir silêncios*

Uma fenomenologia da espera descreve seu vocabulário pela quimera a se mostrar esconderijo. A palavra refugiada na estrutura do silêncio parece dizer mais. Seu instante fugaz aponta entrelinhas de um esboço. Seu viés multiplica-se nos enredos da expressão absurda. A suspeita de uma razão vigiada persegue eventos pelos contornos da ficção. Talvez essa novidade, como um deslize da ideia não declarada, se mostre nas páginas em branco. Esses episódios se sucedem em pretextos para um sentido à margem do discurso principal.  Os manuscritos do inesperado podem ser anúncio ao relatar invisibilidades. Ao interrogar esses indizíveis esconderijos das perolas imperfeitas, um olhar escuta a geografia dos exílios. Os espaços desacreditados se protegem no retiro das fórmulas secretas. Os rituais da linguagem singular apreciam a redescoberta desses espaços calados. Ânimos de diversidade na interseção entre a promessa de se mostrar e os rastros.    A interrogação que se desdobra para a

Não-coisa*

O que o poeta quer dizer no discurso não cabe e se o diz é pra saber o que ainda não sabe. Uma fruta uma flor um odor que relume... Como dizer o sabor, seu clarão seu perfume? Como enfim traduzir na lógica do ouvido o que na coisa é coisa e que não tem sentido? A linguagem dispõe de conceitos, de nomes mas o gosto da fruta só o sabes se a comes só o sabes no corpo o sabor que assimilas e que na boca é festa de saliva e papilas invadindo-te inteiro tal do mar o marulho e que a fala submerge e reduz a um barulho, um tumulto de vozes de gozos, de espasmos, vertiginoso e pleno como são os orgasmos No entanto, o poeta desafia o impossível e tenta no poema dizer o indizível: subverte a sintaxe implode a fala, ousa incutir na linguagem densidade de coisa sem permitir, porém, que perca a transparência já que a coisa ë fechada à humana consciência. O que o poeta faz mais do que mencioná-la

Viagens e viajantes*

Quando inicia a madrugada Os grilos cantam a lua que brilha Sinto os anjos brincando estrelas Talvez as nuvens passem trazendo sonhos Recolho sob a coberta a espreita Será que ele vem? Os pirilampos anunciam a chegada de Hermes Dioniso também se apresenta Meu coração solta de alegria Bendigo a imaginação e os uivos dos lobos Minha mulher selvagem se apresenta Mistério e fantasia real Porque a lua brilha Eu me dissolvo no pó cósmico, pois, Viajante intergaláctica eu sou! *Rosângela Rossi Psicoterapeuta. Escritora. Poeta. Filósofa Clínica Juiz de Fora/MG

Receita pra lavar palavra suja*

É que eu queria dizer uma coisa que eu não posso sair dizendo por aí Na verdade é um segredo que eu guardo É uma revelação que não posso sair dizendo por aí Que eu tenho medo que as pessoas se desequilibrem de si Que elas caiam delas mesmas quando eu disser Eu descobri que a palavra não sabe o que diz A palavra delira A palavra diz qualquer coisa A verdade é que a palavra nela mesmo em si própria Não diz nada Quem diz é o acordo estabelecido entre quem fala e quem ouve Quando existe acordo, existe comunicação Quando esse acordo se quebra, ninguém diz mais nada Mesmo usando as mesmas palavras A palavra é uma roupa que a gente veste (…) *Viviane Mosé

Os Opostos*

Os Opostos se atraem, dizem Ele lutava com os opostos Dia a dia Dentro de si. Para ele não havia vida na linha do equador. Havia, sim, vida acima ou abaixo do equador. Viver na linha mediana, para ele, era não viver. Definhava sob o ar condicionado. Fugia do meio termo como o capeta foge da cruz. O morno nem o esquentava, nem tampouco, o esfriava. O morno cheirava a mofo. Se negava a jogar no meio de campo. Fechava as balizas de um lado, ou estufava as redes do outro. Na loteria da vida não marcava a coluna do meio. Mas existiam empates. Quem o conhecia sabia. Seu "oito" era um grãozinho de areia. Um fiozinho de fumaça que sumia. Uma miragem de nevoeiro que sumia. Um pedacinho de nuvem quebrada que sumia num buraco negro. Diminuto, virava diminutivo e se transformava em Mínimo Múltiplo Comum. Virava nada, nada fazia e repousava nas espumas das águas do nada. Mas não se entregava Há que inventar a vida a cada dia. Seu "oitenta" era mil. Um milh

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