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A palavra horizonte*

"Quando se tem algo em mente, tem-se a si mesmo em mente"                                  Ludwig Wittgenstein Talvez sua maior virtude seja retratar o universo de eventos possíveis em cada um. O exercício de seus dons deriva das origens estruturais, da aplicabilidade, do teor discursivo a fundamentar novas vivências. Seu sentido pode ser cura, loucura, alento, desilusão. Ao exibir uma estranha aptidão de transformar a pessoa naquilo que menciona, muitas vezes, ultrapassa o dado literal para traduzir-se. As arquiteturas contraditórias reafirmam os deslizes de reinvenção. Parecem realizar escolhas ao ressoar os movimentos da subjetividade.  Mesmo a competência narrativa não é capaz de aprisionar por inteiro esses desdobramentos no esboço da linguagem. A expressividade de cada pessoa menciona uma concepção de mundo, seu devir transita entre o que é e como reaparece em sua ótica. A força da escritura, ao realizar aquilo que descreve, transforma irrealidade

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Feitiçaria é o mundo onde as palavras têm poder. O feiticeiro fala e a palavra, sem o auxílio das mãos realiza o que diz. Deus diz 'Paraíso', e um jardim de delícias aparece. A bruxa diz 'Sapo!', e o príncipe se transforma em sapo" "O mundo humano é construído com palavras. Como dizem os textos sagrados: 'No princípio de todas as coisas está a palavra...' E, à semelhança da aranha, é dentro do corpo que a palavra é gerada. É ali, no caldeirão mágico do corpo, que se processa a transformação alquímica de palavras em carne" "Cada conclusão faz parar o pensamento. Como nos livros de Agatha Christie: resolvido o crime, nada sobra em que pensar. E não adianta ler o livro de novo. Quando o pensamento aparece assassinado, pode-se ter a certeza de que o criminoso foi uma conclusão" "A etiqueta da ciência. Sua primeira regra é que só devem ser comidas palavras solidamente enraizadas nas coisas. Ao cientista é interdita

Existência invisível*

Quando se davam conta Do lugar onde estavam Já tinham ido embora... Morava alguma coisa Estranha dentro dela Alguma coisa havia Que não era ela Ela queria esquecer Mas não se lembrava Ao certo o que era E isto era terrível ! Ele fechava os olhos Para ver o que não sabia Sentia-se invisível Duvidava da sua existência Uma sensação esquisita De que as pessoas Não o enxergavam E isto era terrível ! *José Mayer Filósofo. Poeta. Livreiro. Estudante na Casa da Filosofia Clínica Porto Alegre/RS

Noções*

Entre mim e mim, há vastidões bastantes para a navegação dos meus desejos afligidos. Descem pela água minhas naves revestidas de espelhos. Cada lâmina arrisca um olhar, e investiga o elemento que a atinge. Mas, nesta aventura do sonho exposto à correnteza, só recolho o gosto infinito das respostas que não se encontram. Virei-me sobre a minha própria existência, e contemplei-a Minha virtude era esta errância por mares contraditórios, e este abandono para além da felicidade e da beleza. Ó meu Deus, isto é a minha alma: qualquer coisa que flutua sobre este corpo efêmero e precário, como o vento largo do oceano sobre a areia passiva e inúmera... *Cecília Meireles

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) o labirinto é evidente símbolo de perplexidade e a perplexidade fora uma das emoções mais comuns da sua vida, a reação diante de muitos atos e decisões que lhe pareciam inexplicáveis" "Meu primeiro conhecimento das coisas veio sempre dos livros, antes que do contato real com elas" "(...) Outra aquisição dos últimos anos de ensino médio genebrino foi Schopenhauer, de quem admirou O mundo como vontade e representação. Sempre achou que, se fosse possível expressar o universo em palavras e pudesse algum livro servir de plano, tal livro seria o de Schopenhauer"    "Apaixonava-o a mitologia sensual do submundo" "(...) apaixonou-o uma Buenos Aires que logo deixaria de existir, relegada ao esquecimento pelo progresso. E Borges, deslumbrado, saiu a descobrir a cidade" "Desejava fazer poemas essenciais, para além do aqui e agora, livres de cor local e das circunstâncias cotidianas" "As ruas de Bu

Da coleção de contos "As mulheres que não fui"*

Daliza se formou na leitura das revistas de 1950, na linha do Clube das Moças e nos filmes da sessão da tarde que padronizavam o romantismo, com Fred Astaire, Elvis e o humor inocente de Jerry Lewis. Assim, era velho seu nascimento cultural, um óvulo desabrochando num corpo mignon. Palavra antiquada, agora gostam mesmo é de picanha, vitelas com gordura pouca, só para dar o charme da sedução visual. Estava ligada ao movimento lascivo da vida instintiva por poucos fios... pena que ela não se alimentava de verduras, carnes e carboidratos como os seres normais. Pensava num tanto de preocupações sobre isso, os efeitos da vida medicamentosa para os órgãos.. mas... é a vida que conseguia ter, e os desdobramentos ela sempre pagava. Às vezes se sentia a moça casamenteira, ao estilo da sobrinha em "Meu amigo Harvey". Daliza era uma musa pin up. Tinha a leveza das panquecas com espessura de papel; diria que ela seria uma geleia de pêssego, se gostasse de doces. Deles só sabo

A perfeição*

O que me tranquiliza é que tudo o que existe, existe com uma precisão absoluta. O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete não transborda nem uma fração de milímetro além do tamanho de uma cabeça de alfinete. Tudo o que existe é de uma grande exatidão. Pena é que a maior parte do que existe com essa exatidão nos é tecnicamente invisível. O bom é que a verdade chega a nós como um sentido secreto das coisas. Nós terminamos adivinhando, confusos, a perfeição. *Clarice Lispector

Ditirambos*

Existe uma lógica superlativa em meio às façanhas usuais. Não fora seu ser extraordinário a desalojar cotidianos, poderia acessar, com mais facilidade, a epistemologia das coisas ao seu redor. Sua encenação de caráter imperfeito escolhe a vertigem para traduzir amanhãs. Um inusitado cio criativo, de essência exploratória, realiza festejos para representar mesclas de exclusão e integração. Sua essência Dionisíaca sugere uma nova página às promessas de um para sempre. Seu jogo de cena inventa linguagens para redesenhar a vida acontecendo. Essa dança de consciência alterada ensaia rupturas ao padrão existencial. Sua expressividade é das ruas, praças, teatros, diante do espelho. Seu êxtase menciona um lugar quase esquecido, recém chegando pelo deslocamento fora de si. Num estado diferenciado a existência se encontra com sua irrealidade, rascunha novas proposições. Ao surgir em retórica dançarina, o fenômeno ditirambo prescreve eventos de paixão desarrazoada. Em trânsitos d

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