Em 2013, o neurocientista Thomas Insel criticou o lançamento do DSM-5. Ele escreveu que "diferentemente das definições de isquemia cardíaca, linfoma e Aids, os diagnósticos do DSM são baseados em conjuntos de sintomas clínicos, e não em medidas objetivas de laboratório." Aqui lemos um eco da crítica à instituição psiquiátrica feita por Thomas Szasz no artigo "The myth of mental illness" (de 1961!). https://www.technologyreview.com/.../nimh-will-drop.../
Só que em vez de criticar
por inteiro a idéia de doença mental, como fizera Szasz, Thomas Insel
simplesmente decidiu estabelecer critérios científicos para diagnosticar esse
tipo de "doença".
Insel passou anos
trabalhando com neurociência e com a genética das desordens mentais. Foram 20
bilhões de dólares que, segundo o próprio, só serviram pra financiar muitos
artigos científicos inúteis.
https://www.wired.com/.../star-neuroscientist-tom-insel.../
Agora ele se volta para
as questões comportamentais. Mas existe uma petição de princípio aí: ele
tentará, por exemplo, buscar os sinais da bipolaridade em pessoas
diagnosticadas como bipolares. Fará um estudo de como 600 indivíduos usam o
celular para descobrir padrões ligados à depressão, psicose e mania. Descobrirá
e quantificará comportamentos que serão registrados como "doenças",
exatamente no sentido do DSM, mas agora com suporte matemático
"objetivo".
* * *
Como a ausência da
cultura filosófica cria lacunas na pesquisa científica! Insel busca descobrir o
que já está dado como princípio. A partir da suposição de que essas
"doenças" realmente existem, estabelecerá, de modo
"científico", os comportamentos a elas associados.
A tese de Thomas Szazs,
diferentemente da de Thomas Insel, é a de que existem "doenças", ou
seja, alterações na estrutura fisiológica que causam sofrimento e algum tipo de
incapacidade, mas não existem "doenças mentais". Aquilo a que
chamamos de "doenças mentais" ou são comportamentos causados por
mudanças na estrutura fisiológica, e neste caso são doenças "comuns",
ou não têm causas orgânicas rastreáveis e não podem ser identificadas por
testes clínicos, mas somente pelo preenchimento de uma lista de comportamentos.
Neste caso, Szasz afirma que não se tratam de "doenças", mas de
problemas de natureza psicossocial. Em suma: as "doenças mentais" ou
são doenças comuns, fisiológicas, ou não são doenças; de qualquer modo, não há
"doenças mentais" propriamente ditas.
* * *
Mas qual é a relevância
dessa posição?
Ora, se não há
"doenças mentais", o DSM não faz sentido: ele não descreve
"doenças", mas classifica comportamentos. O problema, então, não é,
como diz Thomas Insel, a baixa cientificidade do DSM: o problema é a sua
própria existência, de acordo com a qual não existe nenhum ser humano
mentalmente são - isto é, todos os seres humanos somos doentes mentais, e portanto
precisamos todos nos submeter à instituição médica e à indústria farmacêutica.
* * *
Simão Bacamarte também
descobriu que todos os habitantes de Itaguaí eram loucos. Todavia, ao contrário
dos psiquiatras da American Psychiatric Association, ao menos teve o bom-senso
para perceber que havia algo de errado com esse julgamento e que, no fim das
contas, quem estava com as idéias perturbadas não eram os outros, mas ele
mesmo.
*Prof. Dr. Gustavo
Bertoche
Filósofo. Escritor.
Musicista. Filósofo Clínico
Em 2019 Gustavo Bertoche
recebeu o título de “Doutor Honoris Causa”, concedido pelo Conselho da
Casa da Filosofia Clínica. Um dos raros profissionais da área, a ter o doutoramento
pelos três critérios reconhecidos: Tradição, Acadêmico, Honoris Causa.
Comentários
Postar um comentário