Um dia, por acasos lindos da
vida, aparece em minhas mãos um livro interessantíssimo, eu estava no Guion
Cinemas na Cidade Baixa e isso é importante que seja dito, já que ali tem
algumas das coisas mais interessantes que acontecem em Porto Alegre. Lugar de
cultura, selecionadas demonstrações de cinema, além de livros, CDs, discos,
obras de arte e café. Coisas palpáveis, com cores, cheiro e sabor.
E que livro é esse, que tem um
título aparentemente controverso? “O Belo Perigo”.
Esse livro trata de uma conversa
entre Claude Bonnefoy, crítico literário e o filósofo Michel Foucault. Na
entrevista o filósofo fala como iniciou seu processo de escrita, fala sobre a
história e os desdobramentos dessa atividade e o momento em que a assume como
fundamental para sua vida, passando a refletir “(...) sobre a produção e o
controle da escrita – suas potencialidades, limitações e perigos”.
Foucault revela que “(...)
Gostaria de fazer aparecer o que está próximo demais de nosso olhar para que
possamos ver, o que está aí bem perto de nós, mas que o nosso olhar atravessa
para ver outra coisa”. Assim, ele nos faz perceber suas motivações, um motor
que faz girar as ideias desse filósofo ainda hoje. Seu engajamento político,
senso crítico e comprometimento com a arte da escrita que nos faz pensar,
aparecem ali.
Antes disso, na introdução de
Philippe Artières conhecemos a dupla faceta do nosso autor, que mais do que a
escrita, possui uma audiografia, ou seja, registro de momentos em que, engajado
politicamente, o escritor toma a palavra e se pronuncia. Sobre o uso da fala em
Foucault, Artières explica: “o filósofo faz ressoar a voz daqueles que estavam
até então privados dela”, tratando de assuntos como o problema das prisões na
França de sua época.
E sobre a escrita, além de refletir,
Foucault se questiona:
“(...) Não é a escrita que é
feliz, é a felicidade de existir que depende da escrita (...). Isso é muito
paradoxal, muito enigmático, pois como pode ser que o gesto tão vão, tão
fictício, tão narcísico, tão fechado sobre si mesmo que consiste em se sentar à
escrivaninha de manhã e cobrir certo número de páginas brancas tenha esse
efeito de benção sobre o resto do dia?”
Aqui Foucault revela como a
escrita é, para ele, um remédio... Por hoje é isso... Abre o livro, dentro tem muito
mais...!
FOUCAULT, Michel. “O Belo Perigo: conversa com Claude Bonnefoy”. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2016.
*Dionéia Gaiardo
Filósofa Clínica. Escritora.
Vale dos Sinos/RS
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