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Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Chladenius chega a uma conclusão interessantíssima: constata que compreender plenamente um autor não é o mesmo que compreender inteiramente um discurso ou um escrito. A norma para a compreensão de um livro não seria, de modo algum, a intenção do autor. Pois, como os homens não são capazes de abranger tudo com sua visão, assim suas palavras, discursos e escritos podem significar algo que eles próprios não tiveram a intenção de dizer ou de escrever (...) quando se busca compreender seus escritos pode-se chegar a pensar, e com razão, em coisas que aos autores não ocorreria" "O verdadeiro problema da compreensão aparece quando, no esforço de compreender um conteúdo, coloca-se a pergunta reflexiva de como o outro chegou à sua opinião. Pois é evidente que um questionamento como este anuncia uma forma de alteridade bem diferente, e significa, em último caso, a renúncia a um sentido comum" "O artista livre cria sem receber encomenda. Parece que o que o ca

O canto e a dança*

Volto a lhe dizer Preciso do canto Preciso tanto da dança No embalo do corpo No ritmo dos cosmos Nasci de um balanço E quer você queira Ou não O canto e a dança Moram dentro de mim Sempre até o fim... Por vezes eu que vacilo E penso que és tu Que não amas meus versos Preciso imaginar a vida Salvar-me dos meus sonhos Por isso sempre Por todo o tempo Além dos contratempos Quer você queira Ou não A veia da poesia Estará sempre comigo.... Então canta, amiga minha Dança nos doces embalos Das ondas da vida E eu te darei Numa taça de barro O frescor dos meus versos.! *José Mayer Filósofo. Livreiro. Poeta. Filósofo Clínico. Porto Alegre/RS

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) o instituinte, aquilo que periodicamente (re)nasce, nunca está em perfeita adequação com o instituído, com as instituições, sejam elas quais forem, que sempre são algo mortíferas" "(...) o irreal do 'tipo real' é particularmente pertinente para compreender todos os fatos 'reais' da vida cotidiana que, sem isso, passariam totalmente despercebidos. É nesse sentido que a forma é uma força de atração. Ela acentua, caricaturiza, carrega no traço e, assim, faz sobressair o invisível, o subterrâneo, quase se poderia dizer o subliminal, que a ciência oficial tem muita dificuldade para distinguir, e ainda mais para integrar às suas análises"  "Estar atento a uma lógica do instante, apegada ao que é vivido aqui e agora. Tal lógica do instante nada mais tem a ver com a vontade racionalista que pensa poder agir sobre as coisas e as pessoas. Ela é muito mais tributária do acaso, de um acaso que ao mesmo tempo é necessário; próxima, nisto,

Deixa-me calar-te com um beijo*

A palavra mais utilizada da língua portuguesa deve ser o "porque". O ser humano precisa de uma explicação lógica para quase tudo, e o “porque” é a ferramenta predileta para esclarecimentos, seja perguntando ou respondendo.   Se a resposta iniciar com um belo “porque”, metade do trabalho já está pronto, nem precisa esclarecer direito.   Existindo um “porque”, por mais absurdo e sem sentido que seja, a coerência parece refeita. O “porque”, por si só,   tem o poder intrínseco de acalmar o interlocutor. Por que o voo está atrasado? Porque o avião precisou fazer uma revisão nas turbinas. A atendente do balcão responde e o passageiro se satisfaz com a explicação, que justifica o atraso, mas não resolve o problema.   Segundo Nietzsche, precisa existir um “porque” e então a gente aguenta qualquer “como”.   O problema é que quase nunca existe um único “porquê” ou um “porquê” definitivo para determinada situação. Geralmente respondemos com o “porque” mais instantâneo   ou

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) só somos na medida em que nos descobrimos: o ser coincide com o movimento da descoberta" "O ponto de partida é o fato de que o homem nasce da terra: ele é 'engendrado pela lama'. Entendemos por isso que ele é o produto de uma das inumeráveis combinações possíveis dos elementos naturais" "As palavras, ademais, são 'instrumentos de atos úteis', de modo que nomear o real é cobri-lo, velá-lo com familiaridades, transpô-lo assim à condição daquilo que Hegel chamava 'o demasiadamente conhecido', que passa despercebido. Para rasgar os véus e trocar a quietude opaca do saber pelo espanto do não saber é preciso um 'holocausto das palavras', esse holocausto que a poesia realiza de saída (...)" "Se estou no avesso de um mundo pelo avesso, tudo me parece direito. Portanto, se eu habitasse, eu mesmo fantástico, um mundo fantástico, não poderia de modo algum considerá-lo fantástico" "(...) ningué

Conexões Profundas. Precisamos?*

Ao longo de um dia podem ser dezenas; ao longo de uma vida, dezenas de milhares. Pessoas outras, no mundo, com as quais nos encontrarmos, existem pelo menos sete bilhões. Mas com quantas podemos construir conexões profundas? E por que isso é importante? As relações superficiais são tão necessárias quanto o ar que respiramos. Cabem no happy hour depois do trabalho, no vôlei de praia aos finais de semana, no café ou chopp de vez em quando. A pauta: amenidades... Falamos sobre o desempenho do time do coração, sobre a adequação na escolha de um determinado ator para determinado papel, sobre o meme que foi sensação das mídias sociais naquele dia. Por outro lado, as conexões profundas são vitais, pelo simples motivo de que necessitamos, em alguma medida, elaborar nossas questões. Quanto tempo conseguimos fugir, negar, maquiar nossas dores, frustrações, vulnerabilidades, sem um único “eu te entendo”, mesmo que venha acompanhado de um “você sabe que vacilou, não”? Terapeutas estão

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"A ciência da natureza não é senão ciência das relações. Todos os progressos de nossos espírito consistem no descobrimento de relações. Ora, além do fato de que a imaginação é a mais fecunda e maravilhosa descobridora de relações e das harmonias mais ocultas (...)" "Romualdo Giani que cita Homero: '(...) que escrevia antes de qualquer regra, não sonhava por certo estar grávido de regras como Jove de Minerva ou de Baco, nem que a sua irregularidade seria medida, analisada, definida e reduzida a capítulos ordenados para servir de regra a outros e impedi-los de ser livres, irregulares, grandes e originais como êle (...)'" "Círculo linguístico de Praga: '(...) justamente esse desvio da norma, que rompia as expectativas do leitor, explicava o processo da arte, que é um processo de desautomatização mediante um recurso de singularização (efeito de estranhamento; Chklóvski, 1917: ficamos 'despaisados' quando um autor descreve um objeto

Sem discípulos*

“Objeto é apenas o que pode ser ocupado e abandonado.”                 Peter Sloterdijk Nenhum homem, nenhum momento, nem a flor do pensamento, meio olho e uma frota de navios imaginários a se perder na linha do tempo. De nunca mais poder retornar à terra segura, mesmo sendo o que ilumina as ideias, anda, por ora, a procurar o fantasma do passado, uma obsessão do demônio da igualdade nos poros biológicos predestinados a sobreviver ao sol. O novo tempo é a estranha forma de matar e limpar as ruas em nome de uma integridade tenebrosa. A moralidade se impõe como ordem dos néscios de alma que evocam a religião, a ciência e até a arte de matar o próximo. O homem deste século sabe tudo, até mesmo crê que é inferior a deus para matar em nome de um deus. Prefiro ver o rio caudaloso de ideias se perder em ruas, túneis profundos, em pedras que escondem os desconhecidos a morrer na ordem do exército de mosquitos que sugam o sangue da maioria que pondera. Na fuga, atravessar

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) para ler bem, é preciso prestar ouvidos à voz original, adivinhar as diferenças de acento que a articulam e que se tornaram imperceptíveis no espaço homogêneo da escrita. Na leitura, o olho treinado do Gramático ou do Lógico deve subordinar-se a um ouvido atento à melodia que dá vida aos signos: estar surdo à modulação da voz significa estar cego às modalidades do sentido" "(...) Ele é o 'urso' que escolhe a solidão quando poderia viver em Paris; todas as suas escolhas, enfim, todo o estilo de sua existência cotidiana o designam como alguém que escapa à norma e se expõe às mais pérfidas interpretações" "(...) a identidade constituída pelo sentimento da existência estaria sempre em sursis : ela jamais ultrapassaria a chama do instante e não poderia assegurar a continuidade temporal do eu. A alma é mais mutável que Proteu ou que um camaleão e podemos dizer: 'Nada é tão diferente de mim quanto eu mesmo'" "Rousseau e

Uma região interminável*

                                           Em cada pessoa, de tempos em tempos, lhe acena uma possibilidade de ser superlativo. Tendo como viés de ruptura uma inquietude singular continuada, se faz contradição com seu cotidiano, embora este sirva de base para sua transgressão.   Pode ser algo, até então clandestino, embora atuante, em sua estrutura de pensamento.     A concepção dessa região considera as margens e lacunas discursivas na brevidade de um instante. Por essas trilhas, até então desconhecidas ou inacessíveis, a nova geografia se insinua, desajustando a ótica do tempo linear. Com as palavras desencontradas se rascunha uma realidade ainda sem tradução. Requer a interseção aprendiz com essa novidade diante do espelho. Compreendendo um fenômeno singular, é impreciso reconhecer esse lugar algum de todo lugar. Assim esse espaço se mostra em lógicas de caleidoscópio. Nalgumas vezes se movimenta aquém de seu melhor, noutras como se não houvesse amanhã. A trama discu

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Para o poeta, para o filósofo, para o santo, todas as coisas são favoráveis e sagradas, todos os acontecimentos vantajosos, todos os dias santos, todos os homens divinos" "Quando um pensamento de Platão torna-se meu pensamento - quando uma verdade que incendiou a alma de Píndaro incendeia a minha, o tempo não existe mais" "Quando os deuses descem entre os homens, não são reconhecidos, Jesus não o foi; Sócrates e Shakespeare não o foram" "Pode-se dizer que o sistema solar gravitacional já se acha profetizado na constituição do intelecto de Newton" "O idiota, o índio, a criança, o garoto camponês ignorante estão mais próximos da luz pela qual a natureza deve ser lida do que o dissecador ou o antiquário" "Uma coerência tola é o bicho-papão de mentes mesquinhas, adorada por estadistas, filósofos e clérigos mesquinhos. Uma grande alma não tem simplesmente nada a ver com a coerência" "Será tão ru

Manter-se tranquilo em meio à turbulência*

Existem circunstâncias que podem ser controladas e outras que não - já diziam os filósofos estoicos, dentre eles Sêneca e Epicuro. O conselho, proferido há mais de dois mil anos e muito sábio até os dias atuais, resumia-se basicamente a nos atermos somente aos aspectos controláveis da vida se quiséssemos ter um mínimo de bem-estar. Fenômenos da natureza, atitudes de outras pessoas e trânsito são apenas alguns exemplos do que não controlamos. Por mais que tenhamos força do pensamento, tecnologia e boa vontade para fazer o impossível, esses são elementos que não conseguimos manipular ao sabor de nossos desejos. Por outro lado, existem algumas coisas que conseguimos manter num nível razoável de manejo pessoal. Nossos pensamentos, nossos sentimentos e nossas ações são alguns exemplos. Como reagimos aos fatos, portanto, está inteiramente sob o nosso controle, certo? Mais ou menos. Algumas teorias antigas dizem que temos somente 5% de livre arbítrio. Todo restante seria respo

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