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Bom dia! Em pré-venda na Editora Sulina.

 

Subjuntivos*

Talvez esse imenso lugar nativo ficasse inexplorado, não fora o movimento desconcertante a acessar as inéditas regiões. Essa aptidão de estranhamento, tão desmerecida, aprecia desnudar o espaço novo diante do olhar, interseção limiar com as demais teias discursivas. Através do viés desconsiderado é possível apreender e dialogar com a pluralidade transgressora das fronteiras conhecidas. Ao fazer possível o impossível se pode vislumbrar a ótica selvagem, um pouco antes de ser cooptada pelo saber instituído.   A cogitação sobre a origem dessa matriz já contém, em si mesma, a multiplicidade de versões. As lógicas da incerteza elaboram seus vocabulários brincando com os vestígios da irrealidade. O devir instintivo ensaia relatividades ao querer mostrar paradoxos, alternâncias, dialetos para se entender ou sentir que a perfeição de toda imperfeição nem sempre vai ser explicável. Sua opinião escolhe desmerecer todo beco sem saída. Seu saber especulativo, recheado de incertezas, promove

O preço de escrever*

Este é o artigo número 200 deste blog. Nunca imaginei que manteria essa atividade por tanto tempo com tamanho entusiasmo e regularidade. Começou como uma brincadeira e foi ficando. Antes de qualquer coisa, quero agradecer aos leitores que me acompanharam, criticaram, aconselharam e, especialmente, tiveram paciência comigo na riqueza e na pobreza dos textos. Preciso de vocês, mas também devo confessar algo que talvez não gostem de saber. Escrever é o verdadeiro prazer, ser lido é uma satisfação complementar. Jamais tive obrigação alguma de produzir textos. Escrevo porque gosto, sinto prazer, relaxo, me forço a pensar, desligo do cotidiano e no final, quando nasce o texto, quase sempre, sou possuído por um sentimento de arrebatamento. Em cada argumento que produzo, me dou o luxo de viajar com as ideias para qualquer lugar. Posso também ser quem eu quiser e, se me der vontade, utilizar minha caneta como uma arma potente e terrível, criticando, polemizando, elogiando, detonando, fazendo

Prêmio Jacarandá - Editora do Ano! Parabéns ao Luis Antonio Gomes e o time Sulina! Há mais de 70 anos compartilhando inovação e cultura.

 

Filosofia Clínica e os Rótulos*

Os Papéis Existenciais são rótulos em Filosofia Clínica. Segundo Lúcio Packter, o tópico estrutural XXII – Papel Existencial diz respeito aos rótulos, aquilo que a pessoa utiliza como princípio de identificação, mas, em alguns casos, esta identificação pode ser uma roupagem.  Como podemos identificar um Papel Existencial ? Na historicidade da pessoa aparecem os Papéis Existenciais ou rótulos por nomeação direta, como: “eu sou filho”, “eu sou pai”, “eu sou terapeuta” e assim por diante. Esta pessoa está dando um parecer sobre uma roupagem existencial com a qual se apresenta em diferentes âmbitos da existência dela. A própria pessoa é quem confere nomes ao Papel Existencial. Ele é atribuído por ela mesma, muitas vezes, para cada circunstância de sua vida. Compete à própria pessoa assumir e ter isso para com ela como um Papel Existencial ou não. É possível um Papel Existencial fazer parte da pessoa, mas sendo atribuído de fora para dentro por outra pessoa, isso via agendamentos. P

Leituras clínicas*

  “O ponto de vista Partilhante, ao se deixar acessar pelos termos agendados, reivindica um leitor de raridades. O fenômeno terapia aproxima papéis existenciais da clínica com a arqueologia. Sua estética cuidadora, a descobrir e proteger inéditos, mescla saberes para acolher as linguagens da singularidade.”                                                                              Hélio Strassburger                                     O trecho citado está na obra “A palavra fora de si” do professor Hélio e especificamente no texto dedicado “As linguagens da terapia”. Aqui é essencial dar-se conta de que o veículo que nos faz percorrer caminhos dentro do espaço clínico é a linguagem, e nesse sentido, é papel do cuidador dar espaço de passagem e fornecer proteção às cenas que se revelam sessão após sessão, acolhendo o conteúdo. Durante esses 4 anos de clínica, atendi algumas mulheres (sim, hoje falarei delas). Sou grata pela confiança que depositam no processo clínico, sei dos meus

Fiz cinquenta anos, e agora?*

A medicina diz que começamos a envelhecer a partir dos 30 anos de idade. Comigo não foi bem assim. Comecei a envelhecer quando meu filho nasceu. Por coincidência tinha justamente trinta anos. Achava que como pai tinha responsabilidade financeira e gastava todos meus dias trabalhando para sustentar a família. Chegava em casa tarde da noite, acabado de tanto cansaço, mal conseguindo aproveitar o calor de um lar. Voltei a ficar jovem quando nasceu meu neto.    Brincamos juntos todas as manhãs na pracinha do bairro e me renovo todo dia.     Comecei a envelhecer quando me preocupei em esconder os primeiros fios de cabelo branco. Rejuvenesci quando deixei os grisalhos crescerem natural e desalinhadamente por cima das orelhas. Sentia-me um velho trabalhando sem prazer, amargurado, reclamando e só pensando no dia da minha aposentadoria. Depois de aposentado, virei criança. Esta conversa de envelhecer depois dos trinta começava a cair por terra. Pensava que depois de ficar viúvo, a vida não

A noção de mundo: uma breve contribuição a partir de Heidegger*

Quando, a partir da filosofia clínica, falamos sobre compreender o “mundo” do outro, tal afirmação pode soar como um termo equívoco. Trata-se do mundo enquanto representação de mundo, inspirada na noção de “homem como medida de todas as coisas”, de Protágoras de Abdera, atualizada em Arthur Schopenhauer ao afirmar que “o mundo é minha representação”. Isto é mostrado claramente nos antigos Cadernos utilizados na formação de filósofos clínicos, sobretudo na segunda metade dos anos de 1990. Mas, a fim de contribuir para o entendimento da noção de mundo do partilhante a qual o filósofo clínico busca acessar via recíproca de inversão ao longo das sessões, podemos recorrer ao pensamento de Martin Heidegger. O filósofo de Messkirch pautou toda sua vida a pensar a “questão do ser”. Uma noção de “ser” que, aliás, é diferente de seus predecessores dos últimos vinte e cinco séculos. Para Heidegger, todos os entes são precedidos pelo ser. Partindo de um vice-conceito – assumindo-o como sim

Anotações e Reflexões de um Filósofo Clínico*

Amigos, não basta saber ler para compreender um texto. Para absorvê-lo mais ou menos inteiramente, é preciso conhecer o campo de sentidos em que foi escrito.  Isto é: o domínio da língua não se esgota na leitura e na escrita proficiente. A língua é composta por muitas linguagens que se inscrevem em diferentes regiões hermenêuticas. Ao transitarmos por um texto escrito numa região hermenêutica desconhecida, encontramo-nos numa situação de analfabetismo simbólico; não o interpretamos corretamente porque desconhecemos os complexos nos quais os seus símbolos se relacionam. Estamos como que diante de um texto escrito noutra língua, uma língua ignorada. Todavia – e aí está a tragédia –, acreditamos compreender o lá está colocado, porque sabemos o significado ordinário daquelas palavras. O exercício intelectual mais difícil é o reconhecimento da própria ignorância: se somos capazes de ler todas as palavras de um texto, como podemos chegar à conclusão de que talvez não o compreendamos? E

Ler e escrever como terapia*

  Os caminhos para se chegar a uma melhor condição de bem-estar subjetivo são tão diversos quantos são os indivíduos. Para alguns, conversar semanalmente com o terapeuta é o melhor dos caminhos. Para outros, a alma sorri mesmo é com uma boa conversa jogada fora junto daqueles amigos sinceros que dizem coisas bonitas com a mesma naturalidade com que convidam a refletir sobre as falhas e fissuras no seu jeito de ser e existir. Tão bem faz, igualmente, para algumas pessoas, a prática da fé e da espiritualidade, ou da solidão momentânea, para ficar de encontro com seus próprios pensamentos, com seus próprios sentimentos.  A lista é infindável: brincar com os netinhos, tomar chimarrão na praça, paquerar ao pôr do sol, cozinhar para o amor da sua vida, cuidar de plantas e jardins… Tudo isso faz bem, gera prazer e satisfação em viver, para muitas pessoas. Para um sem número de sujeitos, porém, existe um método que historicamente se estabeleceu como charmoso para retratar das dores e alegria

A fundamentação, a contribuição e os equívocos*

A filosofia clínica é um método terapêutico. A inquietação que levou Lúcio Packter a sistematizá-la ocorreu diante de sua necessidade de auxiliar pessoas em suas dores, conflitos e demais demandas existenciais. O construto metodológico da clínica filosófica foi elaborado na medida em que auxiliava Packter a compreender as pessoas as quais atendia e a encontrar as melhores maneiras de ajudá-las. Desde então, não foi a teoria baseada em profundas reflexões sobre quem é o ser humano que fundamentava a prática; foi a prática – em diálogo contínuo com as teorias da tradição filosófica – que deu subsídios para a construção da abordagem posteriormente denominada filosofia clínica. Diante disso, há três aspectos a serem levados em conta quando se trata de pensar o âmbito teórico da filosofia clínica. O primeiro deles diz respeito a compreender os fundamentos dessa sistematização. Em seguida, consideramos os acréscimos posteriores com a finalidade de aprofundar o método. Por fim, cabe refleti

Resenha do livro de Miguel Angelo Caruzo, “Introdução à Filosofia Clínica”. Editora Vozes. 2021. Petrópolis/RJ.*

           As duzentas e duas páginas do livro Introdução à Filosofia Clínica do Professor Miguel Angelo Caruzo, publicado recentemente pela Editora Vozes de Petrópolis, RJ, desencadearam um processo de leituras que culminou em três momentos diversos de escrita, que justificam o título dado a cada seção desta “resenha”.           Primeira leitura : De trás pra frente, salteada e incompleta           Sem ordem linear, a leitura começou do posfácio, veio para a conclusão, depois considerações iniciais, apresentação.   Folheando as páginas, sem compromisso, chamaram a atenção os títulos: Planejando a clínica , Analise o caminho da realização , Lidando com ruínas . O primeiro destaque a ser feito: títulos sugestivos, originais e atraentes ao leitor, já conhecedor, ou não, do método terapêutico da filosofia clínica, tema central da obra. Foi, então, que veio o primeiro momento de escrita. Julgando ser a resenha, escrevi, numa espécie de brain storm :            Inicio esta resenha pe

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