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Anotações e percepções de um Filósofo Clínico*

 

Notas sobre a brevidade das reflexões   

Algo presente em minhas reflexões, sobretudo as relacionadas ao meu trabalho como terapeuta, são as proposições apresentadas como possibilidades. O consultório e a formação em filosofia clínica me levaram a considerar as singularidades. Ou seja, se considero a pessoa por si, não a comparo a ninguém, não faço estatísticas, não crio parâmetros normativos, não faço filtros do que há em comum nas pessoas. 

Considero a complexa individualidade de cada pessoa. Isso me inviabiliza generalizações. As universalizações são possíveis em teses filosóficas, sociológicas, teológicas etc. mas tropeçam quando se deparam com as exceções. E o consultório é o espaço onde as exceções são as regras (o paradoxo também é comum no consultório). 

Quando afirmo algo nessas reflexões, cabe destacar a brevidade das palavras impedindo as nuances, os desdobramentos, os aprofundamentos e uma série de respostas necessárias às objeções. É o risco de se expor em considerações breves. Mas, a possível equivocidade gerada pelas sínteses expostas é o preço pago por divulgar uma área tão profunda, complexa e nova no universo das terapias.

O que significa dizer que o filósofo clínico é um aprendiz?

Embora seja apresentado em cursos que variam entre 18 e 24 meses, o conteúdo da filosofia clínica preencheria tranquilamente uma formação de quatro anos com a carga horária de uma graduação. Ainda assim, continuaria sendo um curso com conteúdos introdutórios.

Um filósofo clínico aprende a teoria, realiza a formação da prática, mas precisará continuar seus estudos teóricos e práticos por toda a vida. A alma humana não se esgota em uma formação.

O certificado que habilita à clínica é uma autorização e não a comprovação de que não há nada mais a ser aprendido. A filosofia clínica é um aprendizado para a vida toda. Hoje, dez anos depois de ter iniciado minha formação, me vejo tão iniciante quanto meus alunos que estão há alguns meses na formação.

Meus professores são os filósofos clínicos com os quais converso, os artigos e livros que leio, os áudios e vídeos que acompanho, e os partilhantes que atendo semanalmente. Ser filósofo clínico é permanecer aprendiz, é se ver como iniciante, é saber que não sabe tudo, é cultivar o espanto e a admiração ante o novo que diariamente se apresenta no relato da vida de cada partilhante.

Qual o motivo de alguém procurar um filósofo clínico?

O que leva uma pessoa a procurar os préstimos de um filósofo clínico? Não há uma questão específica. São casos que variam de acordo com cada pessoa. Afinal, falamos em singularidade. Mesmo que surjam queixas similares, com sintomas com diversos aspectos em comum, isso não torna o trabalho do terapeuta mais fácil.

Diferente das investigações das ciências empíricas que encontram resultados padronizados por excluir variáveis e controlar ambientes, o trabalho do filósofo clínico leva em conta as variáveis e as circunstâncias particulares de cada partilhante. Por isso, a identificação dos aspectos a serem trabalhados e os procedimentos clínicos são únicos.

A experiência do filósofo não serve para orientar padrões; ela permite a ampliação da capacidade de lidar com cada caso apresentado no consultório. O partilhante é um todo estrutural, um universo de complexidades incomparável a ser compreendido e auxiliado.

* Prof. Dr. Miguel Angelo Caruzo   

Filósofo. Escritor. Filósofo Clínico.

Teresópolis/RJ

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