Uma das orientações para a prática em consultório, ao conduzir sessões em Filosofia Clínica, é a retomada da narrativa com que o partilhante encerrou a clínica anterior.
Na edição de outono desta
revista, o artigo Preço de banana e o que a filosofia clínica tem a ver com
isso encerrou com um assunto retomado aqui, começando com um roteirizar,
submodo que Caruzo esclarece: " O roteirizar é utilizado pelo filósofo
para ensinar algo, provocar reforço ou desconstrução, modificar uma verdade
pessoal etc. E isso é feito ao narrar uma história (...)." (Caruzo, 2021,
p.156 ).
O homem entrou pelo portão,
caminhou até a varanda, sentou-se e mostrou um pedaço de papel. Já era
aguardado, pois havia sido encaminhado pela diretora. "Como eu te pago
isso?", pergunta ouvida, após a tradução de um pequeno parágrafo, feita
rapidamente, sem consulta ao dicionário.
Num átimo, após recobrar-se do
susto, a resposta imediata: em dinheiro. Não se tratava de um texto sofisticado
que demandasse pesquisa. Talvez o Google fizesse com alguma precisão. Mas a
questão não era essa. Havia ali algo: um assunto último.
A resposta que deveria ter sido
dada:
- Se fosse feita soma das
despesas com livros, cursos, tempo dedicado aos estudos, passagens para congressos,
o senhor não teria dinheiro para pagar "isso"! Dinheiro remunera, não
paga! Tem seu devido valor no modelo de sociedade atual. E a formação de um
profissional implica em investimentos financeiros, entre outros.
Em Filosofia Clínica, "O
processo de Formação é exigente, reivindica uma disposição de alma incomum, que
envolve leituras, pesquisa, clínica pessoal, primeiros atendimentos, grupos de
estudo, supervisão e outros detalhes." (Strassburger, 2021, p.128). Essas
indicações requerem dedicação, competência, conduta ética e formação
continuada.
Lúcio Packter pede ao filósofo
clínico que tenha "empatia para com a pessoa que estará à sua frente.
Respeito por seus pré-juízos. Serenidade para mensurar o que surgir através da
interseção.
Sinceridade para dizer sim ou não
a quem o procura, e ser muito, muito humano.” (Paulo, 2001, p. 11).
No perfil desejável para ser um
filósofo clínico, um detalhe mereceria ser acrescido: gostar de gente! E isso
não tem preço.
Referências:
Caruzo, Miguel Angelo. Introdução
à Filosofia Clínica. Petrópolis, RJ: Vozes, 2021.
Paulo, Margarida Nichele. Compêndio
de Filosofia Clínica. Porto Alegre/RS: Imprensa Livre,
2001.
Strassburger, Hélio. Filosofia
clínica: anotações e reflexões de um consultório. Porto Alegre/RS. Sulina,
2021.
*Jandira Ramiro de Souza
**Texto publicado na edição de inverno/2022 da Revista da Casa.
Filósofa Clínica
Niterói/RJ
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