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Pensar sem Mitos*

“Quando dois filósofos não concordam em relação ao ser, eles não concordam em nada.”                                                   Étienne Gilson Havia muito tempo que eu só pensava, passei alguns anos, dias em pensamentos, totalmente absorto. Era uma disputa entre o que eu estava a pensar e o que externamente me cercava. Acordo sob a égide do panegírico dos homens engravatados que discursavam, mostravam uma tecnologia do século XX, depois disso pensei: realmente, o mundo é feito apenas de convicções. Voltei aos pensamentos. No outro dia o líder maior das minorias e maiorias desanda a desvendar a realidade vazia e a perplexidade em que as pessoas se encontram. Mais uma vez sem convicções, me tornei mais cético do que já sou. Não a ponto de cometer uma asneira existencial e me agarrar a uma promessa prometeica. Tenho respeito ao mito, mas àqueles que foram forjados, e ninguém com mais de cinco anos leva a sério esses mitos. Errado. Todos se agarram a mitos.  Ao

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"A palavra poética jamais é completamente deste mundo: sempre nos leva mais além, a outras terras, a outros céus, a outras verdades" "(...) o poema é linguagem - e linguagem antes de ser submetida à mutilação da prosa ou da conversação -, mas é também mais alguma coisa. E esse algo mais é inexplicável pela linguagem, embora só possa ser alcançado poe ela. Nascido da palavra, o poema desemboca em algo que a transpassa" "O poema nos faz recordar o que esquecemos: o que somos realmente" "(...) o sentido não só é o fundamento da linguagem como também de toda apreensão da realidade. Nossa experiência da pluralidade e da ambiguidade do real parece que se redime no sentido"   "Toda revolução é a consagração de um sacrilégio, que se converte em um novo princípio sagrado" "Condenado a viver no subsolo da história, a solidão define o poeta moderno. Embora nenhum decreto o obrigue a deixar sua terra, é um desterrado&q

Texto e contexto*

                                                          Ao se pensar sobre a essência de uma escritura, logo surgem especulações sobre suas fontes de inspiração. Quais os subsídios utilizados pela autoria para transgredir ideias na forma escrita. Num esboço assim, a cada página é possível entrever um novo viés de novidade. Tendo como ponto de partida uma vivência singular, algo mais se diz em vocabulário próprio.     Um texto narrativo indica suas origens através das palavras escolhidas para se contar. O discurso existencial se descreve ao preencher suas lacunas. Ao conhecer a luz do dia, essas ideias e sensações podem se emancipar de um jeito inédito.   É possível se reinventar na convivência com uma obra. Sua retórica, ao integrar texto e contexto apresenta rotas, até então desmerecidas a singularidade. As idas e vindas intelectivas do leitor ao personagem e do personagem ao leitor, agregam saber, sabor e cor. Ao concluir-se uma redação ou uma leitura, pela contínua m

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Linguagem viva, como acentuam os linguistas, é aquela na qual você ainda pode cometer erros. Linguagem perfeita é a que está morta. Nem se modifica, nem hesita. Por sorte, estas eram regras muito frágeis, foram esquecidas imediatamente. Nenhum manual de gramática cinematográfica - estética, prática ou comercial - sobrevive a um período superior a dez anos. Tudo se desmonta constantemente e volta a se reagrupar" "(...) por ter muito para ver, nossos olhos, com frequência, não conseguem ver mais coisa alguma" "Mas uma linguagem em permanente autodescoberta, uma linguagem que está sempre criando formas e se enriquecendo, obviamente não pode apenas reciclar velhos ingredientes. Logo degeneraria em palavras ocas. É preciso inovar, ousar - e, de vez em quando, fracassar - para narrar e expor" "De fato, todo o filme parece dizer que não há diferença, que a vida imaginária é tão real quanto a outra, e que a vida que tomamos por real pode a q

As manchas verdes na janela*

A saudade só persiste como dor enquanto continua apegada num passado que ainda não passou. E isso se dá somente quando o autoconhecimento ainda não é suficiente para transbordar-se em poesia que irriga e faz tudo que fora vivido florescer em gratidão para deixar a paz reinar. Pois, é das memórias que nos causam prazer e alegrias que obtemos mesmo sem querer a inspiração necessária para prosseguir liberto de tudo que já não faz mais sentido agarra-se agora. E quanto as memórias que nos provocam dor e lágrimas, nos resta galgar a capacidade salvadora de extrair as lições mais prioritárias e transformadoras ao ponto de transcender. É por isso que quando alçamos voo a determinado patamar de sabedoria ou de poesia numa intencional redundância de sentir e significar, qualquer saudade se converte em gratidão e paz. Portanto, cada vez mais só me resta agradecer pela poesia que a feliz contaminação que as manchas verdes oriundas literalmente das janelas da sua alma me causaram u

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) uma influência anônima, assim como o sangue dos antepassados se movimenta em nós constantemente, misturando-se ao nosso e formando com ele a coisa única e irrepetível que somos em cada curva de nossa vida" "Não sabia estar em transição ? Desejava algo melhor do que transformar-se ? Se algum ato seu for doentio, lembre-se de que a doença é o meio de que o organismo se serve para se libertar de um corpo estranho" "Se lhe puder dizer alguma coisa mais, é isto: não pense que aquele que o procura consolar leva uma vida descansada no meio das palavras simples e discretas que às vezes fazem bem ao senhor. A vida dele comporta muito sacrifício e muita tristeza e fica-lhes muito atrás. Mas se assim não fosse, ele nunca podia ter encontrado aquelas palavras" "Estamos colocados no meio da vida como no elemento que mais nos convém. Também, em consequência de uma adaptação milenar, tornamo-nos tão parecidos com ela que, graças a um feliz mi

O tempo que resta*

"O tempo que resta" é um dos últimos filmes a que assisti. É francês e mostra os meses finais de vida de um jovem fotógrafo que descobre sofrer de um tipo de câncer já em processo de metástase. O filme é sensível, triste e tem aquele tempo e tom especialíssimos que só os europeus sabem imprimir nas produções cinematográficas. Em alguma medida, "O tempo que resta" lembra outro filme: "O poder além da vida". Este fala também de um jovem que precisa encarar a morte ou a vida depois de sofrer um acidente de trânsito enquanto se prepara para participar das olimpíadas. Com os movimentos limitados, se vê obrigado a deixar para trás a vida de noitadas, mulheres e bebidas, contando com o auxílio e inspiração de um senhor que o jovem apelida de "Sócrates". A diferença das duas obras é que, no primeiro caso, o personagem principal desiste de viver e, no segundo, a tragédia serve como divisor de águas na trajetória do jovem, convidando-o a adotar

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"A loucura, conforme sugeri há algum tempo, é fabricada, num certo sentido, por alienistas. Em outras palavras, a Psiquiatria produz a esquizofrenia ou, mais precisamente, os psiquiatras criam esquizofrênicos" "(...) na medida em que é concedido aos psiquiatras o privilégio, em sociedades livres, de tratar pessoas adultas contra a vontade delas - um privilégio de que outros médicos e profissionais não gozam -, a psiquiatria torna-se assimilada a jurisprudência e ao direito carcerário; em suma, torna-se uma disciplina para controlar os desviantes, não para curar doenças" "Toda a história da psiquiatria se baseia aparentemente na premissa - inexplícita, mas por isso mesmo ainda mais importante - de que os psiquiatras têm o direito a 'diagnosticar' qualquer pessoa, em qualquer parte, viva ou morta, quer ela goste ou não" "(...) a esquizofrenia é um símbolo sagrado da psiquiatria, da mesma forma que, digamos, o Cristo crucificado

As palavras*

Ainda sou das antigas. Gosto das palavras. Símbolos e sinais Que nos relacionam, Que trazem imagens, Tocam corpo e alma, Fazem pensar e refletir, Questionar e duvidar. Verbos em ação, Subjetivos a me expressar, Adjetivos conferindo atributos, Toda gramática da vida Expressa em letrinhas. Magia criada pela inteligência, Tributo dos humanos. Que me fazem entender O que não vejo. Só desprezo a tagarelice, Que prende a alma, Cria ilusões, Acende vaidades, Traz dor e sofrimento. Cansei dos excessos, Das palavras inúteis, Do blá, blá, blá Repetitivo. Admiro a profundidade A criatividade Os livros densos Os poemas intensos Os cânones Talvez pelos cabelos brancos Ou pelo correr do tempo Em seu valor Amo as palavras Em rima ou verso Tudo tão diverso. Pode me faltar tudo, Menos os livros, Eternos amigos. Dra. Rosângela Rossi Psicoterapeuta. Escritora. Filósofa Clínica. Livre Pensadora. Juiz de Fora/MG

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"A rua continua, matando substantivos, transformando a significação dos termos, impondo aos dicionários as palavras que inventa, criando o calão que é o patrimônio clássico dos léxicos futuros" "Para compreender a psicologia da rua não basta gozar-lhe as delícias como se goza o calor do sol e o lirismo do luar. É preciso ter espírito vagabundo, cheio de curiosidades malsãs e os nervos com um perpétuo desejo incompreensível, é preciso ser aquele que chamamos flâneur e praticar o mais interessante dos esportes - a arte de flanar" "(...) Eu fui um pouco esse tipo complexo, e, talvez, por isso, cada rua é para mim um ser vivo e imóvel" "Balzac dizia que as ruas de Paris nos dão impressões humanas. São assim as ruas de todas as cidades, com vida e destinos iguais aos do homem" "(...) são ruas da proximidade do mar, ruas viajadas, com a visão de outros horizontes" "Se as ruas são entes vivos, as ruas pensam, têm

Dançar e Punir*

“E assim, à medida que o sol se punha, uma visão foi se impondo aos meus olhos.”                                        Antonin Artaud Nas redes sociais as pessoas que gostam de legitimar a cultura do óbvio, da constatação, da quantidade, essas, emburreceram de vez. Jogam suas frustrações na falta de tempo para compreender a vida, naquilo que ela possa nos apresentar de novo, de desconhecido. A vida é o tempo de todas as coisas, o mais simples é o extremo, destruidor ou construtivo: arrasar ou adorar. É mais fácil primeiro adorar, depois, em outro sentido, destruir o pensamento contrário; sem se dar conta, pode-se estar cavando o próprio erro: o fim é o limite para o pensamento duro. O que vem a ser o pensamento duro, bruto? É o pensar dentro da construção cultural dual, em que existem os polos do bem e do mal. Essa religiosidade racional é parte da vida, é claro, não serei eu a refutar todas as manifestações pelo simples fato de pensar diferente. Eis a reflexão d

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Cada indivíduo é o centro do universo, e é apenas porque o universo está repleto de tais centros que ele é precioso. Este é o sentido da palavra 'homem': cada indivíduo é um centro ao lado de incontáveis outros que são tão centros do universo quanto ele próprio" "(...) os nomes das poucas pessoas que nos possibilitaram respirar, e sem as quais jamais teríamos suportado todos os outros dias (...)" "Um ser humano possui muitas facetas, milhares delas, e só por algum tempo pode viver como se não as possuísse" "(...) comecei a compreender que cada indivíduo tem uma configuração linguística própria, que o distingue de todos os demais. Compreendi que embora os homens falem uns com os outros, não se entendem; que suas palavras são golpes que ricocheteiam nas palavras dos outros; que não existe ilusão maior do que a opinião de que a língua é um meio de comunicação entre seres humanos" "Possuímos uma acentuada tendência

A palavra inesperada*

        Uma suspeita de imensidão aprecia os deslizes da palavra refugiada na palavra. Ponto de fuga em subterfúgios de especulação, ao exibir renúncias de ser previsível, amplia o mundo das possibilidades.      A admissão compreensiva desses desvãos se oferece no acolhimento de um talvez. Uma de suas características é o descompromisso em sustentar verdades a qualquer preço. Seu estado de espírito sobressaltado qualifica deslocamentos pela arquitetura subjetiva de um mundo fatiado. Aqui o vislumbre repentino das pequenas coisas permite o acesso as zonas de exclusão.     Por esses episódios a perder de vista, um teor extemporâneo pode desconstruir as fronteiras conhecidas. Seu saber ameaça os fundamentos conhecidos daquilo que se tinha definitivo. Nesse viés de aparência deslocada anuncia novos horizontes, esparrama indícios de originalidade para se fazer ciência.   O discurso imprevisível onde ela se esboça, procura inseri-la num contexto de notícia compartilhável. Mesm

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Chladenius chega a uma conclusão interessantíssima: constata que compreender plenamente um autor não é o mesmo que compreender inteiramente um discurso ou um escrito. A norma para a compreensão de um livro não seria, de modo algum, a intenção do autor. Pois, como os homens não são capazes de abranger tudo com sua visão, assim suas palavras, discursos e escritos podem significar algo que eles próprios não tiveram a intenção de dizer ou de escrever (...) quando se busca compreender seus escritos pode-se chegar a pensar, e com razão, em coisas que aos autores não ocorreria" "O verdadeiro problema da compreensão aparece quando, no esforço de compreender um conteúdo, coloca-se a pergunta reflexiva de como o outro chegou à sua opinião. Pois é evidente que um questionamento como este anuncia uma forma de alteridade bem diferente, e significa, em último caso, a renúncia a um sentido comum" "O artista livre cria sem receber encomenda. Parece que o que o ca

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