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Subjuntivos*

                                                       Talvez esse imenso lugar nativo ficasse inexplorado, não fora o movimento desconcertante a acessar as inéditas regiões. Essa aptidão de estranhamento, tão desmerecida, aprecia desnudar o espaço novo diante do olhar, interseção limiar com as demais teias discursivas. Através do viés desconsiderado é possível apreender e dialogar com a pluralidade transgressora das fronteiras conhecidas. Ao fazer possível o impossível se pode vislumbrar a ótica selvagem, um pouco antes de ser cooptada pelo saber instituído.   A cogitação sobre a origem dessa matriz já contém, em si mesma, a multiplicidade de versões. As lógicas da incerteza elaboram seus vocabulários brincando com os vestígios da irrealidade. O devir instintivo ensaia relatividades ao querer mostrar paradoxos, alternâncias, dialetos para se entender ou sentir que a perfeição de toda imperfeição nem sempre vai ser explicável.   Sua opinião escolhe de

OBSESSÃO DO MAR OCEANO*

Vou andando feliz pelas ruas sem nome... Que vento bom sopra do Mar Oceano! Meu amor eu nem sei como se chama, Nem sei se é muito longe o Mar Oceano... Mas há vasos cobertos de conchinhas Sobre as mesas... e moças na janelas Com brincos e pulseiras de coral... Búzios calçando portas... caravelas Sonhando imóveis sobre velhos pianos... Nisto, Na vitrina do bric o teu sorriso, Antínous, E eu me lembrei do pobre imperador Adriano, De su'alma perdida e vaga na neblina... Mas como sopra o vento sobre o Mar Oceano! Se eu morresse amanhã, só deixaria, só, Uma caixa de música Uma bússola Um mapa figurado Uns poemas cheios de beleza única De estarem inconclusos... Mas como sopra o vento nestas ruas de outono! E eu nem sei, eu nem sei como te chamas... Mas nos encontramos sobre o Mar Oceano, Quando eu também já não tiver mais nome. *Mario Quintana 

Filosofia: eu quero uma pra viver!*

“Por que Filosofia?” Foi, é e sempre será a pergunta cabal para um filósofo ou pretendente a esse cargo que os alunos ou pessoas em geral irão fazer para nós filósofos e aspirantes. A resposta é complicada dada a complexidade do problema envolto nessa pequena e simples interrogação. Mas aqui tento responder à minha maneira, com uma analogia que exporei mais adiante e que, no momento, cabe apenas concepção (de um professor que realmente conseguiu, com a frase adiante, resumir um sentimento): “não é você que escolhe a Filosofia e sim ela que te escolhe” – professor James de Filosofia Geral Problemas Metafísicos IV da UERJ. Bem, vamos à minha analogia: sabe quando você olha uma moça ou rapaz e pensa: “um dia ficarei com ela(e)”? Você assim o faz porque de alguma forma aquela pessoa lhe interessou e sentiu-se atraído(a) por aquele monumento de pessoa – não no sentido corporal, carnal ou não. Pois é! Isso foi o que aconteceu comigo em relação à Filosofia: olhei-a e ela me

Poema obsceno*

Façam a festa  cantem e dancem que eu faço o poema duro  o poema-murro  sujo  como a miséria brasileira  Não se detenham:  façam a festa  Bethânia Martinho  Clementina  Estação Primeira de Mangueira Salgueiro  gente de Vila Isabel e Madureira  todos  façam  a nossa festa enquanto eu soco este pilão  este surdo  poema que não toca no rádio que o povo não cantará (mas que nasce dele) Não se prestará a análises estruturalistas Não entrará nas antologias oficiais  Obsceno como o salário de um trabalhador aposentado  o poema terá o destino dos que habitam o lado escuro do país – e espreitam *Ferreira Gullar

Nessas noites que antecedem meu olhar*

Nessas noites que antecedem o meu olhar, sinto leves toques na alma. Vultos que passam como lembranças. E um leve sono chega até meus olhos e adormeço sob rios profundos. Abro os olhos e lentamente me divido em milhares de estrelas... Tristes. Como lágrimas que não caem, como relógios esquecidos no tempo, sem terem noção do porquê existem. Parados. Ouço distante o farfalhar da vida, seu ansioso movimento. E seu barulho doce e quente, na profundeza fria e solitária, a me chamar, são vozes mudas, que ninguém pode ouvir. *Helena Monteiro Poetisa, estudante de filosofia clínica Petrópolis/RJ

Reflexão n°.1*

Ninguém sonha duas vezes o mesmo sonho. Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio. Nem ama duas vezes a mesma mulher. Deus de onde tudo deriva. E a circulação e o movimento infinito. Ainda não estamos habituados com o mundo. Nascer é muito comprido. *Murilo Mendes

Interseção*

  Em Filosofia Clínica a palavra Interseção designa o contato entre duas pessoas, assim como na matemática Intersecção ou Interseção refere-se aos elementos compartilhados por dois conjuntos. O contato matemático é definido por aquilo que os conjuntos compartilham entre si. Em Filosofia Clínica, esse conceito tem ainda outro desdobramento: a definição da qualidade desse contato. Em outras palavras, para um filósofo clínico, ao observar o contato entre duas pessoas ele presta atenção no que é partilhado no contato e ainda na qualidade desse contato. Sendo assim, uma Interseção pode ser positiva, negativa, confusa ou indeterminada. O programa Super Nanny que passa na TV aberta mostra a interseção entre os pais e os filhos. A relação exposta no início do programa geralmente mostra filhos dos quais os pais não “dão mais conta”. Crianças extremamente desobedientes, boa parte das mesmas agressivas com os pais e os irmãos, geralmente usando de agressão para conseguirem o que deseja

Minha Cidade*

Goiás, minha cidade... Eu sou aquela amorosa de tuas ruas estreitas, curtas, indecisas, entrando, saindo uma das outras. Eu sou aquela menina feia da ponte da Lapa. Eu sou Aninha. Eu sou aquela mulher que ficou velha, esquecida, nos teus larguinhos e nos teus becos tristes, contando estórias, fazendo adivinhação. Cantando teu passado. Cantando teu futuro. Eu vivo nas tuas igrejas e sobrados e telhados e paredes. Eu sou aquele teu velho muro verde de avencas onde se debruça um antigo jasmineiro, cheiroso na ruinha pobre e suja. Eu sou estas casas encostadas cochichando umas com as outras. Eu sou a ramada dessas árvores, sem nome e sem valia, sem flores e sem frutos, de que gostam a gente cansada e os pássaros vadios. Eu sou o caule dessas trepadeiras sem classe, nascidas na frincha das pedras: Bravias. Renitentes. Indomáveis. Cortadas. Maltratadas. Pisadas. E renascendo.

Uma hora para a loucura e a alegria*

Uma hora para a loucura e a alegria! Ó furiosos! Oh, não me confinem! (O que é isto que me liberta assim nas tempestades? Que significam meus gritos em meio aos relâmpagos e aos ventos rugidores?) Oh, beber os delírios místicos mais fundamente que qualquer outro homem! Ó dolências selvagens e ternas! (Recomendo-as a vocês, minhas crianças, Dou-as a vocês, como razões, ó noivo e noiva!) Oh, me entregar a vocês, quem quer que sejam vocês, e vocês se entregarem a mim, num desafio ao mundo! Oh, retornar ao Paraíso! Ó acanhados e femininos! Oh, puxar vocês para mim, e plantar em vocês pela primeira vez os lábios de um homem decidido. Oh, o quebra-cabeça, o nó de três voltas, o poço fundo e escuro – tudo isso a se desatar e a se iluminar! Oh, precipitar-me onde finalmente haverá espaço e ar o bastante! Ser absolvido de laços e convenções prévias, eu dos meus e vocês dos seus! Encontrar uma nova relação – desinteressada – com o que há

Sobre os deslizes das margens*

                                   Um cotidiano inacreditável aprecia sorrir enigmas a quem possui apenas certezas. Sua fonte de surpresas faz explodir a lógica bem ajustada dos princípios de verdade. Nesse saber estrangeiro, que se insinua por aí, existe um querer de erudição e pluralidade estética. A dialética dessas expressividades se mostra nas preferências, gosto, atitudes e alternância de papéis existenciais. Pressentir a pedra de toque pode significar uma originalidade em meio ao espírito de multidão. Como uma pátria exilada em si mesma, sua irrealização aprecia reescrever-se para além de uma vida acumulando raízes.  Ao espírito de rebanho, ser singularidade é a maior doença.   Através da linguagem delirante se anuncia uma poética quase incompreensível. Nesse imenso território de dúvidas, contradições, um sujeito ameaça surgir. Seu deslize existencial aprecia contradizer o mundo ordinário. Em meio a esses labirintos da subjetividade que quer a

Sob a Regência de Saturno*

Com sua foice vai ceifando. Mergulhando no mundo de Hades Traz a tona o invisível. Bravamente, se une a Netuno Promovendo manifestaçōes coletivas. Com as armas de Áries Promove mudanças repentinas Fazendo nascer novos ideais. Com o poder de Leão, Que tem a Vênus hospedada, Sai em defesa da liberdade, Da expressão e dos direitos humanos. Velho sábio Saturno, Instigando os pueres A ação transformadora e radical. Velho Sábio... Remove as catacumbas da corrupção Senhor do tempo, sabe que Esta é a hora de reformar O Planeta adoecido. Com os quatro cavaleiros do apocalipse. No triângulo de água Cuida de tudo, Instigando a todos Para inéditas e inovadoras soluções. Este é o tempo de recriar o mundo! Sucesso em seu grande empreendimento Senhor Cronos! Que tenhamos força Para renascer de suas cinzas. *Rosângela Rossi Psicoterapeuta, escritora, filósofa clínica Juiz de Fora/MG

A realidade do amor*

"(...) Que sempre existam almas para as quais o amor seja também o contacto de duas poesias, a convergência de dois devaneios.  O amor, enquanto amor, nunca termina de se exprimir e exprime-se tanto melhor quanto mais poeticamente é sonhado.  Os devaneios de duas almas solitárias preparam a magia de amar.  Um realista da paixão verá aí apenas fórmulas evanescentes.  Mas não é menos verdade que as grandes paixões se preparam em grandes devaneios.  Mutilamos a realidade do amor quando a separamos de toda a sua irrealidade."    *Gaston Bachelard, in ' A Poética do Devaneio'  

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