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Considerações de um Pensador*

Amigos, tenho observado um fenômeno curioso.

Cada vez mais encontro pessoas – inclusive com nível acadêmico superior – que nitidamente querem expressar uma idéia, ou discordar de uma tese, mas não contam com os instrumentos lingüísticos necessários para isso: a sua capacidade de articulação, o seu vocabulário, a sua sintaxe são tão brutos que elas permanecem no plano dos grunhidos mais ou menos elaborados com que exprimem sensações, desejos e juízos simples. Essas pessoas comunicam-se de modo confuso, o que revela a própria confusão de seu mundo interior – isto é: revela uma inteligência ainda imatura.

A dificuldade de apresentar uma idéia num discurso completo, que corresponde à dificuldade de pensar uma idéia com clareza, deve-se à deficiência da cultura literário-poética: se não lemos literatura, se não lemos poesia, não possuímos os meios para elevar o intelecto acima do nível das exigências da vida social mais elementar – o trabalho, as relações familiares, as conversas sobre o futebol, os assuntos do momento. E o mais grave: como a extensão do vocabulário e a profundidade do conhecimento gramatical determinam-nos o horizonte do pensamento, raramente percebemos o grau da nossa insuficiência lingüística.

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Qual é, então, o caminho para o desenvolvimento da nossa capacidade de expressão – escrita ou falada?

O caminho, amigos, está na ampliação do nosso universo literário, por meio da leitura dos clássicos – da nossa língua e da literatura universal –, na escola e na vida adulta. Por meio da leitura de bons livros aperfeiçoamos a capacidade de formular e expressar idéias que façam sentido. A leitura de livros – de bons livros! – é a condição necessária para a maturidade da inteligência.

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Natalia Pasternak e Carlos Orsi publicaram recentemente "Que Bobagem! Pseudociências e outros absurdos que não merecem ser levados a sério" (Ed. Contexto). O livro é interessante porque revela os lugares de pensamento de parte da academia - aquela que cresceu, nos anos 80 e 90, lendo a Superinteressante, e não avançou nas leituras sobre a ciência.

O modo como os autores utilizam os termos-chave da obra - "ciência", "pseudociência", "método científico" e "demarcação" - revela um pensamento estacionado ali entre Comte, no século XIX, e o Popper dos anos 1930.

Toda a discussão sobre a natureza da prática científica e de suas fronteiras nos últimos sessenta anos é simplesmente ignorada: não há nem sombra das idéias lançadas por Kuhn, a partir dos anos 60, e Feyerabend, a partir dos anos 70. Nem mesmo a polêmica de Sokal e Bricmont - que reaqueceram as Science Wars com a publicação, em 1997, de "Imposturas Intelectuais", obra que sustenta teses próximas àquelas do livro de Pasternak e Orsi - tem lugar no texto.

Em suma: embora tenha sido publicado há menos de um mês, o livro é já antigo.

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Na aula de hoje do Curso de Filosofia refletiremos sobre esse recente livro de Natalia Pasternak e Carlos Orsi.

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*Prof. Dr. Gustavo Bertoche

Filósofo. Professor. Mestre e Doutor em Filosofia. Musicista. Escritor. Filósofo Clínico. Em 2019, por indicação da direção e conselho da Casa da Filosofia Clínica, recebeu o título de "Doutor Honoris Causa". 

Teresópolis/RJ

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