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Quem é o Filósofo Clínico e quem é o Partilhante na concepção de Hélio Strassburger***

  Parte II (...) Contudo, Hélio Strassburger, ícone de grande significação na construção da Filosofia Clínica como atividade terapêutica e não apenas como filosofia teórica, nos apresenta em suas obras reflexões mais profundas e complexas, de quem é o filósofo clínico e quem é o partilhante, advindas da prática clínica e que veremos a seguir.   Vejamos o que nos diz Strassburger em sua obra Filosofia Clínica: a arte de encantar a vida, (2005):   “...Ser terapeuta é uma arte, através da qual podem se desenvolver raridades e talentos, os quais, impregnados de humanidade, vão constituindo a pessoa em seu melhor lugar no mundo. As crises e transformações pessoais por onde passa, na direção de um viver melhor, lhe confere uma legitimidade singular, não no sentido de ter respostas prontas, mas de exercitar a plasticidade na direção do outro, experienciando em sua alma, aspectos e desdobramentos, cujos reflexos podemos alcançar pela via da relação clínica, através da compreensão e do

Reflexões de um Filósofo Clínico*

O que significa dizer que o filósofo clínico é um aprendiz? Embora seja apresentado em cursos que variam entre 18 e 24 meses, o conteúdo da filosofia clínica preencheria tranquilamente uma formação de quatro anos com a carga horária de uma graduação. Ainda assim, continuaria sendo um curso com conteúdos introdutórios. Um filósofo clínico aprende a teoria, realiza a formação da prática, mas precisará continuar seus estudos teóricos e práticos por toda a vida. A alma humana não se esgota em uma formação. O certificado que habilita à clínica é uma autorização e não a comprovação de que não há nada mais a ser aprendido. A filosofia clínica é um aprendizado para a vida toda. Hoje, dez anos depois de ter iniciado minha formação, me vejo tão iniciante quanto meus alunos que estão há alguns meses na formação. Meus professores são os filósofos clínicos com os quais converso, os artigos e livros que leio, os áudios e vídeos que acompanho, e os partilhantes que atendo semanalmente. Ser fi

Consulta Pré-operatória e Filosofia Clínica*

A medicina no Brasil ainda é muito mais curativa do que preventiva. Pacientes costumam procurar o médico quando estão doentes e não quando estão saudáveis visando prevenir alguma moléstia. A saúde para alguns, é considerada um valor, mas para a grande maioria, só é lembrada no momento em que foi perdida. Partindo desta premissa, pode-se sugerir que as pessoas procuram os médicos não por desejo e sim por necessidade. A necessidade da cura é o que leva um paciente a procurar ajuda na medicina curativa, classificando assim, teoricamente, a medicina em uma categoria de serviços não desejados e sim, necessários. Quem se submete a uma cirurgia, o faz por necessidade e não por um simples desejo. Poderíamos citar como exceção, cirurgias estéticas, porém mesmo nestas situações, o paciente submete-se à cirurgia por sentir que este procedimento é necessário para seu embelezamento, pois pode estar se sentindo “feio”, e quem sabe, em sua visão de mundo, até mesmo doente. A partir da necessida

As palavras e o horizonte existencial*

  Primeiranistas de graduação em Filosofia às vezes "refutam o perspectivismo" com o seguinte joguete lógico que remete a uma contradição: "Não há fatos - somente interpretações. Isto é um fato."   Ou, na notação da lógica proposicional, P^~P P, logo não-P.   Isto é: a afirmação de que não há fatos, mas só interpretações, conduz a uma contradição e, por conseguinte, não pode ser verdadeira. A refutação parece persuasiva, não?   * * *   O diabo é que as palavras não são planas. Há profundidades hermenêuticas variáveis em cada uma delas.   No caso que expus acima, a primeira palavra "fato" corresponde ao plano ôntico, enquanto a segunda corresponde ao plano ontológico. Uma coisa são os "fatos" ("não há fatos") que lemos em um jornal, que sabemos numa conversa, que usamos para tomar decisões na vida. Outra coisa, bem diferente, é uma afirmação metafísica universal a respeito do funcionamento da estrutura da realidade (&qu

O que é a filosofia clínica*

A Filosofia Clínica, em uma nova abordagem terapêutica, é a filosofia acadêmica adaptada à prática clínica, à terapia. Não trabalha com critérios médicos, com remédios ou com tipologias na construção de uma proposta terapêutica cujo objeto é buscar o bem-estar do ser humano.   O instrumental da Filosofia Clínica divide-se em três partes: os Exames Categoriais, a Estrutura de Pensamento e os Submodos. Nos Exames Categoriais, primeiro momento da clínica, através da historicidade, o filósofo clínico situa existencialmente a pessoa colhendo todas as informações de sua vida, desde as suas recordações mais remotas, até as informações de suas vivências mais atuais. O material colhido, na história da pessoa atendida – que em Filosofia Clínica é chamada de partilhante, justamente pela condição de ser alguém com quem o filósofo compartilha momentos da existência -, é a base para o desenvolvimento do processo terapêutico. A partir desses dados, num segundo momento, são verificados os tópicos

O relativismo subjetivo é universal em Filosofia Clínica?*

Quando falamos em relativismo a primeira impressão que podemos ter é pejorativa. Parece que quando “tudo” é relativo as certezas se perdem. Como achar algo que se perde? A Filosofia Clínica responde em uma palavra: singularidade. O se perder no relativismo subjetivo é um dos grandes achados para a Filosofia Clínica. Reconhecer que o intersubjetivo se compõe de subjetivos que não podem ser enquadrados em nenhum universal objetivador da subjetividade. Objetivar e universalizar a subjetividade se mostra uma tarefa impossível em Filosofia Clínica. Cada subjetividade ou traduzindo para termos filosóficos clínicos cada Estrutura de Pensamento (EP) não pode ser classificada em uma universalidade que tenta deixar o desigual igual, o paralelo em serial. O relativismo geral passa a ser uma singularidade que se mostra em universo. O universo da Estrutura de Pensamento que é única, singular, mas plural. Este universo, único e plural passa a conversar, se relacionar, se inter-relacionar consigo

Notas de um Filósofo Clínico*

  Em quais parâmetros o filósofo clínico me enquadra?*  O filósofo clínico não aconselha com teses filosóficas. Seu método foi construído a partir de diálogos com filósofos. Mas, com contínuo contato com pessoas. O método sistematizado da clínica filosófica é um caminho para compreender pessoas e as melhores maneiras de ajudá-las em suas questões. Por isso, não há fórmulas, lista de diagnósticos, modelo ideal a ser alcançado ou para servir de parâmetro normativo, muito menos regras para atingir um bem-estar. Ao ouvir a história de quem procurou seus cuidados, o filósofo clínico compreende o contexto (exames categoriais), o que constitui a pessoa (estrutura de pensamento) e os meios (submodos) que ela já possui para atuar existencialmente ou se será preciso apresentar novas possibilidades. Lidar com pessoas não é uma ciência exata nem uma adequação a uma proposição universal. Estamos no campo das aproximações, da sensibilidade, da percepção, da plasticidade.                         

De quantas mortes você já ressuscitou?*

A condição para mostrar a vida tal qual se apresenta, inclui a possibilidade de se reescrever, além do primeiro olhar, as páginas do velho diário. Um desses refúgios por onde se insinuam conteúdos desatualizados, também eles compondo essa realidade se reapresentando em múltiplas expressões. Seus apontamentos convidam a emancipar as contradições entre o que se diz e o que se faz. O convívio com esses desdobramentos existenciais auxilia a elucidar a representação por trás dos percursos da singularidade. Sua releitura descobre espaços, até então, desconsiderados. Muitas vezes, na inquietude de uma voz silenciada, se encontra algo mais, propício aos novos tempos. Sua redação está contida na palavra vivenciada, traduzindo fenômenos que estavam ali, como benção, estorvo, desassossego. Esses manuscritos da estrutura de pensamento instituem, na equivocidade dos paradoxos, a vida até então fora de foco. A interseção do sujeito com seus relatos pode ampliar o que já existia como promessa ou

A Filosofia Clínica para Não-Filósofos Clínicos***

O que é a Filosofia Clínica? A resposta geralmente adotada pelos filósofos clínicos é: “a Filosofia Clínica é a filosofia acadêmica aplicada à terapia”. Esta resposta é boa. E não é. É uma boa resposta porque é exatamente isso que a Filosofia Clínica faz: aplica a filosofia da tradição ocidental, a filosofia acadêmica, à terapia. Por outro lado, é uma resposta abrangente demais. Afinal, o conjunto da “filosofia acadêmica” tem uma quantidade muito grande de elementos, que podem ser tão diferentes entre si quanto podem ser diferentes variadas espécies de, digamos, frutas. Por essa razão, a afirmação de que “a Filosofia Clínica é a filosofia acadêmica aplicada à terapia” é inútil. Aos olhos do leigo – e mesmo de muitos estudiosos – a filosofia é um emaranhado de teorias contraditórias, quando não bizarras; parece que qualquer coisa pode ser filosofia, e que filosofia pode ser qualquer coisa. Mas isso não é verdade. A filosofia tem um fio condutor muito claro. Para explicar iss

Resenha crítica da obra: "Poéticas da Singularidade"*

STRASSBURGER, Hélio. “ Filosofia Clínica, poéticas da singularidade ”. Rio de Janeiro: e-papers, 2007. 116 p. O livro de Hélio Strassburger expõe suas experiências fazendo um relato singular da filosofia clínica por um terapeuta experiente e sensível. O autor percorre em vinte e seis pequenos textos os momentos fundamentais da relação clínico-partilhante e das singularidades desse processo, valendo-se do estilo poético. A filosofia clínica é apresentada como “escrita em reciprocidade de compartilhar (...) aquilo que, para muitas pessoas, é o mais sagrado, sua história de vida” (p. 7). Essa é sua forma de reconhecer que existir é coexistir. É sobre esta relação compartilhada que o autor descreve “uma fenomenologia do fazer clínico que esboça encantamentos indizíveis ao olhar de senso comum” (p. 8). Evidencia-se a sua convicção de que a atividade clínica não pode ser bem descrita com linguajar comum, só a poética alcança seus recantos mais escondidos. O propósito da clínica é promo

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